Revista Brasileira de Direito Aeroespacial

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O Registro Aeronáutico Brasileiro – RAB

Fernando de Oliveira Pontes
fpontes@attglobal.net

Assessor Jurídico do RAB

    Não é nossa pretensão realizar um trabalho acerca das atividades do Registro; desejamos sim, de uma forma bastante humilde esclarecer e clarificar para muitos, uma das atividades de maior importância para a aviação civil, especificamente a brasileira, que é o registro de aeronaves.

    Preliminarmente, deveríamos tecer um breve comentário sobre aeronave, entretanto não é esse o nosso escopo (mesmo porque o grande número de trabalhos de nível sobre o tema nos inibe a trazer quaisquer tipos de comentários), razão pela qual faremos referência apenas ao artigo 106 da Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986 – Código Brasileiro de Aeronáutica, no qual,

Considera-se aeronave todo aparelho manobrável em vôo, que possa sustentar-se e circular no espaço aéreo, mediante reações aerodinâmicas, apto a transportar pessoas ou coisas ,

e principalmente quanto ao seu parágrafo único que prevê:

A aeronave é bem móvel registrável, para o efeito de nacionalidade, matrícula, aeronavegabilidade (arts. 72, I, 109 e 114), transferência por ato entre vivos (arts. 72, II e 115, IV), constituição de hipoteca (arts. 72, II e 138) publicidade (arts. 72, III e 117) e cadastramento em geral (art. 72, V). (grifo nosso).

    Dessa forma concluímos que, a partir da leitura da definição de aeronave, percebemos a importância desse órgão para todo o sistema de aviação civil.

    O Registro Aeronáutico Brasileiro – RAB, possui sua fundamentação legal, como direito comparado, inicialmente, de forma indireta, nas Convenções Internacionais, notadamente no capítulo III da Convenção de Chicago de 1944 – Convenção de Aviação Civil Internacional (artigos 17 a 21) e na Convenção de Genebra de 1948 – Convenção sobre reconhecimento de direitos sobre aeronaves, mais diretamente nos seus artigos 1º ao 3º e, de forma direta, no Código Brasileiro de Aeronáutica – CBA, que dispõe, no seu artigo 72:

O Registro Aeronáutico Brasileiro será público, único e centralizado, destinando-se a ter, em relação à aeronave, as funções de:

I – emitir certificados de matrícula, de aeronavegabilidade e de nacionalidade de aeronaves sujeitas à legislação brasileira;

II – reconhecer a aquisição do domínio na transferência por ato entre vivos e dos direitos reais de gozo e garantia, quando se tratar de matéria regulada por este Código;

III – assegurar a autenticidade, inalterabilidade e conservação de documentos inscritos e arquivados;

IV – promover o cadastramento geral.

§ 1º - É obrigatório o fornecimento de certidão do que constar do Registro;

§ 2º - O Registro Aeronáutico Brasileiro será regulamentado pelo Poder Executivo.

Nesse artigo, cabem alguns comentários:

    O RAB possui como leis subsidiárias a Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973 – Lei sobre os registros públicos, e suas atualizações, em especial na Lei nº 6.216, de 30 de junho de 1975, no que couber; o Código Civil Brasileiro, o Código de Processo Civil, Leis fiscais e parafiscais. Para tanto, trazemos o artigo 1º da Lei de Registros Públicos que dá as suas funções, a saber:

Os serviços concernentes aos Registros Públicos, estabelecidos pela legislação civil para autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, ficam sujeitos ao regime estabelecido nesta Lei. (Redação dada ao caput e parágrafos pela Lei nº 6.216, de 30/06/75) (2).

    Já quanto ao Código Civil Brasileiro e ao Código de Processo Civil, cabe a observação do aspecto formal do instrumento a ser apresentado para registro.

Da mesma forma quanto às Leis fiscais e parafiscais, cabe a referência de que, consoante os regulamentos em vigor, o Registro verificará se as Leis fiscais foram atendidas. Como, por exemplo, temos, na importação, através do Comprovante de importação, assim como na exportação, através do Registro de exportação, ambos expedidos pela Receita Federal. Na observação que entendemos ser pertinente quanto à alienação ou oneração de aeronave realizada por pessoa jurídica, a Certidão Negativa de Débito – CND, emitida pelo INSS (disposto pelo artigo 47 da Lei nº 8212, de 24 de julho de 1991), será exigida.

    A legislação é bastante clara e não há o que se discutir: o RAB é público, afinal é obrigatório o fornecimento de certidão de tudo o que constar no Registro. É único, pois todos os documentos das aeronaves de matrícula brasileira são ali registrados: existe apenas um registro de aeronaves. E centralizado, haja vista a necessidade de se arquivar todos os documentos em um só local.

    O RAB por ser público causa, até os dias de hoje, entendimentos equivocados. É uma redundância, porém necessária, e é aqui aplicada: O RAB dá a publicidade a todos os documentos ali inscritos. A confusão se dá porque algumas pessoas pensam, muitas das vezes, que todo o instrumento que altere, institua, reconheça, transfira ou extinga o domínio ou demais direitos reais sobre as aeronaves, deva ser precedido de uma inscrição em Registro de Títulos e Documentos. Não é necessário. Nesse caso o RAB funciona perfeitamente como um Cartório. E ainda mais: O ato (instrumento) só será efetivamente válido em toda a sua plenitude após ser averbado (inscrito) no RAB

    O fato de o Registro ser único já foi até objeto de uma série de observações acerca da cobrança do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores – IPVA, sobre as aeronaves, inclusive em uma seção realizada pelos representantes da Secretaria Estadual de Fazenda do Estado do Rio de Janeiro, em abril de 1999, na qual foi proposta a substituição da expressão prevista no inciso III do artigo 158 da Constituição da República de 1988 – e por nós grifada – que prevê que cinqüenta por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre a propriedade de veículos automotores licenciados em seus territórios por onde o proprietário possua domicílio tributário.

    Essa tese, proposta pelo Advogado Carlos Otávio Dias Vaz, foi apresentada pelo fato da instalação do RAB na cidade do Rio de Janeiro, o que levaria esse Município a receber 50% da arrecadação do produto do IPVA sobre as aeronaves de cada Estado, o que, convenhamos, não é o mais justo, nos termos do disposto no artigo 127 do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966), principalmente se considerarmos que o Estado de São Paulo é o Estado que concentra a maior parte da frota de aeronaves de nacionalidade brasileira.

    Apesar do nosso CBA prever que o RAB será único, o mesmo não podemos confirmar na Convenção de Chicago de 1944. Aliás, a Convenção de Chicago não estabelece qualquer disposição acerca do Registro, entendendo assim que os Estado possuem uma liberdade quanto à matrícula e registro de aeronaves submetidas às suas respectivas legislações.

    Encontraremos a necessidade da existência de um único Registro para cada aeronave, apenas na Convenção de Genebra de 1948 que, acertadamente fez essa previsão, evitando a confusão que poderia acontecer, caso houvesse mais de um registro para uma mesma aeronave, conforme previsto no seu artigo 2º, inciso 1 que prevê que todas as inscrições relativas a uma aeronave devem ser feitas no mesmo registro.

    Consoante Tapia Salinas (3), o Registro de aeronaves é uma instituição de caráter obrigatório que cumpre uma dupla função. Se por um lado, compete ao Registro de aeronaves de cada Estado matricular e expedir o respectivo certificado que deve obrigatoriamente constar a bordo da referida aeronave, por outro lado, deve ser responsável por constituir um registro de aeronaves com informações de modo completo e de caráter público, tendo as garantias já citadas de inalterabilidade e autenticidade, fidelidade e veracidade da situação das aeronaves ali registradas.

    Daí Tapia Salinas poder entender que o sistema de Registro pode ser único ou duplo. Seria único, segundo o autor espanhol, quando constituído por um Registro Nacional em que fossem inscritos tanto a aeronave em si mesma, como todas as suas características técnicas, bem como situação administrativa e aeronáutica e, da mesma forma, uma garantia de sua situação jurídica, principalmente quanto à propriedade e seus gravames, informações judiciais a respeito, etc.

    Seria duplo o Registro, quando suas atribuições fossem divididas; porém essa divisão deve ser muito bem definida, tanto em seus registros – continuidade -, como em suas conseqüências. Em resumo, uma parte seria a ligada aos aspectos administrativos governamentais e a outra, quanto aos aspectos jurídicos, visando a garantir a continuidade e seqüência lógica dos atos levados a registro sobre determinada aeronave. Isso, no fundo, é a idéia do CBA, quanto ao RAB.

    Em resumo, o ideal permanece na existência de um único registro, do que concordam os principais especialistas no setor.

    Mesmo assim, observamos alguns registros de aeronaves de alguns países que possuem funções divididas, tais como o espanhol, em que uma das funções resume-se à de caráter administrativo – a cargo da Administração Pública espanhola, e outra de caráter privado, no qual refletirão todos os contratos incidentes sobre aeronaves, seguindo o previsto no Código Italiano de Navegação, que prevê uma diversidade de registros.

    O Registro Aeronáutico Brasileiro possui portanto, como objetivo principal, realizar os procedimentos imprescindíveis à perfeita validade dos atos para registro de aeronaves, seus atos conexos e atos subseqüentes, visando dar a perfeita continuidade.

    É o RAB é também responsável pela autenticidade, segurança e eficácia de todos os atos trazidos a registro.

    Tendo vista a finalidade do RAB, os documentos admitidos a registro, são os previstos no artigo 73, I, II, III e IV, como se segue:

Somente são admitidos a registro:

I – escrituras públicas, inclusive as lavradas em consulados brasileiros;

II – documentos particulares, com fé pública, assinados pelas partes e testemunhas;

III – atos autênticos de países estrangeiros, feitos de acordo com as leis locais, legalizados e traduzidos, na forma da lei, assim como sentenças proferidas por tribunais estrangeiros após homologação pelo Supremo Tribunal Federal;

IV – cartas de sentença, formais de partilha, certidões e mandados extraídos de autos de processo judicial.

    Nesse artigo, também cabem alguns comentários, a saber:

    Quanto aos atos de Registro, os mesmos estão previstos no artigo 74 do CBA, quando prevê:

No Registro Aeronáutico Brasileiro serão feitas:

I – a matrícula de aeronave, em livro próprio, por ocasião de primeiro registro no País, mediante os elementos constantes do título apresentado e da matrícula anterior, se houver;

II – a inscrição:

a) de títulos, instrumentos ou documentos em que se institua, reconheça, transfira, modifique ou extinga o domínio ou os demais direitos reais sobre aeronave;

b) de documentos relativos a abandono, perda, extinção ou alteração essencial de aeronave;

c) de atos ou contratos de exploração ou utilização, assim como de arresto, seqüestro, penhora e apreensão de aeronave;

III – a averbação na matrícula e respectivo certificado das alterações que vierem a ser inscritas, assim como dos contratos de exploração, utilização ou garantia;

IV – a autenticação do Diário de bordo de aeronave brasileira;

V – a anotação de usos e práticas aeronáuticas que não contrariem a lei, a ordem pública e os bons costumes.

    Façamos também alguns comentários de importância acerca deste artigo:

    Quanto aos procedimentos para registros de aeronaves, os mesmos estão previstos nos artigos 77 a 85, bem como previstos no RBHA-47.

    Devemos ressaltar também, alguns princípios básicos de registros junto ao RAB que, apesar de simples, servem como guia importante:

    Esperamos assim ter atendido à nossa pretensão de fazer uma rápida passagem pela atividade principal do Registro Aeronáutico Brasileiro que, julgamos ser de fundamental importância para todo o sistema de aviação civil, pois é nele que começa e termina a atividade da aviação, estando nesse intervalo a responsabilidade de anotar, manter atualizada e salvaguardada todas as informações acerca da continuidade de todos os atos referentes a cada aeronave.

Notas:

  1. http://www.dac.gov.br  (Volta ao texto).
  2. Os serviços de Registros Públicos são os pertinentes aos de Registros Civis de Pessoas Naturais e Jurídicas, Registro de Títulos e Documentos e Registro Geral de Imóveis, ficando os demais registros especializados, submetidos às legislações específicas, razão pela qual entendemos ser legislação subsidiária.   (Volta ao texto)
  3. SALINAS, Luis Tapia. DERECHO AERONÁUTICO, 2ª Edição. Barcelona, Espanha: Bosch, Casa Editorial, S. A, 1993.  (Volta ao texto)

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