Revista Brasileira de Direito Aeroespacial

 barra2.jpg (1468 bytes)

Minuta (*)

ATO NORMATIVO
DAS ATIVIDADES DE LANÇAMENTOS ESPACIAIS

A AGÊNCIA ESPACIAL BRASILEIRA, no uso da competência que lhe é outorgada no inciso XIII do art. 3° da Lei n° 8.854, de 10 de fevereiro de 1994, com a aprovação do seu Conselho Superior, nos termos do art. 6°, inciso VII, do Decreto n° 1329, de 06 de dezembro de 1994, atendendo à finalidade de promover o desenvolvimento das atividades de interesse nacional, e em consonância com o estabelecido no Tratado sobre Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, Inclusive a Lua e demais Corpos Celestes, promulgado no País pelo Decreto n° 64.362, de 17 de abril de 1969, e na Convenção sobre Responsabilidade Internacional por Danos Causados por Objetos Espaciais, de 29 de março de 1972, promulgada no País pelo Decreto nº 71.981, de 22 de março de 1973, resolve estabelecer o presente Ato Normativo, com a finalidade de dispor sobre os procedimentos a serem observados para a concessão de licença e autorização de lançamentos espaciais a partir do território brasileiro.

Capítulo I

INTRODUÇÃO

Art. 1°. Os preceitos estabelecidos neste Ato Normativo serão observados na expedição, na fiscalização e no controle de licenças e de autorizações de lançamentos espaciais a partir do território brasileiro.

Art. 2°. Para os fins do presente Ato Normativo:

I - dano: significa perda de vida, ferimentos pessoais ou outro prejuízo à saúde, perda de propriedade do Estado ou de pessoas físicas ou jurídicas ou danos sofridos por tais propriedades ou danos e perdas no caso de organizações intergovernamentais internacionais;

II - Estado lançador: é o que lança ou promove o lançamento de um objeto espacial ou de cujo território ou instalações o mesmo é lançado;

III - Estado de registro: é aquele em cujo nome é inscrito um objeto espacial;

IV - objeto espacial: é o veículo de lançamento e sua carga útil, com as respectivas peças e componentes;

V - lançamento: é o procedimento destinado a colocar um objeto espacial no espaço exterior;

VI - veículo de lançamento: é o objeto espacial construído com a finalidade de colocar carga útil no espaço exterior;

VII - carga útil: é o objeto espacial transportado pelo veículo de lançamento, com todas as peças e componentes que o integram;

VIII - Agência Espacial Brasileira - AEB: é o órgão oficial brasileiro representativo do País no que se refere ao presente Ato Normativo;

IX - licença: é o ato administrativo que faculta a uma pessoa jurídica o exercício de atividades de lançamento no País;

X - licenciada: é a pessoa jurídica à qual tenha sido outorgada licença;

XI - autorização: é o ato administrativo que outorga à licenciada efetuar operações de lançamento de caráter específico;

XII - Registro Espacial Brasileiro - REB: é o banco de dados mantido pela AEB, que contém as informações de cada objeto espacial lançado do território brasileiro;

XIII - registro: é o ato administrativo mediante o qual é efetuada a inscrição do objeto espacial no REB;

XIV - centro de lançamento: é o complexo de instalações destinado à realização de atividades de lançamento a partir do território brasileiro.

Capítulo II

DA LICENÇA

Art. 3°. Licença é o ato administrativo de competência da AEB, mediante o qual é outorgada permissão para o exercício de atividades de lançamento em território brasileiro, por solicitação do interessado, podendo ser alterada ou revogada, de conformidade com as normas e condições estabelecidas neste Ato Normativo.

§ 1° A obtenção prévia da licença é condição indispensável para capacitar a licenciada ao exercício das atividades de lançamento no País.

§ 2° A licença somente será concedida a pessoas jurídicas, singulares ou consorciadas, com sede, administração ou representação no Brasil, que sejam consideradas técnica e administrativamente habilitadas pela AEB.

Art. 4°. Considera-se habilitada a pessoa jurídica que:

I - comprovar experiência específica para exercer a atividade a que se proponha;

II - comprovar capacidade financeira para exercer suas atividades e arcar com a responsabilidade pelos danos que causar;

III - dispuser de estrutura técnica e operacional própria e de manutenção, mesmo que contratada, que assegure o exercício normal das atividades a que se proponha;

IV - comprovar que se acha legalmente constituída para atuar em território nacional;

V - efetuar o pagamento dos emolumentos.

Parágrafo único. As pessoas jurídicas estrangeiras deverão apresentar prova de autorização para funcionamento em território nacional e instrumento de nomeação de representante no Brasil com poderes para aceitar as condições que forem estabelecidas pela AEB.

Capítulo III

DA AUTORIZAÇÃO

Art. 5°. As operações de lançamento de objetos espaciais dependerão de prévia autorização específica da AEB, em coordenação com a Marinha e a Aeronáutica.

Parágrafo único. A AEB remeterá às Organizações mencionadas no caput deste artigo o programa de lançamento e as cópias do processo de pedido de autorização e do Termo de Responsabilidade previsto no artigo 8°.

Art. 6°. A autorização deverá ser requerida pela licenciada com a antecedência mínima de seis meses, instruindo o pedido com o seguinte:

I - cópia do instrumento contratual em razão do qual será efetuado;

II - plano de lançamento, inclusive o respectivo cronograma;

III - tipo de veículo de lançamento e combustível a ser empregado na operação;

IV - descrição da carga útil;

V - relação das pessoas jurídicas envolvidas no lançamento;

VI - data, local e horário estimado para o lançamento;

VII - prova de contratação de seguro de responsabilidade civil por danos a terceiros.

Art. 7°. A AEB poderá denegar a autorização ou impor exigências adicionais para sua obtenção, sempre que entender conveniente para a defesa do meio ambiente ou a preservação da segurança pública.

Art. 8°. A licenciada firmará o Termo de Responsabilidade, no qual se obriga a :

I - cumprir as normas de segurança estabelecidas pela AEB para o lançamento de objeto espacial e o transporte das peças e componentes deste em território brasileiro;

II - prestar plena colaboração para o bom desempenho das funções de fiscalização;

III - observar as demais disposições da legislação brasileira, inclusive as decorrentes de atos internacionais dos quais o Brasil seja parte, relativos às atividades espaciais;

IV - cumprir rigorosamente o plano de lançamento, respeitadas as contingências de ordem técnica;

V - manter durante toda a execução das suas atividades, em compatibilidade com as obrigações assumidas, todas as condições exigidas para a sua habilitação;

VI - contratar seguro, anualmente atualizado, capaz de cobrir os riscos inerentes às suas atividades e instalações.

Art. 9°. Caso seja constatado, no curso das operações fiscalizadas, algum risco para a segurança, a ordem pública ou a violação de qualquer preceito deste Ato Normativo, a autorização poderá ser suspensa ou cancelada, mediante decisão circunstanciada da AEB, que comunicará o fato à Marinha e à Aeronáutica.

Art. 10. O lançamento observará o cronograma apresentado no pedido de autorização.

Parágrafo único. A validade da autorização esgotar-se-á com a realização ou a desistência do lançamento.

Capítulo IV

DO REGISTRO

Art. 11. O registro de objetos espaciais no REB é obrigatório e será efetuado, por solicitação da licenciada, antes do lançamento, e conterá:

I - nome do Estado ou Estados lançadores;

II - relação das pessoas jurídicas diretamente envolvidas no lançamento;

III - designação apropriada do objeto espacial;

IV - data, território e local de lançamento;

V - parâmetros orbitais básicos, incluindo: período nodal, inclinação, apogeu e perigeu;

VI - função ou finalidade do objeto espacial;

VII - dados oficiais do proprietário do objeto espacial e informações adicionais que forem solicitadas.

§ 1° Qualquer alteração nos dados contidos no REB será imediatamente comunicada à AEB, especialmente se relacionada com os parâmetros orbitais e o retorno ou a destruição do objeto espacial.

§ 2° A AEB transmitirá ao Secretário-Geral da ONU os dados constantes do registro e suas eventuais alterações.

Art. 12. Os dados do REB serão públicos, sendo obrigatória a concessão de certidão do seu conteúdo, mediante pedido formal dos interessados e o recolhimento, à AEB, dos emolumentos pela mesma estabelecidos.

Parágrafo único. A AEB poderá transmitir a terceiros os dados constantes do REB, sempre que julgar conveniente.

Capítulo V

DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Art. 13. O Brasil, como Estado lançador, será responsável absoluto por danos causados na superfície da Terra ou a aeronaves em vôo, por seus objetos espaciais ou pelos lançados de seu território e instalações.

Art. 14. Qualquer dano causado fora da superfície da Terra somente será reparado se decorrer de culpa do Brasil ou de pessoas pelas quais seja ele responsável.

Art. 15. Se o lançamento for efetuado em conjunto com outro Estado, ambos responderão solidariamente por quaisquer danos resultantes.

Art. 16. A responsabilidade prevista nos artigos precedentes recairá regressivamente sobre a licenciada, por culpa objetiva, perante a AEB, por danos pela mesma causados.

Art. 17. As disposições dos artigos 13, 14, 15 e 16 não se aplicarão a danos causados por objeto espacial de um Estado lançador a:

I - nacionais do mesmo Estado lançador;

II- estrangeiros, durante o tempo em que estiverem participando do manejo de tal objeto espacial, a partir do momento de seu lançamento ou em qualquer momento ulterior até a sua descida ou durante o tempo em que estiverem na vizinhança imediata de uma área prevista para lançamento ou recuperação, em conseqüência de convite por tal Estado lançador.

Art. 18. A responsabilidade pelos danos causados em território brasileiro far-se-á, em princípio, de conformidade com as leis e perante a Justiça do País, sendo esta, outrossim, competente para julgar quaisquer demandas de terceiros contra pessoas físicas ou jurídicas que exerçam atividades espaciais em território brasileiro, licenciadas ou não, na forma deste Ato Normativo, assim como os seus prepostos, sócios, consorciados, contratados e subcontratados.

Art. 19. A AEB poderá contratar seguro, a ser periodicamente atualizado, para cobertura dos danos de responsabilidade do Brasil.

Art. 20. Qualquer pedido de indenização ao Governo brasileiro por dano ocorrido fora do território do Brasil terá que ser apresentado ou complementado, por via diplomática, no prazo improrrogável de um ano a contar da ocorrência do dano ou da identificação do Estado responsável ou dos participantes de lançamento conjunto.

Art. 21. A licenciada responderá por culpa objetiva pelos danos causados a terceiros, em razão de atividade que exerça.

§ 1° A responsabilidade da licenciada será reduzida ou exonerada, se apurado que o dano ou prejuízo decorreu, total ou parcialmente, de culpa ou negligência do queixoso.

§ 2° São ineficazes quaisquer cláusulas contratuais que visem a exonerar ou a limitar a responsabilidade indenizatória da licenciada.

Capítulo VI

DAS PENALIDADES

Art. 22. Em caso de descumprimento das normas técnicas pré-estabelecidas e dos preceitos deste Ato Normativo, a AEB poderá adotar as seguintes providências:

I - conceder o prazo de até trinta dias para que a licenciada cumpra o Ato Normativo;

II - aplicar multas, de acordo com a gravidade da infração;

III - suspender a licença ou a autorização;

IV - revogar a licença ou a autorização.

§ 1° A aplicação de penalidades não eximirá o infrator da responsabilidade civil e penal eventualmente cabível pelas infrações cometidas.

§ 2° A aplicação das penalidades previstas nos incisos II, III e IV será de competência exclusiva do Presidente da AEB.

Art. 23. A licença poderá ser suspensa ou revogada:

I - em caso de falência da licenciada;

II - se os serviços forem suspensos pela licenciada, por período excedente a 6 (seis) meses;

III - se a licenciada exercer atividade diversa da que lhe tenha sido deferida;

IV - se a licenciada executar serviços de manutenção ou de reparação sem observância das leis ambientais brasileiras;

V - se, em processo administrativo, ficar comprovada a perda da aptidão técnica ou da capacidade financeira da licenciada para continuar exercendo as atividades de lançamento para as quais tenha sido deferida.

Art. 24. Serão puníveis com multa as seguintes infrações:

I - prestação de informações inverídicas quanto aos requisitos necessários à obtenção da autorização;

II - suspensão do lançamento, pela própria licenciada, por período superior a seis meses;

III - inobservância do inciso VI do artigo 8°.

Parágrafo único. A multa será graduada de acordo com a gravidade da infração.

Art. 25. A aplicação das penalidades de suspensão, de revogação da licença ou da autorização será formalmente motivada nos autos do processo, assegurado o contraditório e a ampla defesa.

Art. 26. Caberá recurso à autoridade superior das decisões denegatórias de expedição, modificação ou transferência de licenças espaciais ou de autorizações e das que determinarem a sua suspensão ou revogação ou impuserem o pagamento de multa ou outra sanção, bem como das decisões que determinarem a suspensão, o adiamento ou o cancelamento de quaisquer lançamentos espaciais.

Capítulo VII

DA FISCALIZAÇÃO

Art. 27. As atividades das licenciadas serão acompanhadas e fiscalizadas pela AEB.

§ 1° A AEB poderá contratar terceiros para o desempenho de tarefas de acompanhamento e de fiscalização do desempenho das licenciadas, seus prepostos, contratados e associados, podendo, para tanto, celebrar convênios e contratos com entidades públicas e privadas.

§ 2° O representante da AEB anotará em registro próprio todas as ocorrências relacionadas com o desempenho das licenciadas, determinando o que julgar necessário para a regularização das faltas e deficiências observadas.

§ 3° As decisões e providências que exorbitarem da competência do representante deverão ser solicitadas à autoridade superior, em tempo hábil, para a adoção das medidas convenientes.

Art. 28. A AEB manterá em caráter confidencial as informações obtidas em decorrência de sua fiscalização e assumirá o compromisso, com a licenciada, seus associados, prepostos e contratados, de não as divulgar a terceiros, nem autorizar que o faça qualquer entidade pública ou privada por ela contratada.

Capítulo VIII

DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 29. Todo e qualquer ato relativo à expedição, denegação, alteração, revogação ou anulação de licenças espaciais, autorizações e penalidades será formalizado mediante Portaria do Presidente da AEB e publicado no Diário Oficial da União, sem prejuízo de comunicação por escrito ao interessado.

Art. 30. A publicação resumida do Termo de Responsabilidade efetuada no Diário Oficial da União é condição indispensável para sua eficácia e será providenciada pela AEB até o quinto dia útil de sua assinatura.

Art. 31. As deliberações da AEB, ainda que provisórias, no sentido de deferir, denegar, alterar, revogar ou anular licenças ou autorizações espaciais terão efeito imediato.

(*) Nota:   Esta minuta de Ato Normativo das Atividades de Lançamentos Espaciais foi preparada por Grupo de Trabalho, criado no âmbito do Núcleo de Estudos de Direito Espacial da SBDA, com a incumbência de elaborar anteprojeto de legislação sobre as atividades espaciais brasileiras. Sua tarefa desenvolveu-se sob a coordenação do Embaixador Carlos José Campelo (AEB) e teve como relatores, sucessivamente, a Dra. Paula Miranda de Vasconcellos (então, INFRAERO) e o Prof. Élio Monnerat Solon de Pontes (SBDA).   Finalmente, ao produzir e aqui publicar o documento, a SBDA desejou efetivamente contribuir para a progressiva construção do sistema jurídico espacial brasileiro. (Volta ao título).

(Volta à página anterior)

barra.gif (3737 bytes)