Relações entre Direito Espacial e
Direito do Desenvolvimento *
José Monserrat Filho **
"O jurista, como qualquer pessoa que
pretenda atuar sobre
a realidade, deve partir dela, isto é,
simultaneamente dos
fenômenos sociais e das regras que lhe são
aplicáveis."
Michel Virally¹
1. Introdução
O Direito Espacial Internacional e o Direito
Internacional do Desenvolvimento são alicerçados no Direito
Internacional moderno, que tem por base a Carta da Organização das
Nações Unidas (ONU). Emergem na mesma época, como produtos
diferentes de um mesmo contexto histórico – o da Guerra Fria, com
crescentes arsenais nucleares, e de extrema concentração de
riquezas, de conhecimentos científico-tecnológicos e de poder
político-militar em algumas poucas potências e suas empresas.
Por isso mesmo, os dois direitos parecem ter
nascido em planetas distintos. O primeiro surge com o objetivo
central de ordenar e reduzir as áreas de conflito entre as
superpotências em franco confronto. O segundo aflora dos anseios de
desenvolvimento da maioria esmagadora dos países, em geral pobres –
o chamado Terceiro Mundo –, numa época em que a economia mundial
demonstrava vitalidade para crescer em ritmo inusitado, atingindo
altos níveis na produção de bens materiais.
Na criação do Direito Espacial Internacional
imperam, absolutas, as preocupações estratégico-militares e de
prestígio das superpotências. Elas buscam evitar o pior a cada
crise, ganhar tempo para criar armas ainda mais letais, conquistar
novos espaços políticos, aguardar condições mais propícias para
resolver o impasse e, ao mesmo tempo, exibir uma imagem positiva,
construtiva e humanista para o resto do mundo.
Na formação do Direito Internacional do
Desenvolvimento, o desafio é frear e reduzir a crescente
desigualdade que separam o grupo de países industrializados de todos
os outros, periféricos e dependentes, e abrir caminho para a
construção de um mundo mais equilibrado e justo. Como frisa Maurice
Flory, o Terceiro Mundo passava "de uma reivindicação econômica à
idéia de uma intervenção do direito em favor do desenvolvimento",
tratando de moldar um ambicioso direito "a serviço de um projeto: o
nascimento de uma nova ordem econômica internacional"².
Começa o que Ignacy Sachs – por analogia com "A Era dos Direitos"
(L’âge des droits, 1990) de Norberto Bobbio – chamou de "A Era do
Desenvolvimento", não porque um desenvolvimento geral tenha se
efetivado, mas porque a noção de desenvolvimento assumiu posição
central nas preocupações da ONU e se enriqueceu consideravelmente:
abandonou a idéia estreita do mero crescimento econômico e alarga-se
com sucessivos e necessários acréscimos – desenvolvimento econômico,
social, cultural, político, sustentável, humano e, por fim,
desenvolvimento-total, visando à plena realização dos homens e das
mulheres em vez da multiplicação dos bens.³
Falamos do Direito Internacional do
Desenvolvimento, mas também se pode falar em Direito ao
Desenvolvimento. O primeiro seria um direito dos Estados e o segundo
um direito mais geral e abrangente, do homem, dos povos e dos
Estados. O Direito ao Desenvolvimento tornou-se parte integrante dos
Direitos Humanos. Protege todos os seres humanos, em conjunto e
individualmente, seja qual for a nacionalidade, cidadania, etnia e
posição social de cada um. Negar o Direito ao Desenvolvimento é
tentar impedir a humanização da espécie, o florescimento sempre mais
rico das potencialidades humanas, que está na raiz da civilização
dos habitantes do planeta Terra, aparentemente ainda únicos no
universo.
O Direito Internacional do Desenvolvimento, por
sua vez, reúne os princípios e normas legais, inclusive do Direito
Econômico Internacional, bem como projetos destinados a construir um
ordenamento internacional, que estimule e apóie os esforços de
desenvolvimento em todos os países, a começar pelos mais carentes.
Robert Charvin nota bem que "o Direito do Desenvolvimento não se
ergue sobre a Lex Mercatoria nem sobre os contratos
concluídos com as empresas internacionais e os investidores,
fechados num quadro estreito, em geral bilateral e desfavorável à
parte mais fraca."4
Esse direito, porém, ao contrário do Direito
Espacial Internacional, não é um conjunto harmônico e sistematizado
de princípios e normas. Ainda não atingiu tal estágio e
provavelmente não chegará lá tão cedo. Mas tem um traço firme e
respeitável de coerência, entre os muitos e diversos documentos que
o compõem informalmente, apontado para seu objetivo maior, que está
em seu próprio nome.
Por que, então, relacionar o Direito Espacial
Internacional e o Direito Internacional do Desenvolvimento? Porque,
não obstante as diferenças, um exercício de Direito Comparado,
examinando, lado a lado, as origens, os desdobramentos, os
protagonistas, o alcance, os valores e os interesses envolvidos em
cada um deles, pode esclarecer, por novo ângulo, os reais avanços de
ambos sob o critério do processo da civilização humana e ajudar a
discernir as escolhas complexas e talvez decisivas que o século XXI
já nos impõe.
Se é verdade que este será o século do espaço,
com a fixação de assentamentos humanos na Lua, a viagem a Marte e o
conhecimento ainda muito mais profundo do universo, vale também
assinalar, como o fez José Eli da Veiga, que "a idéia de
desenvolvimento está no cerne da visão de mundo que prevalece em
nossa época".5 Nada mais natural e oportuno,
portanto, que interligar espaço e desenvolvimento – tanto no plano
político como no plano jurídico, sua mais elevada culminância.
2. Origens
Nos primeiros tempos, não parecia haver nenhuma
relação direta entre os dois Direitos, muito embora fossem ambos
novidades contemporâneas, e a humanidade, na percepção perspicaz de
Raymond Aron, vivesse pela primeira vez "em uma única e mesma
história". 6
A proposta e a própria expressão de um Direito
Internacional do Desenvolvimento são lançadas em 1964, num clima
mundial tenso e de grandes expectativas, pelo economista André
Philip (1902-1970), chefe da delegação francesa à 1ª Conferência das
Naões Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (CNUCD), realizada em
Genebra, de 23 de março a 15 de junho daquele ano. Logo depois, ele
publica o artigo "La Conférence de Genève, amorce d’un mouvement
mondial irréversible" ("Conferência de Genebra, detonador de um
movimento mundial irreversível"), na edição especial da revista
"Développement et Civilisations" ("Desenvolvimento e Civilizações")7,
dedicada ao evento. Em 1965, outro renomado jurista francês, Michel
Virally (1922-1989), já citado, leva o tema adiante e escreve o
célebre artigo "Vers un droit internatonal du développment" ("Rumo
ao Direito Internacional do Desenvolvimento").8
André Philip salienta em seu texto que, enquanto
a Conferência de Havana, de 1948, abordou problemas do comércio
mundial à luz apenas dos interesses dos países já desenvolvidos e do
pensamento liberal característico do século XIX, na 1ª CNUCD foram
expressas, pela primeira vez, as necessidades peculiares dos países
em desenvolvimento em matéria de comércio. Ele enfatiza também que
"o hiato ora existente entre os países em vias de desenvolvimento e
os desenvolvidos, sejam esses da Europa Oriental, da Europa
Ocidental ou dos EUA, está destinado a crescer progressivamente, até
que se promova uma transformação completa das políticas econômicas
internacionais".
A 1ª CNUCD esteve longe de atender aos anseios,
provavelmente irreais e até ingênuos, dos países subdesenvolvidos,
em geral estreantes na arena mundial. Mas, como também frisa André
Philip, "ela foi útil e marcou talvez uma virada na evolução
política do mundo".
O clamor pelo desenvolvimento – gerado nas longas
lutas contra os impérios coloniais e no duro processo de
descolonização, bem como nas respostas às desigualdades cada vez
mais gritantes que as estruturas reinantes à época na economia
mundial produziam – passa a ganhar destaque nos debates
internacionais.
O relatório mais relevante da 1ª CNUCD deixa
lavrado um princípio que permanece atual: "O desenvolvimento
econômico e o progresso social devem ser preocupação comum de toda a
comunidade internacional e, em aumentando-se a prosperidade e o
bem-estar econômico, devem contribuir para reforçar as relações
pacíficas e a cooperação entre as nações"9. É um
dos imperativos globais de hoje.
A 1ª CNUCD revela o enorme potencial
político-institucional a ser explorado na Assembléia Geral da ONU
nos anos subseqüentes, em favor do desenvolvimento dos países. Já em
1965, a Assembléia Geral aprova a criação do Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), reestruturado em 1970 – que
até hoje desempenha papel importante no levantamento da situação
econômica e social dos países – e da Organização das Nações Unidas
para o Desenvolvimento Industrial (ONUDI), destinada a fomentar a
industrialização dos países em desenvolvimento, coordenando e
centralizando as diversas entidades da ONU que se ocupavam do
assunto de forma desordenada.10 No entanto, só 20
anos depois, em 1985, a ONUDI lograria se tornar um organismo
especializado da ONU. Os entraves eram bem maiores do que se
supunha.
O mundo, então, já ingressara na Era Espacial,
inaugurada pela União Soviética, em 4 de outubro de 1957, com o
lançamento do primeiro satélite artificial da Terra, o Sputnik I, a
bordo do primeiro foguete lançador, o R-7, chamado de "Semiorka",
que era também o primeiro míssil balístico intercontinental.
Inúmeros cosmonautas e astronautas já haviam dado muitos giros em
redor da Terra, a partir do vôo inaugural do russo Iuri Gagarin, em
12 de abril de 1961. A primeira mulher a entrar em órbita, a russa
Valentina Tereshcova, já dera 48 voltas em torno do nosso planeta,
entre 16 e 19 de junho de 1963.
As telecomunicações por satélite – até hoje de
longe a mais lucrativa atividade espacial civil – já assombravam o
mundo. O primeiro satélite de telecomunicações, Echo-1, fora lançado
pelos EUA em 12 de agosto de 1960, e o segundo, Telestar 1, em 12 de
julho de 1962. O primeiro satélite geoestacionário, Syncom 3, subira
em 19 de agosto de 1964, tendo transmitido imagens dos Jogos
Olímpicos de Tóquio e servido para ligações na guerra do Vietnã. No
dia seguinte, 20 de agosto de 1964, os Estados Unidos e mais dez
países haviam fundado a primeira organização mundial de
telecomunicações, a conhecida Intelsat (International
Telecommunications Satellite Organization), com sede em Washington.
O uso militar de satélites de reconhecimento
(espionagem) já se comprovara promissor e, por isso mesmo,
prioritário dos serviços de inteligência dos Estados Unidos e da
União Soviética. Ainda em 1956, um ano antes, portanto, do início da
Era Espacial, o Governo norte-americano elaborara o projeto Corona
11, precursor dos chamados "satélites espiões". E,
a partir de 1960, lançara os satélites Salmos e Vela. A URSS, por
sua vez, desenvolvera a série Cosmos, inaugurada em 1962, que
preencheria extensa folha de serviços ao longo de toda a Guerra
Fria.
O Comitê das Nações Unidas para o Uso Pacífico do
Espaço (United Nations Committee on the Peaceful Uses of Outer Space
– COPUOS), criado em 1959 como instância internacional de debate e
negociação das regras destinadas a reger as atividades espaciais e
criar o regime jurídico do novo meio, começara a funcionar de fato
em 1961 – após acordo entre as potências rivais sobre sua composição
e a obrigatoriedade do consenso no processo de tomada de decisões –
e já preparara para a aprovação da Assembléia Geral da ONU pelo
menos quatro importantes resoluções, as primeiras fontes do então
nascente Direito Espacial:
I) Resolução 1721, de 20 de dezembro de 1961, que
indicou dois princípios básicos para as atividades espaciais dos
Estados: (1) O Direito Internacional, inclusive a Carta da ONU, se
aplica ao espaço exterior e aos corpos celestes; e (2) o espaço
exterior e os corpos celestes poderão ser livremente pesquisados e
usados por todos os Estados, de acodo com o Direito Internacional, e
não poderão ser objeto de apropriação nacional;
II) Resolução 1884 (XVIII), de 17 de outubro de
1963, que insta os Estados a se absterem de colocar armas nucleares,
e qualquer outra de destruição em massa, em órbita em torno da
Terra, nos corpos celestes e de qualquer outra forma no espaço;
III) Resolução 1962 (XVIII), de 13 dezembro de
1963, contendo a "Declaração dos Princípios Jurídicos Reguladores
das Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico",
base de elaboração do Tratado do Espaço de 1967, ainda hoje a lei
maior das atividades espaciais.
IV) Resolução 1963 (XVIII), também de 13 de
dezembro de 1963, com duas indicações a destacar: 1) Recomenda a
elaboração de um acordo com os princípios jurídicos destinados a
reger as atividades espaciais, que resultou no Tratado sobre
Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração e
Uso do Espaço Cósmico, Inclusive a Lua e Demais Corpos Celestes,
conhecido como "Tratado do Espaço", aprovado em dezembro de 1966 e
vigente desde 10 de outubro de 1967; 2) Saúda as decisões da
Conferência Administrativa Extraordinária de Radiocomunicações,
promovida pela União Internacional de Telecomunicações (UIT) em
outubro e novembro daquele ano, sobre a alocação de faixas de
freqüência para comunicações espaciais por rádio e o modo de usá-las
– o primeiro passo para o desenvolvimento das telecomunicações
espaciais.
Essas resoluções 12 serviram de
base para a elaboração, também no COPUOS – em apenas dois anos, de
1964 a 1966 – do Tratado sobre os Princípios Reguladores das
Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico,
Inclusive a Lua e Demais Corpos Celestes – conhecido como o "Tratado
do Espaço" –, aberto à assinatura dos Estados em 27 de janeiro de
1967 e em vigor desde 10 de outubro daquele mesmo ano.
Isso significa que os fundamentos do Direito
Espacial Internacional já estavam dados em 1964. O Tratado de 1967 e
as convenções subseqüentes 13, ainda hoje
vigentes, no essencial apenas detalharam as indicações acordadas
naquela primeira etapa.
Há uma exceção, porém. É o Acordo que Regula as
Atividades dos Estados na Lua e outros Corpos Celestes – o polêmico
"Acordo da Lua" –, lançado à assinatura em 1979 e em vigor desde
1984. Ele pertence a outra época, o que transparece em vários de
seus aspectos. Desviou-se um tanto da vertente original. Daí,
certamente, o isolamento e o desprezo a que foi condenado, como
veremos mais adiante.
Assim, em 1964, ao surgir a idéia de um Direito
Internacional ao Desenvolvimento, as atividades espaciais já eram
uma realidade vigorosa, que incluia os alicerces de seu próprio
ordenamento internacional, criado, como se dirá mais tarde, à
"velocidade cósmica".
Tais atividades envolviam, a um tempo, permanente
cooperação diplomática e feroz competição entre as superpotências,
Estados Unidos e União Soviética – a França seria a terceira, após
lançar seu primeiro foguete, Diamant, em 1965. Eram programas
milionários. Consumiam recursos que pareciam inesgotáveis,
mobilizavam um exército crescente de especialistas altamente
qualificados e galvanizavam a opinião pública do mundo inteiro em
torno de uma corrida vertiginosa por mais prestígio e maior poder
tecnológico e militar. Intensa propaganda se fazia dos notáveis
avanços espaciais. Mas eles quase nunca eram relacionados às
prementes necessidades de desenvolvimento da maioria dos países.
Um dos primeiros princípios do Direito Espacial,
como vimos, é o que estabeleceu a aplicação do Direito
Internacional, inclusive a Carta da ONU, ao espaço cósmico e aos
corpos celestes. Adotado nas Resoluções 1721 e 1962 (4º Princípio da
Declaração de 1963), consolidou-se no Tratado do Espaço de 1967
(Artigo 3º).
Às potências antagônicas não poderia interessar a
criação de nova ordem jurídica no espaço, diferente daquela reinante
na Terra, que já garantia o predomínio de ambas. Elas convergiram em
submeter as atividades espaciais e o próprio espaço cósmico às
regras do jogo já reconhecidas e, em especial, às normas da Carta da
ONU, que lhes conferiam os privilégios vitalícios de membros
permanentes do Conselho de Segurança, como o controle, através do
direito de veto, sobre as formas de lidar com os conflitos entre si
mesmas e em suas respectivas áreas de influência. Assim, a rápida
incorporação do Direito Internacional e, em particular, da Carta da
ONU, ao nascente Direito Espacial se deveu bem mais a imperativos
estratégico-militares do que a qualquer anseio de ampla cooperação
no setor espacial.
Acontece que a Carta da ONU, além de instituir o
Conselho de Segurança com o direito de veto exclusivo para apenas
cinco potências, também exalta a cooperação e o desenvolvimento em
benefício de todos os países membros. Seu Capítulo IX,
revolucionário para seu tempo, é todo dedicado à Cooperação
Internacional Econômica e Social. Nele sobressaem dois momentos.
O Artigo 55:
"Com o fim de criar condições de estabilidade e
bem estar, necessárias às relações pacíficas e amistosas entre as
Nações, baseadas no respeito ao princípio da igualdade de direitos e
da autodeterminação dos povos, as Nações Unidas favorecerão:
a) níveis mais altos de vida, trabalho efetivo e
condições de progresso e desenvolvimento econômico e social;
b) a solução dos problemas internacionais
econômicos, sociais, sanitários e conexos; a cooperação
internacional, de caráter cultural e educacional; e
c) o respeito universal e efetivo dos direitos
humanos e das liberdades fundamentais para todos, sem distinção de
raça, sexo, língua ou religião."
E o Artigo 56:
"Para a realização dos propósitos enumerados no
Artigo 55, todos os Membros da Organização se comprometem a agir em
cooperação com esta, em conjunto ou separadamente."
Que impacto tiveram tais normas sobre o Direito
Espacial Internacional naqueles instantes iniciais? Nenhum. Os
textos fundadores do Direito Espacial não mencionam concretamente
nenhum vínculo entre as atividades espaciais e o compromisso das
nações de fomentarem níveis mais elevados de vida, trabalho efetivo,
condições de progresso e desenvolvimento econômico e social, a
solução dos problemas internacionais econômicos, sociais e conexos,
a cooperação internacional de caráter cultural e educacional, o
respeito universal e efetivo dos direitos humanos e das liberdades
fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou
religião.
O máximo que se logrou, nesse terreno, foi a
chamada "cláusula do bem-comum", cuja importância de modo algum pode
ser subestimada, muito embora ainda deva ser devidamente detalhada e
valorizada. Ela está assim expressa no Artigo 1º do Tratado do
Espaço:
"A exploração e o uso do espaço cósmico,
inclusive da Lua e demais corpos celestes, só deverão ter em mira o
bem e interesse de todos os países, qualquer que seja o estágio de
seu desenvolvimento econômico e científico, e são incumbência de
toda a humanidade."
A cláusula do bem-comum tem, pelo menos, a
vantagem de suscitar questões cruciais de suma atualidade: Como
torná-la efetiva, sem, ao mesmo tempo, assumir metas claras de
desenvolvimento econômico e social? Ou, usando as palavras do
próprio artigo, como fazer com que a exploração e o uso do espaço
cósmico, inclusive a Lua e demais corpos celestes, tenham em mira
exclusivamente o bem e o interesse de todos os países, seja qual for
o estágio de seu desenvolvimento econômico e científico, e
constituam incumbência de toda a humanidade, sem adotar objetivos
mais concretos de desenvolvimento dos países? A quem cabe definir o
bem e o interesse dos países, senão, em primeiro lugar, aos próprios
países, num processo de ampla e eqüitativa negociação? E como
formular essa definição, sem a participação ativa dos próprios
países?
Para ter impacto efetivo num mundo de tão
profundas e crescentes desigualdades, a cláusula do bem-comum não
pode permanecer como vaga manifestação de boas intenções. Precisa,
necessariamente, ser esmiuçada e circunstanciada, sob pena de
permanecer um princípio nobre mas demasiado geral e nada prático.
Nesse sentido, mais cedo ou mais tarde, caberá
pensar seriamente na ampliação das bases institucionais de fomento
internacional ao desenvolvimento das atividades espaciais em todos
os países interessados, seja qual for o estágio de seu
desenvolvimento econômico e científico. O caráter cada vez mais
essencial dessas atividades para a comunidade mundial como um todo e
para cada país em particular justifica plenamente a criação de um
organismo especializado da ONU para promover um esforço global
concertado no setor. Um primeiro passo seria a adoção de um
ambicioso Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento das
Atividades Espaciais, a exemplo daquele que a Assembléia Geral da
ONU aprovou ainda nos anos 60 para a área do desenvolvimento
econômico e social. São idéias aparentemente ainda distantes da dura
realidade do mundo atual, dominado pela estreita visão
estratégico-comercial das conquistas espaciais. Mas, se e quanto
mais a comunidade mundial conseguir avançar no rumo do enfrentamento
efetivo dos desafios globais do desenvolvimento geral e sustentável,
mais propostas como essas poderão se tornar alternativas úteis a
considerar.
Vale destacar, também, o princípio que proíbe a
colocação em órbita terrestre de armas de destruição em massa
(nucleares, químicas e biológicas), adotado ainda em 1963 por acordo
americano-soviético. Seu impacto foi muito positivo à época.
Sinalizava a disposição das superpotências de não transformar o
espaço exterior em campo de batalha, como que atendendo aos anseios
da opinião pública mundial, atormentada pelo aumento e
aperfeiçoamento incessante dos arsenais de efeito massivo aqui na
Terra.
As superpotências, porém, não ousaram fechar o
espaço exterior ao trajeto sub-orbital (que não entra em órbita) dos
mísseis balísticos intercontinentais – os veículos das armas de
destruição em massa. Se o tivessem feito, teriam interditado o
principal meio de ataque na guerra nuclear. E essa, sim, teria sido
uma decisão histórica capaz de realmente mudar os rumos da política
mundial. Os vultosos recursos consumidos na corrida armamentista –
que atingiram US$ 1 trilhão por ano na década de 80 – poderiam ter
sido investidos no esforço da ONU para promover o desenvolvimento
das nações mais atrasadas e carentes. Não tivemos essa ventura. O
Direito Espacial Internacional não conseguiu instituir o princípio
da exploração e uso do espaço exclusivamente para fins pacíficos,
como queria e ainda quer a maioria dos países.
A seguir a questão só se agravou. Hoje, dividido
por desigualdades ainda mais profundas, o mundo assiste à instalação
de armas sofisticadas e milionárias no espaço exterior, ao mesmo
tempo em que faltam recursos para concretizar os projetos muito mais
necessários, aprimorados e abrangentes de desenvolvimento
sustentável, que o planeta reclama.
No início, os criadores, promotores e partidários
do Direito Internacional ao Desenvolvimento não deram a devida
atenção à corrida armamentista das grandes potências, embora ela,
obviamente, reduzisse em grande escala a possibilidade e a
disposição das superpotências de financiar programas de apoio às
economias dos países subdesenvolvidos. Esse assunto, no entanto,
sequer constou da pauta da Conferência de Genebra, limitada por
inteiro a questões de comércio.
Michele Virally, contudo, não tardou a propor, em
1965, que "a idéia do Direito Internacional ao Desenvolvimento
deveria ser o ponto de partida e de inspiração de um verdadeiro
balanço do Direito Internacional contemporâneo frente ao problema
mais grave, que, junto com o da paz, o homem atual deve resolver". A
seu ver, "a oposição Norte-Sul [entre os países desenvolvidos e em
desenvolvimento], se não foi suplantada pela oposição Leste-Oeste
[EUA-URSS], já adquiriu importância pelo menos equivalente".14
Para Virally, caberia inventariar no Direito
Internacional em vigor tudo o que ainda configurava "o Direito
Internacional das desigualdades de desenvolvimento". E "após
delimitar os problemas práticos, haveria que apontar as soluções
certas, as adaptações bem-sucedidas, as constâncias necessárias, bem
como identificar as debilidades, insuficiências e lacunas, as partes
rígidas, as sobrevivências anacrônicas, que impedem o direito
existente de ser um Direito Internacional ao Desenvolvimento digno
desse nome".15
Não seria o Direito Espacial Internacional, ora
vigente, um direito da manutenção do statuo quo, isto é, da
desigualdade de desenvolvimento? As atividades espaciais continuam
concorrendo fortemente para ampliar cada vez mais a distância já tão
grande entre os países ricos e poderosos e a maioria dos demais.
Acaso não caberia, neste contexto de tão graves conseqüências
sociais e políticas, "identificar as debilidades, insuficiências e
lacunas, as partes rígidas, as sobrevivências anacrônicas", que
impedem o Direito Espacial Internacional de se tornar um fator de
desenvolvimento para todos os países – sobretudo naquelas atividades
espaciais atualmente imprescindíveis a qualquer projeto de
desenvolvimento nacional?
3. A Nova Ordem Econômica Internacional e o
Acordo da Lua
"Poucas iniciativas, ao longo de todo o século
XX, geraram tanto debate nos foros internacionais como o movimento
em prol de uma nova ordem econômica internacional, com atenção
especial aos direitos e deveres econômicos dos Estados", constata
Antônio Augusto Cançado Trindade, juiz e ex-presidente da Corte
Interamericana de Direitos Humanos e professor titular do Instituto
Rio Branco. E lembra que em apenas seis anos, de 1974 a 1980, sobre
o tema foram publicados cerca de 600 livros e 1600 artigos em
periódicos especializados, e preparados 700 estudos e relatórios no
Secretariado da ONU e organismos relacionados (CNUCD, Unesco,
Organização Internacional do Trabalho, Fundo Monetário
Internacional).16
Nos anos 70, cresce em grande escala a atuação
dos países em desenvolvimento na política mundial, o que se reflete,
sobretudo, nas decisões da Assembléia Geral e na conduta de outros
órgãos da ONU, inclusive o COPUOS.
Essa é a década em que a Assembléia Geral da ONU
adota pelo menos três documentos de apoio ao Direito ao
Desenvolvimento, que podem e devem ser examinados em conjunto, pois,
afinal, expressam uma série de preocupações comuns:
1) Declaração e Programa de Ação para a
Instauração de uma Nova Ordem Econômica Internacional, aprovada em
1974 pela IV Assembléia Geral Extraordinária da ONU;
2) Carta dos Direitos e Deveres Econômicos dos
Estados, aprovada na Resolução 3281 (XXIX), também de 1974, pela
Assembléia Geral Ordinária da ONU. 17
3) Acordo que Regula as Atividades dos Estados na
Lua e em Outros Corpos Celestes, aprovado em 1979 pela Assembléia
Geral da ONU, após longos debates iniciados em 1971. Conhecido como
o "Acordo da Lua", é o primeiro texto do Direito Espacial
Internacional a afirmar que as atividades espaciais devem "promover
níveis de vida mais elevados e melhores condições de progresso e
desenvolvimento econômico e social".18
A Declaração e a Carta exaltam a cooperação "no
estabelecimento de relações econômicas internacionais mais racionais
e equitativas" e na busca de "uma economia mundial equilibrada em
harmonia com as necessidades e interesses de todos os países,
especialmente os países em desenvolvimento".
A Declaração propõe como um dos princípios da
nova ordem econômica internacional "a mais ampla cooperação de todos
os Estados da comunidade internacional, baseada na eqüidade, pela
qual se possa banir as desigualdades prevalentes no mundo e
assegurar a prosperidade para todos".
Especial significado tem, neste sentido, o Artigo
13 da Carta, que reza em seus dois primeiros incisos:
"1. Todos os Estados têm o direito de
beneficiar-se dos avanços da ciência e da tecnologia para acelerar o
seu desenvolvimento econômico e social.
2. Todos os Estados devem promover a cooperação
científica e tecnológica internacional e a transferência de
tecnologia, com o devido respeito a todos os interesses legítimos,
inclusive, inter alia, os direitos e deveres dos detentores,
fornecedores e receptores de tecnologia. Todos os Estados devem, em
especial, facilitar o acesso dos países em desenvolvimento às
conquistas da ciência e da tecnologia modernas, a transferência de
tecnologia e à criação de tecnologia nacional para benefício dos
países em desenvolvimento, sob formas e de acordo com procedimentos
adequados às suas economias e necessidades."
Cabe salientar também o Artigo 15:
"Todos os Estados têm o dever de promover a
consecução do desarmamento geral e completo, sob controle
internacional efetivo, e de utilizar os recursos liberados pelas
medidas de desarmamento para o desenvolvimento econômico e social
dos países, distribuindo uma porção substancial de tais recursos
como meios adicionais para as necessidades dos países em
desenvolvimento."
Os países desenvolvidos não ficam alheios à
intensa mobilização dos países em desenvolvimento na Assembléia
Geral da ONU. Reunidos na França, reagem com a Declaração de
Rambouillet, de 17 de novembro de 1975, afirmando o ponto de vista
de que o crescimento e a estabilidade de suas economias "ajudarão a
prosperidade do conjunto do mundo industrial e dos países em
desenvolvimento". Essa visão contrasta com "a convicção dos países
do Terceiro Mundo de que o desenvolvimento não pode avançar de
maneira satisfatória caso se considerar como simples subproduto do
crescimento e da prosperidade dos países industrializados", conforme
diretriz aprovada na V CNUCD, realizada em Manilha, em 1979.19
Assim, o desenvolvimento pleiteado não abre mão do direito soberano
de decidir sobre seus caminhos e conteúdos. O confronto entre as
idéias de mais ou menos dependência e de mais ou menos independência
só fez crescer, a partir de então, na arena política mundial.
O Acordo da Lua, por sua vez, em seu Artigo 4º, §
1, não se limita a repetir o Artigo 1º do Tratado do Espaço e a
dizer que "a exploração e o uso da Lua são incumbência de toda a
humanidade e devem ter em mira o bem e o interesse de todos os
países, qualquer que seja o estágio de seu desenvolvimento econômico
e científico". Vai além e acrescenta duas referências absolutamente
novas, conquistadas pela ONU nos anos 70, como se lê na segunda
frase do mesmo Artigo 4º, § 1: "Especial atenção deve ser dada aos
interesses das gerações presentes e futuras, bem como à necessidade
de promover níveis de vida mais elevados e melhores condições de
progresso e desenvolvimento econômico e social, em conformidade com
a Carta da Organização das Nações Unidas."
Vale sublinhar que, pelo Artigo 30 da Carta dos
Direitos e Deveres Econômicos dos Estados, "a proteção, preservação
e melhoria do meio ambiente para as gerações presentes e futuras é
de responsabilidade de todos os Estados". A semente dessa notável
concepção humanista foi plantada na Conferência da ONU sobre Meio
Ambiente, em Estocolmo, em 1972, como compromisso de todos os
países: "Defender e melhorar o meio ambiente para as presentes e
futuras gerações". 20
O Acordo da Lua merece destaque ainda por três
outros aspectos fundamentais: o Artigo 3º veta por inteiro o uso
militar da Lua, enquanto o Artigo 11 define a Lua e seus recursos
naturais como "patrimônio comum da humanidade", e propõe a criação
de um regime internacional para regulamentar a exploração dos
recursos lunares, com pelo menos quatro objetivos: a) assegurar o
aproveitamento ordenado e seguro dos recursos naturais da Lua; b)
assegurar a gestão racional desses recursos; c) ampliar as
oportunidades de utilização de tais recursos; e d) promover a
participação eqüitativa de todos os Estados nos benefícios auferidos
dos recursos lunares, tendo especial consideração para os interesses
e necessidades dos países em desenvolvimento, bem como os esforços
dos Estados que contribuíram, direta ou indiretamente, na exploração
da Lua.
Os sonhos de instaurar uma nova ordem econômica
internacional na Terra e uma nova ordem espacial na Lua, no entanto,
estavam longe de se concretizar. O Acordo da Lua entrou formalmente
em vigor em 1984, após ter sido ratificado por cinco países, mas
ainda hoje tem apenas quatro assinaturas (França, Guatemala, Índia,
Romênia) e 12 ratificações (Austrália, Áustria, Bélgica,
Casaquistão, Chile, Filipinas, Marrocos, México, Países Baixos,
Paquistão, Peru e Uruguai). Dos cinco tratados do Direito Espacial
Internacional, é o que tem o menor número de países-participantes.
Não conta com o apoio das maiores potências espaciais, nem da
maioria dos países que realizam atividades espaciais. Os Estados
Unidos, em particular, evitam até mesmo mencioná-lo entre os
tratados vigentes; preferem se referir aos "quatro tratados
principais", em lugar dos "cinco grandes tratados espaciais"
normalmente nomeados nos plenários e trabalhos da ONU.
O conceito de Patrimônio Comum da Humanidade,
criado no final dos anos 60 como parte fulgurante da grande onda
pelo desenvolvimento em todos os países, ganhou prestígio
internacional e passou a constar de importantes documentos, mas
ainda hoje não se pode dizer que tenha se tornado universalmente
aceito.
O Artigo 29 da Carta dos Direitos e Deveres
Econômicos dos Estados tentou consolidá-lo: "A plataforma marítima e
o fundo do mar, e o subsolo respectivo, para além da jurisdição
nacional, assim como os recursos da área, são patrimônio comum da
humanidade. Com base nos princípios adotados pela Assembléia Geral,
em sua resolução 2749 (XXV), de 17 de dezembro de 1970, todos os
Estados devem garantir que a pesquisa da área e a exploração de seus
recursos sejam realizadas exclusivamente para fins pacíficos, e que
os benefícios daí derivados sejam partilhados eqüitativamente por
todos os Estados, levando em consideração os interesses e
necessidades particulares dos países em desenvolvimento; um regime
internacional válido para a área e seus recursos, e incluindo
equipamentos internacionais adequados para efetivar suas cláusulas,
deverá ser estabelecido por um tratado internacional de caráter
universal, concertado entre tantos."
Idéia similar foi transplantada depois para o
Acordo da Lua, como já vimos, e para a Convenção sobre o Direito do
Mar, de 1982. O Artigo 136 dessa convenção reza que "a Área e seus
recursos são patrimônio comum da humanidade", sendo o termo "Área"
definido no Artigo 1º como abrangendo "o leito do mar, os fundos
marinhos, e o seu subsolo além dos limites da jurisdição nacional".
E o Artigo 137 estabelece que "todos os direitos sobre os recursos
da Área pertencem à humanidade em geral, em cujo nome atuará a
Autoridade [Internacional dos Fundos Marinhos, conceito também
definido no Artigo 1º]". 21 Mas, em 1994, como
conditio sine qua non para sua ratificação pelos países
industrializados, firmou-se um acordo de implementação da Parte XI
da Convenção sobre o Direito do Mar, que abre o acesso desses países
e de suas empresas aos recursos do solo e subsolo marinho, através
de planos de exploração submetidos à Autoridade Internacional dos
Fundos Marinhos e de contratos com ela assinados.22
Foi um acordo de compromisso. A exploração dos fundos marinhos é
permitida, sob o controle e supervisão da Autoridade Internacional.
O interesse dos paises ricos e poderosos prevaleceu, mas a
comunidade internacional tem o direito de mantê-lo dentro de certos
critérios e limites. Resta saber como o sistema funcionará na
prática.
Com relação ao Acordo da Lua, tal compromisso
sequer foi cogitado. A exploração dos recursos lunares, cujo início
já está estimado para dentro de 15 a 20 anos, permanece uma questão
aberta. Estados Unidos, China, Japão e Rússia já se mobilizam nessa
direção, mas nos órgãos da ONU ainda não há sinais de debates e
propostas sobre como os assentamentos humanos e suas atividades na
Lua serão regulamentados, embora já fosse tempo de começar a pensar
no assunto, a fim de garantir também para o nosso satélite natural
um desenvolvimento sustentável.
Frans von der Dunk, jurista holandês, na revisão
do Acordo da Lua que propôs ao Comitê Espacial da International Law
Association (ILA), durante a 17ª Conferência da ILA, em Nova Delhi,
India, em 2002, substitui, nos Artigos 4º e 11, o termo "patrimônio
comum da humanidade" por "incumbência de toda a humanidade" ("common
heritage of mankind" por "the province of all mankind"). Essa
expressão consta do Artigo 1º, § 1, do Tratado do Espaço e não tem
qualquer conotação de propriedade comum, como a que se atribui ao
"patrimônio comum da humanidade". Limita-se à noção de área de uso
comum, aberta a todos, conforme o § 2 do mesmo Artigo. Por isso, é a
preferida dos países desenvolvidos. Não implica nenhuma divisão de
benefícios, inaceitável para eles, ainda que a divisão eqüitativa de
benefícios continue a ser uma alternativa para o mundo enfrentar
suas crescentes desigualdades e construir uma sociedade mais
equilibrada. Maureen Williams, professora da Universidade de Buenos
Aires e relatora-geral, além de presidente, do Comitê Espacial da
ILA, sugeriu a expressão "preocupação comum de toda a humanidade"
("common concern of all mankind"), já conhecida em outras áreas do
Direito Internacional, que parece ir além da "incumbência de toda a
humanidade" ("province of all mankind"), na medida em que pode
indicar, não apenas área de uso comum, mas também, e especialmente,
objeto de competente atenção por parte de todos os países, de toda a
comunidade internacional.23
Aproveitando a intensa movimentação internacional
dos países em desenvolvimento nos anos 60 e 70, um grupo de sete
países equatoriais (com território sobre a linha do Equador) –
Colômbia, Congo, Equador, Indonésia, Quênia, Uganda e Zaire (aos
quais depois se uniram Gabão e Somália) – assina em 1976 a
Declaração de Bogotá, reivindicando direito de soberania ou direitos
preferenciais sobre o trecho da órbita geoestacionária situada sobre
seus territórios, dado o papel fundamental dessa órbita nas
telecomunicações por satélite, que já se projetavam como o maior
negócio da área espacial. A iniciativa não produz o resultado
esperado. É rechaçada pela maioria absoluta dos países, inclusive do
Terceiro Mundo, pois contrariava o princípio da não-apropriação do
espaço exterior, lavrado no Artigo 2º do Tratado do Espaço. Mas teve
o mérito de pôr em relevo a então já polêmica questão do acesso
eqüitativo dos países em desenvolvimento à órbita geoestacionária e
suas freqüências. Tanto que, em 1982, o COPUOS, por pressão desses
países, promove a 2ª Conferência das Nações Unidas sobre a
Exploração e Uso Pacífico do Espaço Exterior (a 1ª Conferência
realizara-se em 1968), para tratar do acesso de todos os países aos
benefícios das atividades espaciais, em especial do uso da órbita
geoestacionária. Sendo o assunto de competência da União
Internacional de Telecomunicações (UIT), essa organização promove as
Conferências de 1985 e 1988 com o objetivo específico de criar um
sistema de acesso eqüitativo aos recursos órbita/freqüências,
garantindo a todos os países em desenvolvimento pelo menos uma
posição na órbita geoestacionária no futuro, quando eles tiverem
capacidade técnica para utilizá-la.
O princípio do acesso eqüitativo à órbita
geoestacionária, que pode ser considerado conquista dos países em
desenvolvimento, está definido claramente no artigo 44 da
Constituição da UIT de 1992:
"Os membros (da UIT) deverão empenhar-se para
limitar o número de freqüências e o espectro utilizado ao mínimo
indispensável a fim de assegurar, de maneira satisfatória, o
funcionamento dos serviços necessários. Para este fim, tentarão
aplicar, no menor prazo possível, os mais recentes avanços técnicos.
Na utilização das faixas de freqüências para os serviços de
radiocomunicações, os membros deverão considerar que as freqüências
e a órbita dos satélites geoestacionários são recursos naturais
limitados e devem ser utilizados de forma eficaz e econômica,
conforme as disposições dos Regulamentos de Radiocomunicações, para
permitir o acesso eqüitativo a essa órbita e a essas freqüências aos
diferentes países ou grupo de países, levando em consideração as
necessidades especiais dos países em desenvolvimento e a situação
geográfica de determinados países."
Também por iniciativa dos países em
desenvolvimento, o COPUOS discutiu durante muitos anos, a partir dos
anos 70, a regulamentação da transmissão direta internacional de
televisão por satélite, bem como do sensoriamento remoto dos países
por satélites de outros países. Em ambos os casos, os países em
desenvolvimento defenderam a necessidade de autorização nacional
prévia para a transmissão de imagens de televisão internacional e
para o sensoriamento remoto do território de cada país.
Em 1982, a Assembléia Geral da ONU aprovou a
Resolução 37/92, contendo os "Princípios
Reguladores do Uso pelos Estados de Satélites Artificiais da Terra
para Transmissão Direta Internacional de Televisão", que adota o
princípio da autorização prévia. Seu § 14 reza que "qualquer serviço
de transmissão direta internacional de televisão por satélite só
será estabelecido depois de atendidas às condições enunciadas no §
13 e com base em acordos ou entendimentos"; e o § 13 afirma que "o
Estado que pretenda criar ou autorizar a criação de um serviço de
transmissão direta internacional de televisão por satélite
comunicará imediatamente sua intenção ao Estado ou Estados
receptores e entrará, sem demora, em consulta com qualquer deles que
a solicitar".
A regra do consentimento prévio fora introduzida
pela Unesco em sua "Declaração dos Princípios Diretores do Uso de
Radiodifusão por Satélites para a Livre Circulação de Informação, a
Extensão da Educação e o Desenvolvimento dos Intercâmbios
Culturais", de 1972, cujo Artigo 9º dizia: "Para que os objetivos
definidos nos artigos precedentes possam ser atingidos, é preciso
que os Estados, levando em conta o princípio da liberdade de
informação, concluam ou estimulem acordos prévios para as emissões
por satélites destinadas à recepção direta pelo público de outro
país que não o país de origem dessas emissões".
O COPUOS não conseguiu se entender sobre a
matéria. Pela primeira e, até agora, única vez em sua história, não
houve consenso para decidir. Os países em desenvolvimento defendiam,
acima de tudo, o princípio da soberania, assim lavrado no § 1º da
própria resolução: "As atividades no campo da transmissão direta
internacional de televisão por satélite devem ser realizadas de modo
compatível com os direitos soberanos dos Estados, inclusive com o
princípio da não-intervenção". Já os países desenvolvidos
priorizavam o princípio da liberdade de expressão e da livre
circulação de informação. Criado o impasse, os países em
desenvolvimento, em muito maior número, resolveram levar o projeto
de resolução diretamente à apreciação da Assembléia Geral. O projeto
foi aprovado por folgada maioria de votos (107 a favor, 13 contra e
13 abstenções), mas sem o apoio dos países desenvolvidos, detentores
da tecnologia de transmissão de televisão por satélite, que logo
passaram a realizar suas transmissões internacionais de televisão
sem pedir licença aos países potencialmente receptores, como manda a
resolução. Já em 1984, o Comitê de Ministros do Conselho da Europa
recomendou aos países do continente que harmonizassem suas
legislações nacionais sobre o uso de satélites, com base no
princípio da liberdade de expressão e da livre circulação de
informações. Em 1989, foram adotadas a Convenção Européia sobre
Televisão Transfronteira, pelo Conselho da Europa, e a diretiva
"Televisão sem Fronteira", pela Comunidade Européia. A exigência de
consulta e autorização prévia estava liquidada.
Uma historia diferente ocorreu com a Resolução
41/65, adotada pela Assembléia Geral da ONU em 1986, contendo os "Princípios
sobre Sensoriamento Remoto da Terra a partir do Espaço Exterior".
Ela veio do COPUOS devidamente aprovada. A negociação foi difícil e
demorada, mas chegou-se a um texto de consenso. Os países em
desenvolvimento abandonaram a exigência tanto de autorização prévia
para o sensoriamento de seus territórios, como de acesso
preferencial às imagens de satélite sobre seus territórios, e
aceitaram os princípios do livre sensoriamento remoto de qualquer
lugar da Terra a qualquer hora e da livre distribuição (venda) das
imagens daí obtidas. Em troca, tiveram aprovados os princípios de
que as atividades de sensoriamento remoto "não poderão ser
realizadas de modo a prejudicar os direitos e interesses dos Estados
sensoriados"; o de que os países sensoriadores "deverão promover a
cooperação internacional nestas atividades"; o de que o país
sensoriado "deverá ter acesso" aos dados sobre seu próprio
território, "assim que forem produzidos, em base não-discriminatória
e a um custo razoável". Não foi uma troca equilibrada. Os países em
desenvolvimento concordaram com os princípios do livre sensoriamento
e da livre circulação de imagens, cujo cumprimento é garantido
plenamente pelo domínio tecnológico dos países sensoriadores, e
ganharam como recompensa princípios aparentemente muito positivos,
mas cuja garantia de cumprimento também depende por inteiro da boa
vontade dos países sensoriadores.
Foi, sem dúvida, mais uma vitória dos países
desenvolvidos. Vitória que se estende até o presente, quando eles se
opõem a qualquer projeto de revisão dos Princípios de 1986, apesar
das evidências de que o panorama das atividades de sensoriamento
remoto mudou por completo nos últimos 20 anos. Nenhum dos dois
projetos apresentados pelo Brasil no Subcomitê Jurídico do COPUOS,
respectivamente em 2002 e 2003, – um propondo o estudo da
viabilidade e necessidade da conversão dos Princípios de 1986 em
tratado24, e o outro apenas requerendo o exame das
práticas de sua aplicação – obteve o consenso necessário para ser
incluídos na pauta de discussão do órgão. Algumas grandes potências
vetaram até mesmo o simples debate da questão.25
Ninguém ignora, porém, que desde 1986 houve um
salto tecnológico e econômico notável nas atividades de
sensoriamento remoto. O comércio de imagens de satélite e a
privatização dessas atividades cresceram exponencialmente. Hoje,
imagens de satélite de alta resolução (de um metro e menos), antes
de uso exclusivo das Forças Armadas, são vendidas livremente, embora
se saiba que elas permitem a invasão da privacidade e a espionagem
industrial. É sensato propor que sua distribuição seja regulamentada
por acordo internacional. Seria justo e de todo conveniente definir
direitos, obrigações e responsabilidades, assim como estimular o
respeito e a cooperação entre os países nesta área crucial. A
utilização de tais imagens pode tanto contribuir para o
desenvolvimento dos países, quanto afetar legítimos interesses
nacionais. É preciso um esforço concentrado e permanente do maior
número possível de países para ampliar em grande escala a cooperação
internacional em torno do uso das tecnologias de sensoriamento
remoto nos mais diversos programas de desenvolvimento nacional.
4. Direito ao Desenvolvimento como Direito Humano
A idéia de considerar o Direito ao
Desenvolvimento como Direito Humano também nasce nos anos 70. A
primeira iniciativa, nesse sentido, parte da Comissão dos Direitos
Humanos da ONU e começa a materializar-se na Resolução 4 (XXXV) da
Assembléia Geral da ONU, de 4 de março de 1979, que recomenda ao
Conselho Econômico e Social convidar o Secretário Geral a estudar as
dimensões regionais e internacionais do Direito ao Desenvolvimento,
levando em especial consideração os obstáculos encontrados pelos
países subdesenvolvidos para assegurar o gozo daquele direito.
26
Como resultado, sete anos depois, em 1986, a
Assembléia Geral da ONU aprova a
Declaração sobre Direito ao Desenvolvimento, o
mais completo documento até hoje elaborado a respeito do tema.
O histórico documento define o Direito ao
Desenvolvimento, no seu Artigo 1º, como "um direito humano
inalienável, em virtude do qual toda pessoa e todos os povos estão
habilitados a participar do desenvolvimento econômico, social,
cultural e político, a ele contribuir e dele desfrutar, no qual
todos os direitos humanos e liberdades fundamentais possam ser
plenamente realizados". No Artigo 2º, § 1, atribui à pessoa humana a
condição de "sujeito central do desenvolvimento", e acrescentando
que ela "deveria ser participante ativo e beneficiário" do Direito
ao Desenvolvimento. E no Artigo 2º, § 3, reza que "os Estados têm o
direito e o dever de formular políticas nacionais adequadas para o
desenvolvimento, que visem o constante aprimoramento do bem-estar de
toda a população e de todos os indivíduos, com base em sua
participação ativa, livre e significativa no desenvolvimento e na
distribuição eqüitativa dos benefícios daí resultantes".
Por outro lado, "os Estados têm a
responsabilidade primária pela criação das condições nacionais e
internacionais favoráveis à realização do Direito ao
Desenvolvimento", segundo o Artigo 3º, § 1, da Declaração.
E, pelo § 3, "os Estados têm o dever de cooperar
uns com os outros para assegurar o desenvolvimento e eliminar os
obstáculos ao desenvolvimento" e "deveriam realizar seus direitos e
cumprir suas obrigações de modo tal a promover uma nova ordem
econômica internacional baseada na igualdade soberana,
interdependência, interesse mútuo e cooperação entre todos os
Estados, assim como a encorajar a observância e a realização dos
direitos humanos".
A Declaração indica, no Artigo 4º, que "é
necessária a ação permanente para promover um desenvolvimento mais
rápido dos países em desenvolvimento. Como complemento dos esforços
dos países em desenvolvimento, uma cooperação internacional efetiva
é essencial para prover esses países de meios e facilidades
apropriados para incrementar seu amplo desenvolvimento".
Vale destacar ainda dois outros momentos da
Declaração:
"Todos os Estados devem promover o
estabelecimento, a manutenção e o fortalecimento da paz e segurança
internacionais, e, para este fim, deveriam fazer o máximo para
alcançar o desarmamento geral e completo do efetivo controle
internacional, assim como assegurar que os recursos liberados por
medidas efetivas de desarmamento sejam usados para o desenvolvimento
amplo, em particular o dos países em via de desenvolvimento",
conforme estabelece o Artigo 7.
E, em conformidade com o Artigo 10,
"Os Estados
deverão tomar medidas para assegurar o pleno exercício e
fortalecimento progressivo do Direito ao Desenvolvimento, incluindo
a formulação, adoção e implementação de políticas, medidas
legislativas e outras, a níveis nacional e internacional".
Seis anos após a aprovação da Declaração sobre o
Direito ao Desenvolvimento, a Conferência Mundial sobre Meio
Ambiente, reunida no Brasil em 1992, adota a Declaração do Rio de
Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento e a Agenda 21. Esses
textos afirmam a necessidade de tratamento conjunto dos problemas do
desenvolvimento sócio-econômico e do meio-ambiente.
O conceito de desenvolvimento sustentável é
acolhido em dois dispositivos:
Princípio 3º: "O Direito ao Desenvolvimento deve
ser exercido de modo a permitir que sejam atendidas eqüitativamente
as necessidades de gerações presentes e futuras".
Princípio 4o: "Para alcançar o
desenvolvimento sustentável, a proteção ambiental deve constituir
parte integrante do processo de desenvolvimento, e não pode ser
considerada isoladamente deste".
O Direito ao Desenvolvimento, a partir de então,
passa incorporar o critério da sustentabilidade – altamente
saudável, até pelo fato de produzir intensas controvérsias,
discussões e pesquisas.
Em 1993, a Conferência Mundial de Direitos
Humanos de Viena reafirma, no Artigo 10 de sua Declaração e Programa
de Ação, o Direito ao Desenvolvimento como parte integrante e
inalienável dos Direitos Humanos fundamentais.
Mas, o fato mais importante em Viena é que, pela
primeira vez, a comunidade internacional reconhece, consensualmente,
o Direito ao Desenvolvimento como parte integrante dos Direitos
Humanos e recomenda a cooperação internacional para implementá-lo.27
Cabe ainda salientar três referências da
Declaração de Viena, pertinentes à relação entre desenvolvimento e
atividade espacial:
- "A comunidade internacional deve promover uma
cooperação internacional eficaz visando à realização do Direito ao
Desenvolvimento e à eliminação de obstáculos ao desenvolvimento";
- "O progresso duradouro necessário à realização
do Direito ao Desenvolvimento exige políticas eficazes de
desenvolvimento em nível nacional, bem como relações econômicas
eqüitativas e um ambiente econômico favorável em nível
internacional";
- "Todas as pessoas têm o direito de desfrutar
dos benefícios do progresso científico e de suas aplicações".28
Em 1994, a Conferência da ONU sobre População e
Desenvolvimento, reunida no Cairo, igualmente reitera o Direito ao
Desenvolvimento como direito humano inalienável, e, ao mesmo tempo,
rejeita a tese de que o subdesenvolvimento justificaria limitações
dos direitos humanos.
Em 1995, a Reunião de Cúpula de Copenhague para o
Desenvolvimento Social reforça o conceito de desenvolvimento
sustentável, que, numa estratégia integrada, abarcaria a idéia
multifacetada de desenvolvimento econômico, social, ambiental e
cultural.
A Declaração de 1986 e as Conferências da ONU
realizadas nos anos 90 contribuem em grande escala para consolidar
fortemente o vínculo do Direito ao Desenvolvimento aos Direitos
Humanos. Isso favorece uma nova noção de desenvolvimento ou
crescimento econômico, que pede, ao mesmo tempo, justiça e
oportunidade para todas as pessoas e todas as nações e tratamento
racional e sustentável dos recursos naturais finitos do planeta. Aí
se reflete a velha esperança de tornar a Terra um lugar melhor e
mais seguro para viver.
Ocorre que, como bem percebeu o diplomata José
Augusto Lindgren Alves, o Direito ao Desenvolvimento "afeta, no
mundo real, os interesses estabelecidos dos países desenvolvidos –
assim como, nas órbitas domésticas, dos segmentos dominantes".29
Daí que não é fácil conseguir que ele seja "aplicado e
concretizado", como almeja o próprio Programa de Ação de Viena. O
"regime de consultas e cooperação" destinado a formular "medidas
abrangentes e eficazes para eliminar obstáculos à aplicação" da
Declaração de Viena ainda não produziu resultados.
No final dos anos 80 e ao longo dos anos 90,
enquanto o Direito ao Desenvolvimento conquista o status de
Direito Humano, na doutrina e em documentos altamente
representativos, no Subcomitê Jurídico do COPUOS trava-se intenso
debate sobre os "benefícios espaciais" que os países poderiam obter
com base no Artigo 1º do Tratado do Espaço. O tema em discussão
recebe um título longo: "Aspectos legais relativos à aplicação do
princípio de que a exploração e o uso do espaço exterior devem ter
em mira o bem e o interesse de todos os países, levando-se em
especial consideração as necessidades dos países em
desenvolvimento".30 Em 1988, ele é aprovado para
constar da agenda de trabalho do Subcomitê Jurídico, que, no ano
seguinte, designa um grupo de trabalho para estudá-lo. Esse grupo de
trabalho inicia suas atividades em 1991.
Trata-se de mais uma iniciativa dos países em
desenvolvimento, dentro dos anseios de construir uma nova ordem
econômica internacional, desta feita tendo em vista as atividades
espaciais. Dois projetos com um elenco de princípios foram
encaminhados à apreciação dos países membros do COPUOS, em 1991 e em
1993, – o primeiro assinado por nove países: Argentina, Brasil,
Chile, Filipinas, México, Nigéria, Paquistão, Uruguai e Venezuela; o
segundo, pelos mesmos países, mais a Colômbia.
O projeto de 1991, considerado inaceitável pelos
países desenvolvidos, tem as seguintes propostas principais:
1) Os países com competência e programas
espaciais importantes são responsáveis por promover e fazer avançar
a cooperação internacional no campo da ciência e tecnologia
espaciais e de suas aplicações;
2) Todos os países devem ter acesso ao
conhecimento e às aplicações derivadas da exploração e uso do espaço
exterior para fins pacíficos, de forma eqüitativa, não
discriminatória e oportuna;
3) Os países que realizam programas de uso e
exploração do espaço exterior devem permitir o acesso ao
conhecimento e às aplicações daí decorrentes aos outros países, em
particular aos países em desenvolvimento, por meio de programas
internacionais de cooperação especificamente designados para esse
fim;
4) Os países em desenvolvimento devem gozar de
tratamento especial nos programas de cooperação internacional
ligados às atividades espaciais; a eles deve ser concedida
preferência nos programas orientados a disseminar conhecimentos
científicos e tecnológicos, e deles não se pode exigir
reciprocidade; e
5) O principal objetivo da cooperação espacial
internacional deve ser o desenvolvimento de competência nacional em
ciência e tecnologia e suas aplicações por todos os países.
Ante a recusa dos países desenvolvidos, o projeto
de 1993 propõe mudanças substanciais em relação ao anterior:
1) Os países com competência e programas
espaciais importantes devem contribuir para promover e fazer avançar
a cooperação internacional no campo da ciência e tecnologia espacial
e suas aplicações;
2) Os países são soberanos para decidir as
modalidades de sua cooperação, levando em conta a solidariedade e a
eqüidade que devem prevalecer na exploração e uso do espaço exterior
para fins pacíficos, como incumbência de toda a humanidade, em
particular no marco da cooperação multilateral;
3) Todos os países devem ter acesso ao
conhecimento e às aplicações derivadas da exploração e uso do espaço
exterior para fins pacíficos, de forma eqüitativa, não
discriminatória e oportuna;
4) Os países que realizam programas de uso e
exploração do espaço exterior devem facilitar o acesso ao
conhecimento e às aplicações daí decorrentes aos outros países, em
particular aos países em desenvolvimento, através de programas de
cooperação internacional designados para esse propósito;
5) As condições oferecidas a um país no programa
específico de cooperação espacial devem ser, adequadamente,
estendidas aos outros países quando um programa similar de
cooperação internacional for estabelecido;
6) Os países em desenvolvimento devem ter o
benefício de um tratamento que os capacite ao completo
aproveitamento da cooperação espacial internacional; esse tratamento
é especialmente relevante nos programas orientados à disseminação do
conhecimento científico e tecnológico e deve levar em conta o nível
de desenvolvimento dos países envolvidos na cooperação;
7) O principal objetivo da cooperação espacial
internacional deve ser o desenvolvimento de competência nacional em
ciência e tecnologia e suas aplicações por todos os países.
Em 1996, após três anos de intenso debate,
chegou-se a um consenso em torno de um documento que recebeu o nome
de "Declaração
sobre a Cooperação Internacional na Exploração e Uso do Espaço
Exterior em Benefício e no Interesse de Todos os Estados, Levando em
Especial Consideração as Necessidades dos Países em Desenvolvimento",
aprovado pela Assembléia Geral da ONU.
A declaração, negociada palavra por palavra, reza
em seus itens mais importantes:
1) Na cooperação internacional na exploração e
uso do espaço exterior para fins pacíficos, as necessidades dos
países em desenvolvimento devem ser levadas em especial
consideração.
2) Os países têm liberdade para definir todos os
aspectos de sua participação na cooperação para a exploração e uso
do espaço exterior, em bases eqüitativas e mutuamente aceitáveis. Os
termos contratuais destes empreendimentos cooperativos devem ser
justos e razoáveis e estar em plena conformidade com os direitos e
interesses legítimos das partes concernentes, como, por exemplo, com
os direitos de propriedade intelectual.
3) Todos os países, especialmente os com
importante capacidade espacial e com programas de exploração e uso
do espaço exterior, devem contribuir para a promoção e o avanço da
cooperação internacional em bases eqüitativas e mutuamente
aceitáveis. Neste contexto, atenção especial deve ser prestada ao
bem e ao interesse dos países em desenvolvimento e países cm
programas espaciais incipientes decorrentes desta cooperação
internacional promovida com países dotados de capacidade espacial
mais avançada.
4) A cooperação internacional deve ser conduzida
através de modalidades que os países concernentes considerem mais
efetivas e apropriadas, inclusive, inter alia, modalidades
governamentais e não-governamentais; comerciais e não comerciais,
globais, multilaterais, regionais e bilaterais; e cooperação
internacional entre os países, em todos os níveis de
desenvolvimento.
5) A cooperação internacional, ao levar em
especial consideração as necessidades dos países em desenvolvimento,
deve perseguir, inter alia, os seguintes objetivos, tendo em
vista eficiente alocação de recursos:
— Promover o desenvolvimento da ciência e
tecnologia espaciais e de suas aplicações;
— Estimular o desenvolvimento das capacidades
espaciais relevantes e apropriadas nos países interessados;
— Facilitar o intercâmbio de especialistas e de
tecnologias entre os Estados, em bases mutuamente aceitáveis.
6) As agências nacionais e internacionais, as
instituições de pesquisa, as organizações de ajuda ao
desenvolvimento, bem como os países desenvolvidos e em
desenvolvimento devem considerar o uso apropriado de aplicações
espaciais e o potencial da cooperação internacional para alcançarem
seus objetivos de desenvolvimento.
7) Todos os países devem ser estimulados a
contribuírem para o Programa das Nações Unidas de Aplicações
Espaciais e para outras iniciativas no campo da cooperação
internacional de acordo com suas capacidades espaciais e com sua
participação na exploração e uso do espaço exterior.
Como subproduto muito positivo dessa polêmica
toda, o Escritório da ONU para Assuntos Espaciais toma a iniciativa,
em 1990, de propor a criação de Centros Regionais de Educação em
Ciência e Tecnologia, cumprindo recomendação da II Conferência das
Nações Unidas para a Exploração e Uso do Espaço para Fins Pacíficos
(UNISPACE II), de 1982. Hoje há três desses centros: na Ásia, na
África e na América Latina (que se alterna entre o Brasil, em São
José dos Campos, SP, e o México).31 Está
comprovado que eles desempenham papel altamente valioso, mas, na
falta de maiores recursos, ainda têm uma atuação pouco expressiva
diante das necessidades dos países em desenvolvimento.
Fica claro, pela Declaração de 1996, que os
países desenvolvidos rejeitam categoricamente:
1) serem considerados como peças centrais na
cooperação espacial;
2) a cooperação como obrigação;
3) a divisão de benefícios, em quaisquer que
sejam os termos.
No entanto, como países incomparavelmente mais
avançados em ciência e tecnologia espacial, eles detêm os
conhecimentos essenciais de que a maioria dos países carece para o
desenvolvimento nacional e, portanto, sem sua ativa participação, a
cooperação desejada e indispensável será sempre mais pobre e pouco
efetiva.
Na mesma linha, pode-se concordar que nenhum país
deva ser obrigado a cooperar com os demais, mas convenhamos que
algum sentido de dever e de responsabilidade diante das necessidades
fundamentais de outros países deve existir em nome da paz, da
segurança e do desenvolvimento de todos.
Quanto à divisão de benefícios, torna-se cada vez
mais evidente que o processo de acumulação de riquezas nos países
desenvolvidos é tão intenso e veloz que dificilmente se poderá deter
e reduzir as desigualdades crescentes do mundo de hoje sem algum
tipo de divisão de benefícios, negociada dentro de dimensões
equânimes e razoáveis, ao lado de outras medidas locais e
internacionais, tão ou mais importantes, destinadas a impulsionar um
genuíno desenvolvimento em todos os países.
5. Dados de satélite para o desenvolvimento
nacional
O COPUOS aprovou por consenso, em 15 de junho de
2006, a proposta do Brasil intitulada "Cooperação Internacional na
Promoção do Uso de Dados Geoespaciais para o Desenvolvimento
Sustentável" como novo ponto de sua agenda de debates, que inclui um
plano de trabalho de três anos (2007-2009).
A delegação brasileira anunciou as linhas gerais
de sua proposta na reunião do Subcomitê Jurídico em abril de 2006,
mas optou por apresentá-la na reunião plenária do Copuos (de 5 a 16
de junho). Isso lhe daria mais tempo para ampliar as consultas a
outros países e assim obter um largo e sólido apoio — o que de fato
foi alcançado.
A idéia central é estabelecer o reconhecimento
internacional para duas premissas básicas: 1) a criação em cada país
de competência (leia-se equipamentos e pessoal especializado) para
receber, processar, analisar e usar dados de satélite tornou-se
fator indispensável a qualquer programa nacional de desenvolvimento;
e 2) a cooperação internacional tem papel essencial na criação dessa
competência, em apoio ao esforço nacional.
Assim, a competência para captar, preparar e usar
adequadamente os dados geoespaciais — sem os quais, hoje, não se
pode falar em autêntico desenvolvimento nacional — precisa deixar de
ser considerada como luxo ou bem exclusivo de alguns países
tecnologicamente avançados e ganhar o atestado internacional de
recurso imprescindível – a todos e a cada um dos países – na tomada
de decisões em políticas públicas, programas de C&T, educação e
inovação, planos industriais, agrícolas e comerciais, nos negócios
de empresas públicas e privadas.
Cabem aqui recentes declarações de Gilberto
Câmara, diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE):
"Toda a nossa atividade de P&D em sensoriamento remoto e
geoprocessamento objetiva permitir que ‘o Brasil conheça mais o
Brasil’. Nossos recursos naturais e nossas cidades precisam de
gestão permanente, precisam de novas informações e precisam que
essas informações estejam ao alcance de todos. Assim, a missão da
observação da Terra do INPE é aumentar a capacidade da sociedade
brasileira de tomar conta do nosso vasto e maltratado território".32
O que é bom para o Brasil, no caso, certamente será bom para muitos
outros países em desenvolvimento.
Convém alertar, entretanto, que a luta política
em torno desse tema está apenas começando no seio da ONU. Seu êxito,
seguramente, vai depender em grande parte do empenho conjunto e
sistemático da maioria dos países, em geral pobres e
subdesenvolvidos. Muitas empresas dos países desenvolvidos
certamente têm grande interesse em vender seus equipamentos, o que,
sem dúvida, é positivo. Ocorre que competência tecnológica ligada a
metas de efetivo desenvolvimento nacional sustentável, em qualquer
atividade, não costuma ser atingida facilmente, sem forte
determinação do governo e das forças vivas de cada país, bem como
habilidosa capacidade de negociar a defesa de seus interesses.
Seja como for, a aprovação da proposta brasileira
é fato relevante, na medida em que abre oportunidades inestimáveis
para se propagar e consolidar o princípio da universalização da
competência nacional no uso das informações geoespaciais.
O plano trienal de trabalho, previsto na
proposta, possibilita ampla exposição do problema, por parte dos
mais diferentes países, organizações e empresas interessadas. Vale
lembrar que, já no primeiro ano, importante espaço será oferecido a
entidades como a Agência Espacial Brasileira (AEB) e ao Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) para apresentações de suas
considerações, demandas e idéias a respeito. Será de todo oportuno
enfatizar que a conquista da competência nacional em qualquer área
da ciência e tecnologia pode e deve ser tanto produto quanto ação
produtora de atitudes e ações inovadoras e criativas.
Como autor da proposta, o Brasil tem o dever
moral de se preparar com esmero para um desempenho exemplar e
convincente.
Eis o texto da proposta brasileira, em versão
não-oficial:
"A capacidade de usar informações geoespaciais é
fundamental para uma série de atividades com impacto direto sobre o
desenvolvimento nacional. O monitoramento ambiental, o gerenciamento
de recursos naturais, a meteorologia, a prevenção e a mitigação de
desastres naturais, a criação de sistemas cartográficos nacionais
para fins de planejamento territorial – são apenas alguns exemplos
de como os dados geoespaciais passaram a desempenhar papel
indispensável na promoção do desenvolvimento nacional sustentável."
A cooperação internacional tem papel proeminente
a desempenhar na promoção dessa capacidade. A experiência dos países
que emergiram nas últimas duas décadas como usuários efetivos de
dados geoespaciais constitui razão convincente para expandir a
cooperação internacional nessa área. Apesar disso, a maior parte do
globo ainda carece de competência institucional, tecnológica e
humana para se beneficiar do uso de dados geoespaciais.
A comunidade internacional deve considerar
caminhos e meios de fomentar a disseminação dessa competência, tendo
em vista alcançar sua verdadeira universalização.
Com esse fim, o Brasil submeteu ao Comitê para o
Uso Pacífico do Espaço Exterior a proposta de apreciar, em suas
próximas três reuniões, um novo item na agenda, intitulado
'Cooperação Internacional na Promoção do Uso de Dados Geoespaciais
para o Desenvolvimento Sustentável'. O principal objetivo da
proposta é o de estimular a cooperação internacional no
estabelecimento da infra-estrutura nacional de dados espaciais
necessária para captar, processar, analisar e aplicar informações
geoespaciais, como importante instrumento na conquista do
desenvolvimento nacional sustentável.
Ao discutir o tema, o Comitê poderá estudar e
aprender a partir das atividades já realizadas nesse campo por
países, organizações regionais e/ou multilaterais e outras
entidades. Reconhecendo e valendo-se de tais experiências passadas e
presentes, o Comitê estará em melhor posição para propor
recomendações mais amplas e integradas no sentido de se alcançar a
universalização dessa competência.
Recentes experiências em países em
desenvolvimento vem sugerindo também que esses países possuem um
mercado considerável de serviços e produtos relacionados ao uso de
dados geoespaciais. Tal mercado, porém, permanece em larga escala
não explorado, devido a deficiências em termos de conhecimento e
competência. Pode-se esperar nesse contexto, que a cooperação
internacional para a construção da competência nacional no uso de
dados geoespaciais tenha impacto significativo sobre as atividades
de empresas que desenvolvem e operam aplicações espaciais, ampliando
a demanda por seus serviços e produtos.
Um esforço internacional concertado para a
criação de competência nacional no uso de dados geoespaciais poderá
ter efeitos que vão além do setor privado. Muito tem
se discutido e realizado no que se refere à cria-ção de
sistemas de observação da Terra, tanto no nível regional quanto no
global. O impacto positivo do estabelecimento de tais sistemas sobre
a capacidade humana de entender e lidar com uma série de desafios
globais tem sido amplamente reconhecido. Esse, sem dúvida, é um
esforço bem-vindo, ao qual a comunidade internacional deve seguir
dando seu apoio.
Tem emergido, entretanto, um crescente
reconhecimento de que a eficácia dos sistemas de observação da Terra
no trato dos problemas globais depende, igualmente, do esforço
consistente de integração da comunidade de usuários de cada país a
tais sistemas, superando deficiências institucionais, tecnológicas e
humanas que dificultem esse objetivo.
A implementação dos sistemas internacionais e
regionais de observação da Terra tem, portanto, uma dimensão
nacional própria, que deve merecer o reconhecimento e a atenção do
Copuos.
Como último ponto, o Comitê poderá também montar
um acervo de informações sobre as atividades realizadas dentro do
sistema das Nações Unidas relacionadas a essa importante questão e
considerar formas de ressaltar os vínculos existentes entre tais
atividades e os meios de conferir a elas um reconhecimento
internacional mais vigoroso.
O plano de trabalho plurianual que deverá
orientar as discussões a respeito deste novo item da agenda inclui:
2007 - Apresentações de Estados membros e
observadores, organizações internacionais e regionais, e grupos de
coordenação informal sobre suas respectivas atividades relacionadas
à informação geoespacial para o desenvolvimento sustentável. Aqui
podem ser incluídos os Centros Regionais das Nações Unidas de
Educação em Ciência e Tecnologia Espaciais, o GEO (Group on Earth
Observations, Ceos (Committee on Earth Observation Satellites),
Unesco, FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e
Alimentação) etc.
2008 - Apresentações de especialistas sobre
experiências relacionadas com o estabelecimento de infra-estrutura
nacional apropriada para a coleta, processamento e aplicação de
dados geoespaciais, incluindo o treinamento de recursos humanos,
infra-estrutura técnica, exigências financeiras e arranjos
institucionais. Apresentação de especialistas sobre as atividades de
criação de competência e seu impacto no mercado internacional de
serviços e aplicações na área da observação da Terra.
2009 - Avaliação das atividades em-preendidas
dentro do sistema das Nações Unidas diretamente relacionadas ao uso
de informações geoespaciais para o desenvolvimento sustentável, e
exame de caminhos para salientar os vínculos existentes entre tais
atividades e o propósito de dar a elas um reconhecimento
internacional mais consistente. Elaboração de um relatório contendo
recomendações sobre os procedimentos e meios de fomentar a
cooperação internacional com vistas à criação de infra-estrutura
nacional para o uso de dados geoespaciais."
Essa proposta talvez possa ser ligada às mais
realistas e habilidosas vertentes do Direito do Desenvolvimento. Mas
só a dura prática política e econômica dirá se ela terá densidade
suficiente para ajudar a abrir um novo rumo no empacado Direito
Espacial Internacional do nosso tempo.
Há quem diga que os papéis e relações na área
espacial vêm sendo redefinidos no Século XXI, graças à
internacionalização das atividades espaciais, e que, por isso, novas
possibilidades de cooperação conduzirão a uma "nova geografia"
dessas atividades na "era pós-pós-Guerra Fria"33,
ou seja, após o atual unilateralismo paralisante e danoso nas
relações internacionais. Quem sabe a "nova geografia" possa motivar
as Nações Unidas a reanimar e revalorizar o Direito Internacional,
em geral, e o Direito Espacial Internacional, em particular.
6. Algumas conclusões
As atividades espaciais, sobretudo com o fim da
Guerra Fria a partir da segunda metade dos anos 80, evoluíram com
especial rapidez para se tornarem absolutamente indispensáveis a
qualquer esforço efetivo de desenvolvimento sustentável em qualquer
país; não obstante, a idéia de desenvolvimento nacional vinculado
aos benefícios e atividades espaciais é relativamente nova. Daí que
as implicações das atividades espaciais sobre o desenvolvimento
nacional dos mais diferentes países precisam ser estudadas de modo
ainda mais amplo e profundo, para que se possa conhecer melhor suas
experiências e formas mais dinâmicas, produtivas e eqüitativas já
acumuladas.
Destaque-se ainda que o uso militar do espaço
cósmico e a instalação de armas em órbitas da Terra, com o fim de
estabelecer domínio ou superioridade unilateral no espaço e
condicionar de modo arbitrário o direito de acesso a ele para outros
países, são incompatíveis com o direito de todos os países ao
desenvolvimento na área espacial.
A comunidade internacional já admite
informalmente um princípio de relações essenciais entre o Direito
Espacial Internacional e o Direito do Desenvolvimento, mas esta
posição ainda não dispõe de consistente amparo legal e terá que se
fortalecer muito mais, para ganhar peso jurídico e político, e poder
influenciar positivamente o curso das atividades espaciais de maior
impacto na vida de todas as nações, no sentido da consagração
definitiva do princípio da exploração e uso do espaço exclusivamente
para fins pacíficos e construtivos, em benefício de todos os países,
de toda a humanidade.
***********
* Trabalho apresentado na 58ª
Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
(SBPC), realizada no campus da Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC), em Florianópolis, de 16 a 21 de julho de 2006.
** Jornalista, jurista, editor do Jornal da
Ciência, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC),
vice-presidente da Associação Brasileira de Direito Aeronáutico e
Espacial (SBDA), membro da diretoria do Instituto Internacional de
Direito Espacial, membro da Academia Internacional de Astronáutica e
do Comitê Espacial da International Law Association (ILA). E-mail:
<monserrat@alternex.com.br>.
***********
Notas e referências
(1) Virally, Michel, El devenir del derecho
internacional— Ensayos escritos al correr de los años, México:
Fundo de Cultura Económica, 1997, p. 487. (Título original: Le
droit international en devenir. Essais écrits au fil des ans,
France: Presses Universitaires, 1990, p. 420)
(2) Flory, Maurice, Droit international du
développement, Paris: Presses Universitaires de France: 1977,
pp. 12-13.
(3) Sachs, Ignacy, Desenvolvimento, Direitos
Humanos e Cidadania, Seminário Direitos Humanos no Século XXI,
10 e 11 de setembro de 1998, RJ.
(4) Charvin, Robert, Le droit au développment:
grandeur, décadence et renaissance, V Séminaire International du
CADTM (Comité pour l'Annulation de la Dette du Tiers Monde) sur le
droit et la dette, Bruxelles, 7-9 October 2005.
(5) Veiga, José Eli da, Desenvolvimento
ustentável – O desafio do século XXI, Rio de Janeiro: Garamond,
2005, p. 30.
(6) Aron, Raymond, Les désillusions du
Progrès, Essai sur la dialectique de la modernité, Paris, 1959,
p. 191.
(7) André Philip, Développment & Civilisations,
Les échanges internationaux au service de l’homme, revue
trimestrielle publiée par le Institut de Recherche et de Formation
en vie du Développment harmonisé (Irfed) en collaboration avec le
Centre National de la Recherche Scientifique, Paris, nº 19,
September 1964.
(8) Publicado no Annuaire français de droit
international, vol. XI, Paris, CNRS, 1965, pp. 3-12. Publicado em
espanhol no livro El devenir del derecho internacional— Ensayos
escritos al correr de los años, México: Fundo de Cultura
Económica, 1997, pp. 483-493.
(9) Citado por André Philip, idem ibid, p. 55.
(10) Magalhães, José Carlos de, Direito
Econômico Internacional – Tendências e Perspectivas, Curitiba:
Juruá, 2005, pp. 85-87.
(11) Eye in the sky – The story of the Corona
spay satellites, edited by Dwayne A. Day, John M. Logsdon, and
Brian Latell, USA: Smithsonian Institution Press, 1998.
(12) Ver em:
http://www.unoosa.org/oosa/en/SpaceLaw/index.html
(13) Ver também em:
http://www.unoosa.org/oosa/en/SpaceLaw/index.html
(14) Virally, Michel, idem ibid, pp. 483 e 489
(edição mexicana); pp. 417 e 422 (edição francesa)
(15) Virally, Michel, idem ibid, p. 488 (edição
mexicana) e p. 422 (edição fracesa).
(16) Trindade, Antonio Augusto Cançado, O
direito internacional em um mundo em transformação, Rio de
Janeiro: Renovar, 2002, p. 1063.
(17) O Legado Político do Ocidente – O Homem e
o Estado, Coordenação de Adriano Moreira, Alejandro Bugallo e
Celso Albuquerque, RJ: Difel, 1978, pp. 289-299. Basic Documents
in International Law and World Order, Burns H. Weston, Richard
A. Falk, Antony A. D’Amato, USA: St. Paul, Minn., West Publishing
Co., 1980, pp. 273-295.
(18) The Moon Treaty – Agreement Governing the
Activities of States on the Moon and Other Celestial Bodies,
Committee on Commerce, Science, and Transportation, United States
Senate, University Press of the Pacific, Honolulu, Hawaii, 2005
(reprinted from the 1980 edition).
(19) Magalhães, José Carlos de, idem ibid, pp.
79-84.
(20) Weiss, Edith Brown, In Fairness to Future
Generations: International Law, Common Patrimony, and
Intergenerational Equity, The United Nations University, Tokyo,
Japan; USA, New York: Transnational Publishers, 1989.
(21) Mello, Celso Duvivier de Albuquerque,
Direito Internacional Público – Tratados e Convenções, RJ:
Renovar, 1986, pp. 281-534.
(22) <www.itlos.org/start2_en.html>
(23) The International Law Association, Report
on the Seventieth Conference, New Delhi, 2-6 April 2002, London,
2002, pp. 201-207.
(24) Monserrat Filho, José, Direito Espacial –
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por satélite, in Direito Internacional do Século XXI –
Integração, Justiça e Paz", org. por Wagner Rocha D’Angelis,
Curitiba: Juruá, 2003, pp. 367-379.
(25) Monserrat Filho, José, Sensoreamento
Remoto: bloqueada a proposta brasileira, ECO-21, nº 65, abril de
2002; O Brasil contra a paralisia espacial, ECO-21, nº 77,
abril de 2003.
(26) Delgada, Ana Paula Teixeira, O direito ao
desenvolvimento na perspectiva da globalização: paradoxos e desafios,
Rio de Janeiro: Renovar, 2001. pp. 89-90.
(27) Alves, José Augusto Lindgren, Os direitos
humanos como tema global, São Paulo: Perspectiva, 2003, 133-134.
(28) Ver em <www.dhnet.org.br/direitos/anthist/viena/declaracao_viena.htm>
(29) Alves, José Augusto Lindgren, idem ibid.
(30) International Space Law in the Making –
Current Issues in the UM Committee on the Preaceful Uses of Outer
Space, Edited by Marietta Benkö and Kai-Uwe Schrogl, France:
Editions Frontières, 1993, pp. 195-231.
(31) Sausen, Tania Maria, Centro Regional de
Educação em Ciência e Tecnologia Espacial para a América Latina e o
Caribe (Crectealc) campus Brasil, trabalho apresentado na 4ª Jornada
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de agosto de 2004, São Leopoldo, RS.
(32) InfoGEO, Revista de Análise Geográfica, nº
42, março/abril de 2006.
(33) Peter, Nicolas, The changing geopolitics
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