AVIAÇÃO CIVIL BRASILEIRA 2005
Adyr da Silva
PhD - Pesquisador e membro do Conselho da SBDA desde 1983;
a partir 2001 Presidente da Diretoria Executiva
Ao Encerrar 2005 Com Excelentes Resultados A
Aviação Civil Despede-se Da Fab Após 65 Anos
Estatísticas mostram 2005 como ano excepcional. O caminho da
democratização do uso do transporte aéreo. Substancial crescimento nos aeroportos.
Novas tecnologias para o setor. A prolongada gênesis do novo órgão regulador e os
desafios lançados à ANAC que substitui o DAC. Brasil continua com excelentes níveis de
segurança aérea, dos melhores do mundo.
ATUALIDADE - Em meio a uma avalanche de bons resultados obtidos
em 2005 a Aviação Civil brasileira vê finalizado o processo de criação da Agência
Nacional de Aviação Civil que absorve o DAC e sua função de agência reguladora com
autonomia e nova estrutura. Após processo de sete anos, decorrente da Lei Complementar de
criação do Ministério da Defesa, alvo de muita negociação entre Planalto e Congresso,
a lei foi sancionada, a diretoria nomeada e a regulamentação, sob a forma de estatuto,
formaliza a transição. A repercussão institucional mais sensível com essa mudança é
a desvinculação da Aviação Civil da égide e apoio da FAB após exitosa trajetória de
amadurecimento e continuado crescimento. Foram 65 anos de convivência decorridos desde a
criação do Ministério da Aeronáutica em 1941 onde se sucederam os períodos de
estruturação do pós-guerra, a era da aviação a reação, a construção da
infra-estrutura de aeroportos, a indústria aeronáutica, a permanente modernização
tecnológica, a obtenção dos mais altos padrões de segurança do mundo e a regulação
de mercado com variado grau de liberalização em função do cenário e de objetivos
macroeconômicos. Continuar a trajetória de sucesso em meio às forças antagônicas do
mercado, ao ajustamento aos interesses nacionais, a permanente exigência de
modernização tecnológica e necessidade de renovação gerencial são os grandes
desafios da nova entidade.
BALANÇO 2005 - O comportamento do transporte aéreo em 2005 foi
de crescimento sobre 2004 de 19,4%, cifra extraordinária para esse setor produtivo
nacional, em especial diante do pífio resultado do crescimento do PIB de apenas 2,3%.
Fatores determinantes foram a maior flexibilidade de atuação no mercado concedida às
empresas regulares, a liberdade tarifária gerando compe-tição por vezes acirrada, a
elevada pontualidade e regularidade nos serviços e o grande volume de vôos não
regulares (charters) acompanhando e sendo o esteio do setor turismo nacional. O mercado
doméstico e o internacional viram modificações na participação das empresas
operadoras. A Gol e a Tam, com frotas entre as mais jovens do mundo, ganharam posições e
o ano terminou com o início do processo de recuperação da pioneira Varig. O mercado
regional mostrou dinamismo nos resultados e no processo de expansão de linhas e número
de localidades servidas. O fato mais alvissareiro foi o aumento significativo do índice
de penetração, isto é, o percentual da população que utilizou pelo menos uma vez o
avião como meio de transporte, o qual passou de 6% para 8% durante o ano indicando que a
demanda passa a incluir em sua composição passageiros novos e de outro estrato social.
Embora ainda baixa, a evolução dessa cifra mostra o caminho da democratização do uso
do transporte aéreo no Brasil e a redução da predominância do passageiro representante
de pessoa jurídica sobre o deslocamento da família ou pessoa física. No que tange a
aeroportos as condições da oferta de capacidade de infra-estrutura ajustaram-se à
acentuada demanda com inúmeras obras aeroportuárias conduzidas pela Infraero, incluindo
novos ou ampliados terminais de passageiros e de carga, além de pistas de pouso, pátios
e demais componentes. Isto sem falar na criação pela Infraero de cinco áreas
industriais aeroportuárias voltadas para exportação. A empresa investiu 684 milhões de
reais em 2005 levando a capacidade da malha de aeroportos para 113 milhões por ano
enquanto passou no mesmo período a atender à demanda de 97 milhões de passageiros.
Estados, municípios e iniciativa privada, na condição de concessionários da
exploração aeroportuária, também aumentaram suas parcelas de participação e
crescimento atuando nesse progresso significativo. Destaque foi a novidade da exploração
pela iniciativa privada de aeroportos internacionais para vôos transoceânicos.
TECNOLOGIA - A aviação brasileira permaneceu no período como
grande utilizadora de tecnologia de ponta. A frota brasileira de aeronaves de passageiros
tem recebido modernos jatos de transporte de avançada tecnologia. A produção da Embraer
cresce em quantidade, valor unitário e montante da produção, tamanho das aeronaves
por oferta de família de aeronaves com opções de modelos que ultrapassam 100 assentos e
de variadas características. As configurações atendem ao exigente mercado mundial com
mais de 90% da produção exportada para todos os continentes. As atividades nacionais de
engenharia e manutenção empregam sofisticados processos e a qualidade dos serviços é
fundamental para os elevados níveis de segurança que colocam o Brasil com um dos mais
baixos índices de acidentes por horas voadas no contexto mundial. A modernização da
infra-estrutura caminha a passos largos. A mudança tecnológica mundial com a
introdução dos recursos de telemática, do sistema de navegação por satélites está
se desenvolvendo e o sistema CNS/ ATM encontra-se em preparativos para revolucionar com
novas tecnologias as comunicações, a navegação, a vigilância de vôos e o
gerenciamento do tráfego aéreo. Os aeroportos, entretanto, com muitas obras em curso,
estão apenas no domínio tecnológico do futuro. Isto porque, aguarda-se ainda a
implantação de moderna automação aeroportuária baseada na Tecnologia da Informação
e nas novas técnicas e normas de segurança que se renovam e acompanham as exigências
internacionais. A prioridade atribuída aos diversos aspectos relacionados à segurança
do transporte aéreo e à operação de aeroportos tem acarretado a introdução de novos
princípios e à adoção de grande número de equipamentos, técnicas e procedimentos
para redução de risco de interferência ilícita e de atentados. Reexamina-se atualmente
o equilíbrio entre facilitação ao usuário e a segurança requerida otimizando ambas.
PAPEL DA UNIVERSIDADE - A universidade, como elemento
fundamental no quadro institucional da sociedade, tem participado ativamente em sua
função de ensino e pesquisa colaborando com diversos setores que atuam na aviação
civil brasileira. Possivelmente, dentre os mais destacados de todos sejam as atividades de
engajamento na formação profissional aeronáutica e na especialização nos domínios do
transporte aéreo e da infraestrutura.. Enquanto a SBDA tem promovido o treinamento em
Direito Aeronáutico, diversas outras universidades têm oferecido cursos regulares ou
eventuais de especialização nos diversos domínios de interesse da aviação civil
brasileira. Os mais de uma dezena de cursos de Ciências Aeronáuticas estão ensejando a
preparação de profissionais de vôo com formação de nível superior corrigindo lacuna
crônica na preparação de profissionais cujos efeitos evolutivos serão percebidos em
futuro quase que imediato. Outro destaque na especialização é o esforço da UnB por
meio do seu centro de transportes, o CEFTRU, que tem formado especialistas em gestão de
aviação civil com ênfase na regulação. Essa atividade, em termos de pesquisa e
ensino, contribuí decisivamente para solução de problemas de gerenciamento técnico da
aviação oferecendo o imenso potencial de cooperação, integração e apoio da
universidade à aviação civil brasileira.
O USUÁRIO - Finalmente, a razão primária da atividade
transporte aéreo, está progressivamente e com clareza ocupando sua posição
majestática de pólo das atenções e razão de ser do mercado. A legislação protetora
dos interesses dos usuários como a garantia de seus direitos, a garantia da livre
competição e o uso dos diversos mecanismos para impedir abusos dos prestadores de
serviço, das infrações ao meio ambiente e outros imperiosos mandamentos de cidadania
estão cada vez mais cristalizados no consenso geral e na ordenação jurídica
brasileira. A competição, presente no mercado do transporte aéreo, cuja decorrência
imediata para o bem do usuário é a redução tarifária, por meio da prática continuada
de concessão de descontos, pode ter seu sucesso bem aquilatado por dois fatos econômicos
quais sejam, o aumento do índice de penetração acima comentado e a maior elasticidade
econômica da atividade. Como último ponto relevante, cujo processamento lento contrasta
com a dinâmica da aviação, é a ratificação da Convenção de Montreal de 1999 sobre
os direitos da realização do transporte aéreo, eliminando a opressão do Tratado de
Varsóvia sobre os usuários sem atingir os exageros da aplicação benevolente do Código
do Consumidor ameaçando a sobrevivência econômica das empresas de transporte aéreo.
Esse equilíbrio, que já é abordado no novo Código Civil, deve nortear a atualização
do Código Brasileiro de Aeronáutica, anterior à Constituição de 88. Enfim, essa peça
moderna de Direito Aeronáutico, equilibrada e de aplicação com êxito nos países que
já a adotaram, significará com sua ratificação notável evolução do ordenamento
jurídico aplicado ao transporte aéreo.