Revista Brasileira de Direito Aeroespacial

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AMÉRICA LATINA E CARIBE:
ESTUDAR MECANISMOS MULTILATERAIS DE COOPERAÇÃO ESPACIAL
EM VEZ DE CRIAR UMA AGÊNCIA ESPACIAL REGIONAL

José Monserrat Filho

A IV Conferência Espacial das Américas, de 14 a 16 de maio em Cartagena de Índias, com a participação de 34 países do hemisfério, aprovou o ponto de vista do Brasil sobre a necessidade de se tratar com mais cautela e de forma realista a proposta de criação de uma agência espacial na região.

A IV Conferência Espacial das Américas acabou se destacando pelo realismo de suas principais decisões. Pesou muito a visão brasileira de dar preferência a projetos efetivos de cooperação, calçada em experiências já acumuladas.

Sobre a sedutora proposta do Chile, entusiasticamente apoiada por várias delegações, a respeito da criação de um mecanismo de entendimento (concertación, em espanhol) em matérias espaciais, os países participantes resolveram destacar na declaração final do evento algo bem mais modesto e concreto.

A declaração, em seu ponto 17, menciona a importância de serem criados mecanismos de cooperação e coordenação eficazes na região e instrui a Secretaria Pro Tempore da Conferência, agora com sede em Bogotá, capital da Colômbia, para que implemente os primeiros passos neste sentido, conforme PLANO DE AÇÃO também aprovado na sessão de encerramento.

O Plano de Ação prevê quatro passos neste assunto:

1) Analisar as necessidades comuns dos países da região com base numa pesquisa a ser enviada a todos os países, tendo em vista detectar as prioridades e as áreas de interesse de cada um, bem como os recursos humanos, os centros de pesquisas existentes, os projetos em desenvolvimento, os pontos focais etc;

2) Solicitar, em todo este processo a participação e o apoio do Comitê das Nações Unidas para o uso pacífico do espaço (Copuos, em sua conhecida sigla em inglês) e o escritório das Nações Unidas para assuntos espaciais (OOSA, também em sua sigla em inglês), além de outras organizações internacionais, se necessário for ;

3) "Identificar as fontes de financiamento para a cooperação multilateral;

4) Formar um grupo de trabalho com membros nomeados pelos governos dos países da região, encarregado de ajudar na busca de linhas de ação para a coordenação regional. Este GT deverá trabalhar com a Secretaria Pró Tempore da Conferência.

Quatro são também as principais áreas de cooperação e coordenação de programas e projetos previstos no plano de ação:

1) Proteção ao meio ambiente e apoio ao desenvolvimento sustentável;

2) Prevenção, alerta antecipado, operações de resgate e redução dos efeitos dos desastres naturais e antropogênicos;

3) Educação, pesquisa e desenvolvimento em ciências, tecnologia e aplicações espaciais;

4)    Direito Espacial.

Neste sentido, a declaração final frisa a importância de que os países com programas espaciais dêem acesso eqüitativo e oportuno a informações sobre gestão de riscos, prevenção e redução dos efeitos dos desastres naturais e antropogênicos, teleducação, telemedicina e serviços médicos, proteção do meio ambiente e outros.

A declaração igualmente insta os países, as agências governamentais e o setor privado do continente americano e de fora dele a fortalecerem a cooperação e coordenação para melhorar a gestão das redes de prevenção e socorro a desastres, através de redes de aplicações satelitárias, que inclua, entre outras, a manutenção de uma rede humanitária na região com a apresentação de imagens prévias e posteriores a um desastre natural, facilitando aos países rápida avaliação dos danos e ações de assistência a suas vítimas e a seus efeitos.

Sobre educação, a Declaração final enfatiza a urgência de se impulsionar a educação em ciência e tecnologia espaciais, como instrumento fundamental para o aproveitamento de seus benefícios potenciais e insta os países da região a redobrarem seus esforços neste sentido e considerar a educação em ciência e tecnologia espaciais como base para viabilizar o desenvolvimento dos projetos e iniciativas relacionadas.

O documento registra, a propósito, os avanços alcançados pelo Brasil e pelo México com apoio do Escritório das Nações Unidas para Assuntos Espaciais (OOSA), na criação do Centro Regional para Educação em Ciência e Tecnologia Espaciais na América Latina e Caribe, que começa a funcionar este ano com o curso de nove meses sobre sensoriamento remoto para 20 pessoas.

Ainda sobre educação, a declaração conclama os países a adotarem políticas ativas em favor de maior difusão e divulgação dos temas da agenda espacial, de modo a criar uma consciência coletiva sobre a importância da utilização das tecnologias espaciais para se atingir um desenvolvimento sustentável.

Em matéria de Direito Espacial, o Plano de Ação enfatizou a relevância de os países da região apoiarem o desenvolvimento dos princípios fundamentais das atividades espaciais já adotados em cinco tratados internacionais, tendo em vista uma convenção única e abrangente capaz de dar conta dos novos problemas existentes na área.

Isto significa que a Conferência Espacial das Américas decidiu respaldar o projeto apresentado no Sub Comitê Jurídico do Comitê da ONU para o Uso Pacífico dos Espaços (Copuos) pela Rússia, Colômbia e Grécia para que se inclua na agenda do órgão um item de debates sobre este projeto, rejeitado pelo EUA, Japão e outros países desenvolvidos.

O Plano de Ação também salienta a importância de se trabalhar no sentido de transformar em convenções internacionais as cinco principais declarações Assembléia Geral da ONU sobre temas espaciais, com especial atenção para Declaração de 1986 que contém os Princípios Sobre Sensoriamento Remoto.

Cabe recordar que, na reunião do Sub Comitê Jurídico do Copuos, de 2 a 12 de abril, o Brasil propôs a inclusão na agenda do órgão de um projeto para a criação de uma convenção internacional sobre o sensoriamento remoto, a partir dos princípios de 1986.

Tais princípios, além de não serem obrigatórios, são considerados vagos e imprecisos e estão reconhecidamente desatualizados diante do vertiginoso avanço das novas tecnologias neste domínio.

A proposta do Brasil também foi rejeitada no Sub Comitê Jurídico do Copuos pelos países desenvolvidos. Eles entendem que os Princípios de 1986 ainda funcionam e, portanto, não convém tocar nesse assunto.

A Conferência também frisou a necessidade de se ampliar o estudo e o ensino do Direito Espacial nos países da região.

Esta foi a quarta Conferência Espacial das Américas e provavelmente a mais concorrida delas. As três primeiras foram realizadas na Costa Rica, em 90, no Chile, em 93, e no Uruguai (Punta Del Leste), em 96.

A Secretaria Pro Tempore do evento deve ficar três anos na Colômbia. Isto significa que a quinta conferência deve ter lugar em 2005, mais ainda não se sabe em que país. Este é um assunto delicado. Vale lembrar que a Secretaria Pro Tempore ficou seis anos no Uruguai .....

Como alguns delegados notaram em comentários particulares, foi bem modesta a presença dos EUA nesta conferência. Ela se restringiu à exposição de um trabalho importante mais de cunho eminentemente técnico sobre um sistema norte americano de levantamento geofísico.

Em contraste, foi muito ativa a participação da Europa, através tanto da Agência Espacial Européia quanto do Conselho Nacional de Pesquisas Espaciais da França.

As duas entidades apresentaram vários trabalhos sobre formas de cooperação internacional e de financiamento de projetos espaciais.

Na sessão final, os europeus, que compareceram à conferência apenas como observadores, se colocaram à disposição dos países da região para ajudar em tudo o que for possível.

Um gesto de especial consideração que mereceu aplausos demorados.

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