Revista Brasileira de Direito Aeroespacial
Estudo da Definição de Estado Lançador
José Monserrat Filho
Vice-Presidente da SBDA
1. A definição de Estado lançador é um dos itens da agenda do Subcomitê Jurídico do Comitê das Nações Unidas para o Uso Pacífico do Espaço Exterior (Copuos), aprovado em julho de 1999.
2. Um Grupo de Trabalho, especialmente designado para tratar do assunto por um período de três anos, já foi instalado e realizou suas primeiras sessões durante a recente reunião do Subcomitê Jurídico, de 27 de março a 6 de abril, em Viena, Áustria.
3. O conceito de Estado lançador está ligado a três pontos importantes:
I) Controle das atividades espaciais;
II) Responsabilidade por danos; e
III) Registro dos objetos espaciais.
4. A figura do Estado lançador surge junto com o primeiro lançamento ao espaço exterior que marca o início da Era Espacial.
Quem lançou, em outubro de 1957, o primeiro satélite artificial da Terra por meio de um foguete foi o primeiro Estado lançador, no caso a ex-URSS.
5. Durante muitos anos, todos os lançamentos espaciais foram realizados por Estados. Com a comercialização e privatização das atividades espaciais, apareceram as empresas privadas lançadoras.
Hoje, a maioria dos lançamentos já seria privada?
6. A definição de Estado lançador é, antes de mais nada e acima de tudo, uma questão internacional, porque interessa a todos os Estados, sejam ou não lançadores, bem como a toda a comunidade internacional, incluindo-se aí as organizações internacionais governamentais e não-governamentais, as empresas nacionais e multinacionais, além de todos os habitantes da Terra.
7. As fontes do Direito Espacial Internacional que tratam do conceito de Estado lançador são:
I) Tratado sobre Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, Inclusive a Lua e Demais Corpos Celestes, de 1967, mais conhecido como o "Tratado do Espaço";
II) Convenção sobre Responsabilidade Internacional por Danos Causados por Objetos Espaciais, de 1972, mais conhecido como a "Convenção de Responsabilidade por Danos";
III) Convenção Relativa ao Registro de Objetos Lançados ao Espaço Cósmico, de 1975, mais conhecida como "Convenção de Registro".
8. O Artigo VI do Tratado do Espaço determina que cabe ao Estado autorizar as atividades espaciais de entidades privadas e manter vigilância contínua sobre estas atividades. Ou seja, as atividades espaciais privadas devem ser autorizadas e controladas pelo respectivo Estado lançador.
Este Artigo VI é que menciona o componente Estado ou Estado pertinente (appropriate State), que autoriza as atividades espaciais nacionais e as mantém sob sua supervisão.
9. Por que é preciso definir o conceito de Estado lançador?
Porque é necessário identificar o Estado responsável pelas atividades espaciais e por eventuais danos causados por objetos lançados ao espaço.
A clara responsabilidade do Estado lançador também o leva a trabalhar da melhor maneira possível para não cometer erros e assim evitar acidentes.
10. A definição vigente de Estados lançador está no Tratado do Espaço de 1967 e na Convenção sobre Responsabilidade Internacional por Danos Causados por Objetos Espaciais, de 1972.
11. A Convenção sobre Responsabilidade é um desenvolvimento do Artigo VII do Tratado do Espaço de 1967, que estabelece:
O Estado que proceda ou mande proceder ao lançamento de um objeto ao espaço e o Estado, cujo território ou instalações serviram ao lançamento de um objeto ao espaço, respondem internacionalmente pelos danos causados a outro Estado ou a suas pessoas naturais pelo referido objeto ou por seus elementos constitutivos, sobre a Terra, no espaço cósmico ou no espaço aéreo, inclusive na Lua e demais corpos celestes.
12. Por isso, segundo o Artigo 1º da Convenção sobre Responsabilidade, o termo Estado lançador significa:
i) um Estado que lança ou promove o lançamento de um objeto espacial;
ii) um Estado de cujo território ou de cujas instalações é lançado um objeto espacial.
13. Perguntas:
- O território do Estado lançador inclui seus navios e aviões?
- Há instalações do Estado lançador que não faça parte de seu território?
- Se as instalações não forem públicas, mas privadas, qual Estado lançador terá responsabilidade sobre elas, o do proprietário das instalações ou o operador das instalações, se eles forem de países diferentes?
14. A questão do Estado lançador também está vinculada à Convenção de Registro de Objetos lançados ao Espaço Cósmico, de 1975.
Perguntas:
- O registro é obrigatório?
- Qual é a relação entre Estado lançador e Estado de registro?
- Um Estado não-lançador pode ser Estado de registro?
- Pode haver mais de um Estado de registro para um mesmo objeto espacial?
- Pode uma empresa comprar um satélite em órbita e mudar o Estado de registro?
- Um Estado pode registrar as partes de um satélite?
15. Não há lançamento sem, pelo menos, um Estado lançador responsável.
16. Mesmo quando o lançamento é realizado por um empresa privada, o responsável internacional sempre recairá sobre o Estado lançador à cuja jurisdição essa empresa privada está subordinada.
17. Pergunta: Em que momento exatamente começa a responsabilidade do Estado lançador?
18. Hoje, os lançamentos espaciais são operações comerciais com vários e diversos participantes: Estados, empresas estatais, empresas privadas e empresas mistas.
Em muitos casos, há mais de um Estado lançador no sentido de Estado responsável pelo lançamento.
19. Com o aumento do numero de lançamentos efetuados por empresas privadas, pergunta-se: Devem os Estados continuar respondendo pelos lançamentos privados (responsibility e liability)?
20. Quantos Estados lançadores há hoje no mundo?
Rússia, EUA, França, China, Reino Unido, India, Japão, Canadá, Brasil, Alemanha, Itália, Ucrânia, Casaquistão, Paquistão, México, Argentina, Israel, Egito, África do Sul, Indonésia, Chile, Austrália, Arábia Saudita
Seria útil ter uma lista mais próxima da realidade.
21. Há poucos ou muitos Estados lançadores? O desenvolvimento das atividades espaciais demanda um número maior de Estados lançadores? O que impede o aparecimento de novos Estados lançadores?
22. Mais perguntas:
Quais são ou deveriam ser os direitos e obrigações do Estado lançador?
Como devem ser as relações entre Estados lançadores e não lançadores?
Como devem ser as relações entre Estados lançadores?
23. Organização dos temas:
I) O conceito de Estado lançador no Direito Espacial Internacional
a) Estado lançador e responsabilidade por danos
b) Estado lançador e Estado de Registro
c) Estado lançador e Estado pertinente (appropriate state)
II) O conceito de Estado lançador e as novas tecnologias de lançamento
a) Lançamentos de áreas internacionais
b) Lançadores reutilizáveis
c) Lançamentos do espaço aéreo internacional
III) Conseqüências da crescente comercialização das atividades espaciais
a) Responsabilidades estatal e civil do Estados pelas atividades espaciais de "entidades não-governamentais"
b) A pluralidade dos Estados lançadores
c) A venda de satélites em órbita
IV) O Brasil e o conceito de Estado lançador
- Por que o assunto interessa ao Brasil?
- Que idéias deve o país defender na discussão do problema?
- Que normas devemos incorporar à nossa legislação?
- Que normas queremos incorporar à nossa legislação?
24. O Brasil é um Estado lançador por vários motivos:
- Já lançou dois satélites de coleta de dados (SCD-1 e SCD-2);
- Já promoveu o lançamento de cinco satélites de telecomunicações, a série Brasilsat, da Embratel, hoje pertencente a um grupo privado norte-americano;
- Ajudou a construir o Cbers 1 (Satélite sino-brasileiro de recursos naturais), lançado pelo foguete Longa Marcha, da China.
- Já desenvolveu e lançou inúmeras sondas espaciais e desenvolve um veículo lançador de satélites, o VLS;
- Trabalha para introduzir o Centro de Lançamento de Alcântara no mercado mundial de lançamentos comerciais, o que o tornará responsável por cada um dos lançamentos ali realizados.
25. Propomos que o exame da definição de Estado lançador, na SBDA, tenha caráter exclusivamente acadêmico e aborde a questão em três tópicos, que vão do geral para o particular:
1) Quadro geral do problema segundo os instrumentos internacionais vigentes e as questões levantadas pelas novas tecnologias de lançamento espacial, bem como pela comercialização e privatização desta atividade;
2) Identificação das implicações da matéria no contexto brasileiro, tendo em vista sobretudo a adoção de legislação indispensável à habilitação legal do Centro de Lançamento de Alcântara perante o mercado mundial e a necessidade de previsão do grau e da escala das responsabilidades estatais e civis a serem assumidas pelo Estado brasileiro, no caso; e
3) Elaboração de um conjunto de informações básicas e de eventuais recomendações capazes de servir de apoio e subsídio à participação do Brasil em fóruns internacionais envolvidos com este assunto de tão clara atualidade.
26. Parte imprescindível do trabalho é a elaboração de uma bibliografia a respeito do conceito de Estado lançador.
27. Parece conveniente promover encontros mensais do Núcleo de Estudos de Direito Espacial da SBDA, com exposições preparadas previamente, seguidos de seminários para a troca de idéias a respeito.
28 Esses encontros poderiam ser abertos a todos os sócios da SBDA, bem como a professores e estudantes interessados na matéria.