html> Revista SOCIEDADE BRASILEIRA DE DIREITO AEROESPACIAL

Revista Brasileira de Direito Aeroespacial

 barra2.jpg (1468 bytes)

Direito Aeroespacial e Direito do Mar

Adherbal Meira Mattos
Advogado e Professor

O objetivo deste trabalho é a análise normativa do Direito Aeroespacial e do Direito do Mar.

Estuda-se, no Direito Aeroespacial, o Direito Aeronáutico (espaço aéreo, aeronaves, pirataria aérea, apoderamento ilícito de aeronaves, normas internacionais, inter alia, Convenção de Paris/19; Convenções de Madri/26 e de Havana/28; Convenção de Chicago/44; Convenção de Tóquio/63; Convenção de Haia/70; Convenção de Montreal/71) e o Direito Espacial (Tratado/67; Tratado/68; Convenção/72; Convenção/75; Acordo/79).

Estuda-se, no Direito do Mar, a Convenção da Jamaica/82 (mar territorial, zona contígua, zona econômica exclusiva, estreitos, plataforma continental, alto mar etc.), com as conseqüências para o Brasil (Lei nº 8.617/93; Projeto LEPLAC/89; Política Marítima Nacional/94; IV Plano Setorial para os Recursos do Mar/94-98; Programa REVIZEE/94).

    I  Direito Aeroespacial

1. Espaço Aéreo

O Direito Aeronáutico compreende o conjunto de normas internacionais que regulam o espaço aéreo e sua utilização. Nesta, estão incluídos problemas relativos à navegação, à radiotelegrafia e à radiotelefonia.

Todos os Estados dispõem de espaço aéreo. Nem todos, porém, dispõem de um mar territorial (Estados mediterrâneos). Por esta razão, é muito grande, nos dias atuais, a importância do Direito Aeronáutico, para todos os Estados, tanto isoladamente, como no seio da coletividade internacional.

Existem duas teorias sobre a natureza jurídica do espaço aéreo. Uma, é a teoria da liberdade absoluta, defendida por Fauchille, e outra, a teoria da soberania, defendida por Westlake e Holtzendorff.

A teoria da liberdade absoluta tinha por fundamento o direito de conservação do Estado subjacente. Confundiu espaço aéreo (por sua própria natureza apropriável) com o ar (por sua própria natureza inapropriável).

A teoria da soberania apresenta dois aspectos. Um deles é o direito de passagem inocente defendido por Westlake. O outro, aceito por Holtzendorff, é o de uma limitação em altitude. O direito de passagem inocente constou, expressamente, das Convenções de Paris e de Chicago, sobre a matéria.

A Convenção Internacional de Paris, de 1919, defendia, pois, o exercício de soberania absoluta do estado subjacente e admitia o sobrevôo inocente. Criou um órgão especial, a Comissão Internacional de Navegação Aérea (CINA), para estudos dos problemas vinculados à navegação aérea. Tal Convenção foi modificada pelo Protocolo de Londres (1922 e 1923) e pelo Protocolo de Paris (junho e dezembro de 1929).

As Convenções de Madri, de 1926, e de Havana, de 1928, também se ocuparam do assunto. Suas principais regras jurídicas constaram da Convenção sobre Aviação Civil Internacional, de Chicago, de 1944. Tal Convenção compreende, ainda, um Acordo Provisório, o Acordo de Bermudas, de 1946, entre EUA e Inglaterra, e um Protocolo de Emenda de 1947. Inúmeros Estados a assinaram e ratificaram, inclusive o Brasil, e muitos a ela aderiram.

Essa Convenção reconheceu que todos os Estados exercem soberania exclusiva e absoluta sobre o espaço aéreo acima de seus territórios (art. 1º), compreendendo, este, tanto a extensão terrestre, como as águas territoriais (águas internas e mar territorial) adjacentes (art. 2º). A Convenção admite o sobrevôo inocente e só é aplicável a aeronaves civis. Criou as cinco liberdades do ar. São estas as seguintes: direito de sobrevôo; direito de escala técnica para reparações; direito de desembarcar passageiros, malas postais e cargas embarcados no território do Estado de nacionalidade da aeronave; direito de embarcar passageiros, malas postais e cargas destinados ao território do Estado de nacionalidade da aeronave; direito de embarcar passageiros, malas postais e cargas destinados ao território de terceiros Estados; e direito de desembarcar passageiros, malas postais e cargas procedentes do território de qualquer deles.

Os dois primeiros – direito de sobrevôo e direito de pouso técnico – são direitos fundamentais e outorgados, de plano, às aeronaves comerciais de todas as partes signatárias. O direito de sobrevôo lembra o direito de passagem inocente, no mar territorial, enquanto o direito de pouso técnico lembra o direito de ancoragem. Os outros três direitos – embarque e desembarque de passageiros, malas postais e cargas – são de natureza comercial, podendo ou não ser outorgados às aeronaves civis dos Estados signatários.

A Convenção estabeleceu uma organização em substituição à CINA denominada Organização de Aviação Civil Internacional (OACI ou ICAO), composta de uma Assembléia, de um Conselho e de outros órgãos secundários (art. 43).

Os objetivos dessa Organização – que é um dos organismos especializados da ONU – são os de desenvolver os princípios e a técnica da navegação aérea internacional e estimular o desenvolvimento dos transportes aéreos interestatais (art. 44). A Assembléia será o forum da Organização e se reunirá anualmente, tendo cada Estado contratante direito a um voto (art. 48). Entre suas diversas atribuições, está a de baixar instruções sobre problemas vinculados à aviação civil internacional. Tais instruções serão efetivadas pelo Conselho, na sua qualidade de órgão executivo da Organização (art. 54).

Como dito acima, o Direito Aeronáutico estuda as normas que regulam o espaço aéreo e sua utilização, compreendendo este, além da navegação, a radiotelegrafia e a radiotelefonia.

Os princípios jurídicos que regem a radiotelegrafia e a radiotelefonia são idênticos aos existentes quanto à navegação aérea. Como a passagem de ondas hertzianas, no espaço aéreo de um Estado, não interfere com o seu direito de conservação, o princípio de liberdade de trânsito inocente é admitido sem discrepâncias.

Assim, todos os Estados têm o direito de regular o estabelecimento e o funcionamento de estações em seus territórios, desde que não perturbem a ordem pública de outros Estados, conforme antigo entendimento do Instituto de Direito Internacional, de 1927. Diversas são as Conferências existentes sobre o assunto, tais como, as de Berlim, de 1906; de Londres, de 1912; de Washington, de 1927; de Madri, de 1932; de Atlantic City, de 1947 etc.

Resolução da Assembléia Geral da ONU, de 1982, sobre transmissão de televisão por satélites, reza que devem ser respeitados os seguintes princípios: soberania, não-intervenção, boa-fé etc. Nesse mesmo ano, outra Resolução da Assembléia Geral das Nações Unidas sobre Princípios que Regem a utilização pelos Estados de Satélites Artificiais com fins de Televisão Direta Internacional criou um sistema de consultas. No mesmo ano, foi criada a ENTELSAT (Organização Européia de Telecomunicações por Satélites), seguindo os passos da INTELSAT (International Telecomunications Satellite Consortium), de 1964, com base em acordo entre EUA e países europeus.

Finalmente, também em 1982, a Convenção de Montego Bay, da ONU, sobre o Direito do Mar, estabeleceu que todos os Estados cooperarão na repressão das transmissões não-autorizadas efetuadas envolvendo navios em alto-mar. Daí advirá a abertura de competente processo, seja no Estado do pavilhão do navio, no Estado beneficiado ou no Estado ofendido.

Da mesma forma que os navios, as aeronaves devem ter apenas uma nacionalidade, que é a do Estado da matrícula. Por isso, as aeronaves internacionais, aquelas que se encontram a serviço de uma organização (ONU, v. g.), não têm nacionalidade, pois tais organizações não são Estados. Também devem possuir papéis de bordo, que compreendem certificado de registro e de navegabilidade, diário de bordo, lista de passageiros, manifesto de carga etc., conforme o art. 29 da citada Convenção de Chicago.

Conforme a natureza do serviço prestado, classificam-se as aeronaves em públicas e privadas. As aeronaves públicas podem ser militares (quando utilizadas para fins militares) e civis (quando utilizadas pelo Estado a seu serviço para fins não-militares). Não gozam dos direitos de sobrevôo e de pouso técnico, pois a Convenção de Chicago, como vimos, é aplicável unicamente a aeronaves civis e não a aeronaves de propriedade do governo (art. 3º, a). As aeronaves privadas são as destinadas a atividades comerciais. Sendo, pois, não-governamentais, gozam daqueles dois direitos.

O regime jurídico das aeronaves em territórios estrangeiros é semelhante ao dos navios. É assim que as aeronaves públicas (militares e civis) gozam de completa imunidade no território dos outros Estados. Há apenas uma diferença entre as duas, pois, enquanto as aeronaves militares podem conceder asilo político, o mesmo não ocorre com as aeronaves civis. Já as aeronaves privadas se encontram sujeitas à jurisdição do Estado territorial. Por isso mesmo, já se cogitou de um direito de perseguição, no espaço aéreo, análogo no direito de perseguição estudado no Direito do Mar.

O Canadá e os EUA criaram, nesse sentido, duas zonas de segurança e todas as aeronaves que por elas passarem terão de se identificar, sem o que poderão ser interceptadas. A zona de segurança canadense, de 100 milhas de largura, é conhecida pela sigla CADIZ (Canadian Air Defense Identification Zone). A dos EUA, de 200 milhas de largura, é conhecida pela sigla ADIZ (Air Defense Identification Zone).

Temos, finalmente, que todas as aeronaves – independente da natureza do serviço prestado – se encontram, em alto-mar, sujeitas, exclusivamente, à jurisdição do seu Estado nacional, precisamente porque nessa área (mar livre) não existe exercício de soberania estatal.

As principais normas jurídicas existentes sobre pirataria aérea estão na Convenção de Genebra sobre o Alto-mar, de 1958; na Convenção de Tóquio, de 1963; na Convenção de Haia, de 1970; e na Convenção de Montreal, de 1971.

A Convenção de Genebra sobre Alto-mar, de 1958, considera ato de pirataria todo ato ilegal de violência, detenção ou qualquer depredação, cometido, para fins pessoais, pela tripulação ou passageiros de uma aeronave privada, praticado em alto-mar ou outro lugar não submetido à jurisdição de qualquer Estado, contra uma aeronave ou contra pessoas ou bens a bordo.

A Convenção considera aeronave pirata a destinada, efetivamente, a cometer qualquer um desses atos. O mesmo se aplica às aeronaves que servirem para praticar tais atos, enquanto continuarem sob o controle dos que os houverem praticado. A aeronave não perde, necessariamente, sua nacionalidade, por haver-se transformado numa aeronave pirata e pode ser apresada por qualquer Estado, em conseqüência de atos de pirataria, com a apreensão dos bens encontrados a bordo, cabendo aos tribunais do Estado que efetuou o apresamento se pronunciarem sobre as penas que devam ser aplicadas. Se a captura foi efetivada sem motivo suficiente, o Estado captor será responsável em relação ao Estado da aeronave, por qualquer perda ou dano causado pela captura. Esta, por motivo de pirataria, só poderá ser executada por aeronaves militares ou por aeronaves encarregadas de um serviço público, devidamente autorizadas. A Convenção da ONU/82, sobre o Direito do Mar, segue a mesma orientação (arts. 100 a 105).

A Convenção sobre Infrações e certos outros Atos praticados a Bordo de Aeronaves, assinada em Tóquio, em 1963, será aplicada, inter alia: aos atos que puserem em perigo a segurança da aeronave ou das pessoas ou bens a bordo e aos atos praticados por uma pessoa a bordo de qualquer aeronave matriculada em um Estado contratante, enquanto se achar em vôo (desde o momento em que se aplica a força-motriz para decolar, até que termine a operação de aterrissagem), na superfície do alto-mar, ou em qualquer local fora do território de um Estado (art. 1º).

Reza seu art. 11 que "quando uma pessoa a bordo, mediante violência ou intimidação cometer qualquer ato ilegal de seqüestro, interferência ou exercício de controle de uma aeronave em vôo, ou for iminente a realização desses atos, os Estados contratantes tomarão todas as medidas apropriadas a fim de que o legítimo comandante da aeronave recobre ou mantenha o controle da mesma". Isto, em hipótese de seqüestro ilícito de uma aeronave, quando o Estado contratante em que aterrissar a aeronave permitir que seus passageiros e tripulantes continuem sua viagem o mais rapidamente possível, devolvendo sua carga a seus legítimos possuidores.

De acordo com essa Convenção, o Estado de registro da aeronave é competente para exercer jurisdição sobre crimes praticados a bordo. Um terceiro Estado, porém, também será competente, se o crime produzir efeito em seu território, se o crime tiver sido contra a segurança desse Estado etc. (art. 15).

A Convenção para a Repressão ao Apoderamento ilícito de Aeronaves, assinada em Haia, em 1970, considerou (art. 1º) que qualquer pessoa que, a bordo de uma aeronave em vôo, ilicitamente, pela força, ameaçada de força ou outra forma de intimidação, se apodera ou exerce controle da referida aeronave, comete um crime, que deverá ser punido com severas penas pelos Estados contratantes (art. 2º). A Convenção também considera crime a mera tentativa, assim como a cumplicidade. A aeronave é considerada em vôo quando todas as suas portas externas estiverem fechadas, após o embarque, até quando forem abertas para o desembarque (art. 3º).

Cada Estado contratante tomará as medidas necessárias para estabelecer sua jurisdição sobre o crime quando: for este cometido a bordo de uma aeronave registrada no referido Estado; a aeronave a bordo da qual foi cometido o crime aterrissar no seu território com o suposto criminoso ainda a bordo; e o crime for cometido a bordo de uma aeronave arrendada sem tripulação, a um arrendatário que possua domicílio ou residência permanente no referido Estado (art. 4º).

Esta Convenção, acertadamente, preferiu a expressão apoderamento ilícito de aeronaves à expressão pirataria aérea. É que a pirataria, de acordo com a Convenção de Genebra sobre Alto-mar, compreende fins exclusivamente pessoais e deve sempre ocorrer em locais fora da jurisdição de qualquer Estado. Já a denominação apoderamento ilícito apresenta características próprias, tanto quanto aos fins, que podem ser políticos ou ideológicos, como quanto aos locais, que podem estar dentro das jurisdições estatais.

A Convenção sobre Interferência ilícita Contra a Aviação Civil Internacional foi assinada em Montreal, em 1971. Consideradam infração penal: um ato de violência contra pessoa a bordo de uma aeronave em vôo, se tal ato compromete a segurança da aeronave; a destruição de uma aeronave; danos a serviços de navegação aérea; a colocação de engenhos ou substâncias destinados a destruir uma aeronave; informações falsas que comprometam a segurança de uma aeronave em vôo etc. Esta Convenção considera uma aeronave em vôo desde o momento de seu preparo, até 24 horas após a sua aterrissagem.

A Convenção de Montreal, que complementou a de Haia, afirma ser competente para julgar tais infrações o Estado em cujo território elas forem cometidas; o Estado de matrícula da aeronave, contra ou a bordo da qual as infrações foram cometidas; o Estado em cujo território a aeronave a bordo da qual a infração é cometida aterrissar com o delinqüente a bordo etc. A Convenção só se aplica a aeronaves civis e as infrações de que cogita são passíveis de extradição. Logo, o Estado que não extraditar o criminoso tem obrigação legal de julgá-lo.

2. Espaço Exterior

O espaço exterior ou espaço cósmico fica situado imediatamente acima do espaço aéreo. Neste, como vimos, o Estado subjacente exerce plena soberania, permitida a passagem inocente prevista na Convenção Internacional de Paris, de 1919, e na Convenção de Aviação Civil internacional, de 1944.

Até hoje, ainda não foram especificados, em definitivo, os limites exteriores do espaço aéreo. Alguns autores aceitam 30 milhas, a partir das quais começariam o espaço exterior. Outros, cogitam de 52 milhas, como Karman, motivo por que sua teoria é conhecida como Linha Karman, onde começaria o espaço cósmico.

Para outros autores, com base na analogia, haveria um espaço contíguo. É que temos um mar territorial, onde o Estado costeiro exerce soberania plena, uma zona contígua, onde o mesmo Estado exerce uma soberania relativa e o alto-mar, onde não há exercício de soberania. Assim, também teríamos um espaço aéreo, onde o Estado subjacente exerceria soberania plena, um espaço contíguo, onde ele exerceria uma soberania relativa e o espaço exterior, onde também, não há exercício de soberania. Não há, entretanto, norma jurídica sobre o assunto.

O grande interesse pelo estudo jurídico do espaço cósmico começou após o dia 4 de outubro de 1957, quando a Rússia lançou seu primeiro Sputnik. Até então, os doutrinadores apresentavam suas teorias e faziam suas suposições, mas ainda não se tinha vivido o exemplo prático de um Estado, principalmente um Estado poderoso, lançar um sofisticado engenho ao espaço cósmico.

Não houve qualquer repulsa da sociedade internacional, mas, ao contrário, aplausos gerais para o feito. É que o lançamento requeria a utilização do espaço aéreo, não só do Estado lançador, como de outros Estados, em virtude da gravitação terrestre, tanto na subida, como na descida. Essa utilização não foi, porém, objeto de protestos ou críticas. O fato imediatamente repercutiu na ONU, que chamou a si a responsabilidade de legislar sobre a matéria, temendo viesse o espaço exterior a ser palco de novos desentendimentos entre os Estados, com base, inclusive, no que ocorrera com o alto-mar, no tocante a litígios internacionais.

Foi assim que a Assembléia Geral das Nações Unidas, por meio das Resoluções nºs 1.148 (XII), 1957; 1.348 (XII), 1958; 1.472 (XIV), 1959; 1.721 (XII), 1961; 1.802 (XVII), 1962; 1.963 (XVIII), 1963; 1.884 (XVII), 1963, entre outras, analisou a problemática jurídica do espaço exterior.

Em síntese, todas essas Resoluções conclamaram a total impossibilidade da apropriação do espaço cósmico e a necessidade de aplicação dos princípios gerais do Direito Internacional e da Carta da ONU às atividades dos Estados, relativas à sua exploração e utilização.

Além da Assembléia Geral, vale ressaltar a vinculação de diversos organismos subsidiários das Nações Unidas, como ocorreu com a OMM (Organização Meteorológica Mundial), com a OMS (Organização Mundial de Saúde) e com a UIT (União Internacional de Telecomunicações), pelos seus relacionamentos com o espaço exterior, em face de suas naturezas específicas.

Um Comitê Especial foi também criado pela ONU, o UNCOPUOS (United Nations Committee on the Peacefull Use of Outer Space), que se subdividiu em dois subcomitês, um científico e outro técnico-legal.

A ONU, desta forma, se antecipou à chegada efetiva do primeiro ser humano à Lua e aos demais corpos celestes, criando princípios jurídicos tendentes não só a dirimir, mas a evitar novos problemas internacionais. Foi assim que foi assinada a Resolução nº 1.963 (XVIII), 1963, conhecida como Declaração dos Princípios Jurídicos Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, adotada, por unanimidade, pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 13 de dezembro de 1963.

Em janeiro de 1967, com base nessa Declaração, foi assinado o Tratado sobre Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, inclusive a Lua e demais corpos celestes. No ano seguinte (1968), este acordo foi complementado pelo Tratado sobre Salvamento de Astronautas, Retorno de Astronautas e Retorno de Objetos Lançados ao Espaço Exterior. Em 1972, pela Convenção sobre a Responsabilidade Internacional por Danos Causados por Engenhos Espaciais. Em 1975, pela Convenção sobre Registros de Objetos Lançados ao Espaço Exterior. E em 1979, pelo Acordo sobre as Atividades dos Estados na Lua e nos Outros Corpos Celestes.

A Declaração de 1963 e o Tratado de 1967 podem ser sintetizados da seguinte forma:

a) Em primeiro lugar, como o nome está indicando, o ato de 1963 é apenas uma Declaração, enquanto o de 1967 é um Tratado, i. e., norma internacional propriamente dita, devidamente ratificada pelos Estados signatários. O Brasil, v. g., promulgou esse Acordo, por meio do Decreto nº 64.362, de 17 de abril de 1969, passando a integrar, pois, o nosso contexto normativo interno.

b) Tanto a Declaração como o Tratado afirmam que o espaço exterior, inclusive a Lua e demais corpos celestes, deverá beneficiar toda a Humanidade, estando aberto às pesquisas científicas de todos os Estados, independente do estágio de seu desenvolvimento econômico e científico (art. 11 do Tratado e da Declaração).

c) Nenhum Estado poderá exercer soberania sobre o espaço cósmico, inclusive a Lua e demais corpos celestes, por uso, ocupação ou qualquer outro meio (Tratado, art. 2º, e Declaração, art. 3º).

d) As atividades dos Estados, relativas à exploração e uso do espaço exterior, em geral, deverão efetuar-se de conformidade com o Direito Internacional, inclusive com os princípios contidos na Carta da ONU, com a finalidade de manter a paz e a segurança internacionais e de favorecer a cooperação e a compreensão internacionais (Tratado, art. 3º, e Declaração, art. 4º). Há, aqui, um detalhe que merece ser mencionado. É que a Carta das Nações Unidas prevê um sistema de tutela. Como o espaço exterior é insuscetível de apropriação nacional, não poderá, obviamente, comportar qualquer tipo de tutela. Logo, tais dispositivos específicos sobre tutela, existentes na Carta de São Francisco, não poderão ser aplicados ao espaço exterior.

e) Os Estados signatários comprometeram-se a não colocar em órbita objeto portador de armas nucleares, ou de qualquer outro tipo de armas de destruição em massa, bem como a não instalar tais armas sobre os corpos celestes e a não colocá-las no espaço cósmico. Daí a proibição do estabelecimento de bases, instalações e fortificações militares, ensaios de armas e execução de manobras militares, embora não se proíba a utilização de pessoal militar para fins de pesquisas científicas ou outros fins pacíficos (Tratado, art. 4º).

f) Os astronautas serão considerados enviados da Humanidade e todos os Estados signatários prestarão a eles toda assistência possível em casos de acidente, perigo ou aterrissagem forçada sobre seu território ou em alto-mar (Tratado, art. 5º, e Declaração, art. 9º).

g) O problema da responsabilidade também não passou despercebido, quer à Declaração, quer ao Tratado. Adotou-se, aqui, a teoria do risco, de natureza objetiva, ao contrário da teoria da culpa (culpabilidade), de natureza subjetiva. Assim, todos os Estados terão a responsabilidade internacional das atividades nacionais realizadas no espaço cósmico, em geral quer sejam elas exercidas individualmente, por organismos governamentais ou por entidades não-governamentais. No caso de uma organização internacional, a responsabilidade caberá a ela e aos Estados-partes do Tratado que a ela pertenceram (Tratado, art. 6º e Declaração, art. 5º). O Tratado e a Declaração rezam, ainda, e em conseqüência – que todos os Estados serão responsáveis, do ponto de vista internacional, pelos danos causados em decorrência do lançamento de um objeto ao espaço cósmico (arts. 7º e 8º). A apuração da responsabilidade advém de que o Estado, em cujo registro figura o objeto lançado ao espaço exterior, conservará sob sua jurisdição e controle o referido objeto e todo o pessoal que nele se encontre, enquanto permanecerem no espaço cósmico ou em um corpo celeste (Tratado, art. 8º e Declaração, art. 7º).

h) Cogitou-se, também, da cooperação e assistência no espaço exterior, em geral, devendo todos os Estados conduzir suas atividades, levando corretamente em conta os interesses correspondentes dos outros Estados. As atividades efetivadas no setor deverão ser informadas ao Secretário Geral da ONU, assim como ao público e à comunidade científica internacional (Tratado, arts. 10 e11 e Declaração, art. 6º).

i) Conforme o art. 9º do Tratado, deverão todos os Estados evitar os efeitos prejudiciais da contaminação do espaço cósmico e as modificações nocivas no meio ambiente da Terra, pela introdução de substâncias extraterrestres. No caso de dúvidas sobre a realização ou não de determinadas atividades ou experiências, deverá haver uma consulta internacional, antes de tais atividades ou experiências.

j) O art. 12 do Tratado reza que todas as estações, instalações, materiais e veículos espaciais, que se encontrarem na Lua ou nos demais corpos celestes, serão acessíveis, nas condições de reciprocidade, aos representantes dos outros Estados signatários, que deverão notificar, com antecedência, qualquer visita projetada. Trata-se do direito de visita no plano espacial exterior. A menção expressa a condições de reciprocidade é negativa e conflita com o disposto no art. 1º do Tratado e da Declaração. É que só poderá, realmente, visitar aquele Estado quem também tiver instalações que possam ser visitadas. Esse dispositivo tende a uma hegemonia espacial, pois tudo indica que, durante os próximos anos, apenas a Rússia e os EUA estarão em condição de ter e manter estações, instalações, materiais e veículos no espaço exterior.

k) O art. 16 do Tratado reza que qualquer Estado signatário poderá, um ano após sua entrada em vigor, comunicar sua intenção de deixar de ser parte, por meio de notificação escrita, enviada aos governos depositários, a qual surtirá efeito um ano após a data em que for recebida. Pelo art. 17 do Tratado, são depositários os EUA, a ex-URSS e a Inglaterra. Esse tipo de cláusula é muito comum em tratados multila-terais (coletivos), mas, no caso específico, se constitui em grave perigo para toda a sociedade internacional, pois, a qualquer tempo, um Estado signatário poderá se desvincular, deixando, com isso, de ter obrigações. É verdade que esse Estado deixará, também, de ter os direitos previstos no Tratado, mas é muito mais grave o fato de ele deixar de ter deveres.

O Tratado de 1968, que complementou o de 1967, cuidou, especificamente, do homem astronauta, em termos de salvamento e retorno, bem como de retorno de objetos lançados ao espaço exterior.

Concedeu grande ênfase ao trabalho do Secretário Geral da ONU, que deverá ser um elemento de ligação entre os Estados, em casos de acidentes. Tanto ele como a comunidade e o próprio Estado lançador deverão ser informados sobre qualquer sinistro ocorrido. Se este se verificou em território de algum Estado signatário, deverá este, em primeiro lugar, prestar toda a ajuda que lhe for possível. Se o acidente ocorreu em alto-mar, o mesmo esforço deverá ser despendido. Todas as cautelas e medidas deverão, enfim, ser tomadas para o retorno dos astronautas aos seus Estados de origem. O mesmo raciocínio é válido para os objetos espaciais, que não poderão, de forma alguma, ser retidos.

Esse Tratado também se refere à possibilidade do lançamento ser feito por uma organização internacional, que deverá pautar sua conduta dentro desses mesmos princípios.

Em 1972, foi assinada uma Convenção sobre a Responsabilidade Internacional por Danos Causados por Engenhos Espaciais, que complementou – no plano da responsabilidade – o Tratado de 1967.

Nos termos de seu art. 2º, o estado lançador terá responsabilidade absoluta de reparar os danos causados por seus objetos espaciais na superfície da Terra ou às aeronaves em vôo. Trata-se de responsabilidade objetiva – com base na teoria do risco – como já o fizera o Tratado de 1967.

Conforme o disposto no art. 6º, porém, o Estado lançador pode-se exonerar de tal responsabilidade absoluta se provar que o dano resultou, total ou parcialmente, de culpa recíproca ou de um ato de omissão do Estado lesado ou de pessoas que ele representa, com a intenção de provocar um dano. Nenhuma exoneração será admitida, contudo, se o dano resultar de atividades contrárias ao Direito Internacional, inclusive a Carta da ONU e o Tratado de 1967.

O Estado demandante (art. 8º) pode ser: a) o Estado que sofre o dano ou cujas pessoas físicas ou jurídicas sofrem o dano; b) o Estado lesado por um dano causado a pessoas físicas ou jurídicas estrangeiras, em seu território, e cujo Estado de suas nacionalidades não tiver apresentado a demanda; c) um terceiro Estado, em razão do dano sofrido por seus residentes permanentes, se os seus Estados nacionais não tiverem apresentado a demanda.

Os litígios internacionais, em matéria de responsabilidade por danos espaciais, circunscrevem-se aos Estados. Assim, as pessoas físicas ou jurídicas lesadas somente poderão demandar reparação de danos por intermédio de seu Estado nacional ou do Estado de sua sede. Neste particular, a Convenção admite duas regras de procedimento, uma, por via diplomática, e outra, por via judicial.

Na primeira hipótese, como o próprio nome está a indicar, a demanda é proposta pelo Estado lesado contra o Estado lançador, por meio de seus agentes diplomáticos. Na ausência de relações diplomáticas, entre os dois, o Estado lesado pode-se fazer representar por um terceiro Estado.

Na segunda hipótese, constitui-se uma Comissão de Reclamações para decidir o litígio. Essa Comissão é tripartida. Se não houver acordo para a escolha de seu presidente, os Estados-partes podem pedir ao Secretário Geral da ONU que o nomeie. Será este membro único da Comissão, se as partes não indicarem, no prazo de dois meses, seus representantes.

A reparação (indenização) será paga em moeda do Estado lesado ou, se este preferir, em moeda do Estado lançador. Ela será total e eqüitativa, e mediante pronto pagamento, mas não inclui lucros cessantes.

A Convenção sobre Registro de Objetos Lançados no Espaço Exterior, de 14-01-75, complementa as anteriores, com base no interesse comum da Humanidade e no desenvolvimento da exploração e uso do espaço exterior para fins pacíficos. Fala a Convenção em Estado lançador, objeto espacial e Estado de registro. Estado lançador é o Estado que lança ou promove o lançamento de um objeto espacial ou o Estado de cujo território é lançado um objeto espacial. Este, inclui as partes do objeto propriamente dito, bem como seu veículo propulsor e respectivas partes. O termo Estado de registro se aplica ao Estado lançador, em cujo registro inscreve-se um objeto espacial. Todo lançamento será objeto de registro, pelo Estado lançador, que de tudo informará ao Secretário Geral da ONU. Tais informações conterão o nome do Estado lançador; uma designação apropriada do objeto espacial ou seu número de registro; data e território de lançamento; e parâmetros orbitais básicos (período modal, inclinação, apogeu e perigeu). Informações adicionais também poderão ser fornecidas pelo Estado lançador ao Secretário Geral. A Convenção admite adesões, emendas, revisão e denúncia.

O Acordo sobre as Atividades dos Estados na Lua e nos outros Corpos Celestes, de 18-12-79, complementa o embasamento do Direito Espacial Exterior. Em síntese, o Acordo proclama que a Lua e seus recursos são patrimônio comum da Humanidade. E sua utilização será para fins exclusivamente pacíficos. Não haverá exercício de soberania na Lua e outros corpos celestes. Haverá liberdade de pesquisas científicas. A cooperação internacional será a mais ampla possível. Os Estados-partes prestarão informações de suas atividades ao Secretário Geral da ONU, sendo responsáveis por danos delas decorrentes. Cogita, ainda, o Acordo, de um direito de visita, através de consultas e de adoção de medidas, assim como do estabelecimento de um regime internacional para regulamentar a exploração dos recursos naturais da Lua. Os objetivos fundamentais do regime incluem: aproveitamento ordenado e seguro dos recursos; regulamentação dos recursos; ampliação das possibilidades de utilização desses recursos; e justa distribuição, entre os estados-partes, dos benefícios auferidos desses recursos, com especial consideração aos países em desenvolvimento e aos Estados que ajudaram, direta ou indiretamente, a exploração da Lua. O Acordo admite adesões, emendas, revisão e denúncia.

II. Direito do Mar

A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (Convenção da ONU/82, Convenção da Jamaica ou Convenção de Montego Bay) compreende um Preâmbulo, 17 Partes e 9 Anexos, além da Ata Final da III Conferência das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. Num só documento, dispõe sobre Mar Territorial, Zona Contígua, Estreitos Utilizados para a Navegação Internacional, Estados Arquipélagos, Zona Econômica Exclusiva, Plataforma Continental, Alto-mar, Ilhas, Mares Fechados ou Semifechados, Estados sem litoral, a Área, Meio Ambiente Marinho, Investigação Científica Marinha, Desenvolvimento e Transferência de Tecnologia Marinha e Solução de Controvérsias.

Especificamente quanto ao mar territorial, fixou sua extensão até um limite de 12 milhas marítimas, onde o Estado costeiro exerce plena soberania, que se estende ao espaço aéreo sobrejacente, ao leito e ao subsolo do mar. Seguindo a norma genebrina sobre a matéria, abrigou o instituto jurídico da passagem inocente (Inofensiva), para todos os navios, de todos os Estados. O Brasil, Estado-parte da Convenção, em conseqüência, revogou o Decreto-Lei nº 1.098/70, que dispunha, unilateralmente, sobre um mar territorial de 200 milhas marítimas, e promulgou a Lei nº 8.617/93, que estabeleceu, internamente, um mar territorial de apenas 12 milhas marítimas.

A zona contígua também passou a ter 24 milhas a partir da linha de base do mar territorial (na realidade, pois, 12 milhas marítimas), nos termos da Convenção da ONU/82 e, conseqüentemente, da Lei nº 8.617/93. Nela, o Estado costeiro poderá tomar todas as medidas de fiscalização necessárias para evitar e reprimir infrações às leis e regulamentos aduaneiros, fiscais, de imigração ou sanitários, no seu território ou no seu mar territorial.

O regime jurídico de passagem pelos estreitos utilizados para a navegação internacional não afeta o regime jurídico das águas que o formam, nem o exercício, pelos Estados costeiros, de sua soberania ou de sua jurisdição sobre as águas, seu espaço aéreo sobrejacente, leito e subsolo. A Convenção dispõe sobre o regime jurídico das águas dos estreitos, da liberdade de navegação e sobrevôo, da passagem em trânsito e da passagem inocente, mas, não se detém sobre canais, subordinados, na prática, a regimes internacionais, salvo ao dispor sobre rotas marítimas e sistemas de separação do tráfego.

A Convenção normatiza sobre o regime jurídico das águas arquipelágicas, com base na soberania dos Estados Arquipélagos, salientando o direito de passagem inocente pelas águas arquipelágicas e o direito de passagem em trânsito pelas rotas marítimas arquipelágicas. O Estado Arquipélago, além de designar tais rotas, tem o direito de substituí-las. Pode, também, estabelecer sistemas de separação de tráfego, para a passagem segura de navios, os quais poderão, também, ser substituídos.

Na Zona Econômica Exclusiva (ZEE) o Estado costeiro tem direitos soberanos para fins de exploração, aproveitamento, conservação e gestão dos recursos naturais, renováveis ou não-renováveis, das águas sobrejacentes ao leito do mar, do leito do mar e seu subsolo. Exerce, também, jurisdição quanto à colocação e utilização de ilhas artificiais, instalações e estruturas, à investigação científica marinha e à proteção do meio marinho. Sua extensão é de 200 milhas marítimas, a partir da linha de base do mar territorial (na realidade, pois, 188 milhas marítimas). Os demais Estados gozam, na ZEE, das liberdades de navegação, de sobrevôo e de colocação de cabos e oleodutos submarinos. O Estado costeiro fixa as capturas permissíveis dos recursos vivos de sua ZEE e determina sua capacidade de captura. Quando não puder efetuar a totalidade da captura permissível, dará acesso a outros Estados ao excedente dessa captura, conforme condições estabelecidas em acordos entre as partes. A Convenção admite a operação de navios de outros Estados na ZEE do Estado costeiro, mas, a lei brasileira vai além, pois a realização, por outros Estados, de exercícios ou manobras militares, inclusive as que impliquem o uso de armas ou explosivos, desde que haja o consentimento do governo brasileiro. Tais detalhes econômicos, políticos e estratégicos poderão trazer conseqüências negativas ao Brasil.

A plataforma do Estado costeiro compreende o leito e o subsolo das áreas submarinas (continentais ou insulares) além do seu mar territorial, até, em princípio, uma distância de 200 milhas marítimas. A Convenção admite, porém, uma extensão maior (até ou além de 350 milhas marítimas). O Estado costeiro exerce direitos exclusivos de soberania sobre a plataforma, para fins de exploração e aproveitamento de seus recursos naturais. Compreendem, estes, os recursos minerais e outros recursos não vivos do leito do mar e subsolo e os organismos vivos pertencentes a espécies sedentárias, que, ao período de captura, estão imóveis ao leito ou subsolo ou só podem mover-se em constante contato físico com esse leito ou subsolo. Tais direitos não afetam o regime jurídico das águas sobrejacentes ou do espaço aéreo acima dessas águas, nem a navegação e outras liberdades dos demais Estados, como a colocação de cabos e dutos submarinos. Os Estados costeiros têm o direito de regulamentar a investigação científica marinha, a proteção do meio marinho, bem como a construção, operação e uso de ilhas artificiais, instalações e estruturas, admitindo a lei brasileira a condução da investigação científica marinha por outros Estados, com o consentimento prévio do governo do Brasil. A Comissão de Limites da Plataforma Continental (Anexo II) estabelece um prazo de até 10 anos, após a entrada em vigor da Convenção, para a delimitação da plataforma continental jurídica dos Estados-partes, quando sua extensão máxima será de 200 milhas marítimas, razão da criação, no Brasil do LEPLAC (Plano de Levantamento da Plataforma Continental Brasileira). Para tornar os limites marítimos do País compatíveis com a Convenção da ONU, o Brasil promulgou a Lei nº 8.617/93. Convenção e Lei falam em exercício de direitos de soberania sobre a plataforma, para exploração e aproveitamento de seus recursos naturais. O mesmo ocorre na ZEE. No mar territorial, entretanto, há plena soberania. Tudo de acordo com a atual Constituição Federal, que considera bens da União o mar territorial (art. 20, VI) e os recursos naturais da plataforma e da ZEE (art. 20, V).

No alto-mar não há exercício de soberania. Res Communis (e não res nullius), ele compreende todas as partes equóreas não incluídas na ZEE, no mar territorial ou nas águas interiores de um Estado, nem nas águas arquipelágicas de um Estado Arquipélago. Segundo a Convenção da ONU, as grandes liberdades do alto-mar são a liberdade de navegação, de pesca, de sobrevôo, de colocação de cabos e dutos submarinos, de construção de ilhas artificiais e de investigação científica. A Convenção analisa hipóteses de abalroamento, de assistência, de proibição de transporte de escravos, de cooperação na repressão da pirataria, e tráfego ilícito de estupefacientes e substâncias psicotrópicas (que, infelizmente, não integra o elenco dos atos que admitem o direito de visita), de transmissões não-autorizadas, de direito de perseguição etc. A Convenção dispõe, ainda, sobre conservação e gestão dos recursos vivos do alto-mar, estabelecendo princípios legais sobre pesca e cooperação na conservação e gestão dos recursos vivos do alto-mar.

A Convenção/82 define ilha como a formação natural de terra, rodeada de água, que fica a descoberto na preamar. As ilhas possuem mar territorial zona contígua, ZEE e plataforma continental. Contudo, as ilhas artificiais, instalações e estruturas, na ZEE e na plataforma, não têm o estatuto jurídico de ilhas. O mesmo ocorre com relação a instalações e equipamento de investigação científica no meio marinho.

Para a Convenção, mar fechado ou semifechado significa um golfo, bacia ou mar, rodeado por dois ou mais Estados e comunicando com outro mar ou com o oceano, por uma saída estreita, ou formado, inteira ou principalmente, por mares territoriais e zonas econômicas exclusivas de dois ou mais Estados costeiros. A cooperação entre Estados costeiros de mares fechados ou semifechados (diretamente ou através de uma organização) importa em coordenar a conservação, gestão, exploração e aproveitamento dos recursos vivos do mar, em desenvolver políticas de investigação científica marinha, em empreender programas conjuntos de investigação científica etc.

Desde o início do século surgiram Declarações, Convenções e Projetos de interesse dos Estados sem litoral. A Convenção da ONU/82 trata do Direito de Acesso ao Mar e a Partir do Mar dos Estados sem Litoral e Liberdade de trânsito. Segundo ele, tais Estados têm o direito de acesso ao mar e a partir do mar para o exercício de seus direitos, incluindo os relativos à liberdade do alto-mar e ao patrimônio comum da Humanidade. Gozam, também, de liberdade de trânsito pelo território dos Estados de trânsito, através de todos os meios de transporte. Finalmente, os Estados sem litoral (e os Estados geograficamente desfavorecidos) participarão, numa base eqüitativa, do aproveitamento dos excedentes dos recursos vivos das zonas econômicas exclusivas dos Estados costeiros da mesma região ou sub-região e de projetos de investigação científica marinha propostos a Estados costeiros.

Conforme a Convenção, a Área ou fundo do mar internacional (com seus recursos) é patrimônio comum da Humanidade. Este é um dos princípios básicos que regem a Área, ao lado da cooperação, fins pacíficos, investigação científica marinha, transferência de tecnologia e proteção do meio marinho. A Convenção dispõe sobre o aproveitamento dos recursos da Área, seus órgãos, solução de controvérsias e pareceres consultivos. O papel da Autoridade (Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos) é fundamental, em termos de políticas de produção, sendo os minerais extraídos da Área alienados através dela, o que pode gerar distorção do princípio de patrimônio comum da Humanidade, por parte do G-7, contra os legítimos interesses do G-77. Os órgãos principais da Autoridade são a Assembléia, o Conselho, o Secretariado e a Empresa. Sintetiza, esta, o poder da Autoridade e, pelo seu Estatuto, atua através de um Conselho de Administração e de um Diretor Geral. A Convenção elenca os seguintes meios para a solução de controvérsias: meios pacíficos, inclusive, conciliação; Tribunal Internacional do Direito do Mar (enfatizando sua Câmara de Controvérsias dos Fundos Marinhos, incompetentes, porém, para se pronunciar sobre o exercício, pela Autoridade, de seus poderes discricionários); Tribunais Arbitrais; Tribunais Arbitrais Especiais; e a CIJ. A Assembléia Geral da ONU, através da Resolução nº 48/263, de 28-07-94, aprovou o Acordo sobre a Implementação da Parte XI da Convenção (a Área) – cujos princípios não foram bem aceitos por países de economia cêntrica – estabelecendo, de forma estratégica, que futuras ratificações ou adesões à Convenção significariam aceitação do Acordo, e que a aceitação do Acordo importaria em prévia aceitação da Convenção. Foi, sem dúvida, uma forma inteligente de atrair grandes potências à Convenção.

A Parte XII da Convenção trata da proteção e preservação (conservação) do meio marinho, em termos de cooperação; assistência técnica; controle sistemático e avaliação ecológica; regras internacionais e legislação nacional, para prevenir, reduzir e controlar a poluição no meio marinho; execução de normas; garantias; e responsabilidade. A cooperação é analisada no plano mundial e regional, pelos Estados, diretamente, ou por meio de organizações internacionais (notificação de danos, programas de investigação, troca de informações etc.), merecendo destaque, no setor, as Conferências do ACOPS (Advisory Committee on Protection of the Sea). Os Estados, diretamente ou por meio de organizações, prestarão assistência científica e técnica aos países em desenvolvimento. Há, também, controle sistemático e avaliação ecológica, quanto aos riscos ou efeitos de poluição, da publicação de relatórios e da avaliação dos efeitos potenciais de atividades no meio marinho. No tocante à adoção e execução de leis nacionais e internacionais para prevenir, reduzir e controlar a poluição no meio marinho, a Convenção trata da poluição de origem terrestre, da poluição proveniente de atividades relativas aos fundos marinhos sob jurisdição nacional, da poluição proveniente de atividades na Área, da poluição por alijamento, da poluição proveniente de embarcações e da poluição decorrente da atmosfera. Finalmente, prevê a Convenção, como garantias para facilitar os procedimentos, a audiência de testemunhas, a apresentação de provas, em geral, e o exercício do poder de polícia dos Estados, traçando parâmetros sobre investigação de embarcações estrangeiras, com base na Ação de Responsabilidade Civil por perdas ou danos e na imposição de penas pecuniárias.

Todos os Estados e organizações têm o direito de realizar investigação científica marinha, respeitados os direitos dos outros Estados e organizações, com base nos seguintes princípios: realização com fins exclusivamente pacíficos; efetivação por métodos científicos compatíveis com a Convenção; não interferência com outras utilizações legítimas do mar; e respeito à proteção do meio marinho. A cooperação internacional respeitará a soberania dos Estados, através de informações, por meio de acordos bilaterais ou multilaterais. A realização e promoção da investigação científica marinha é analisada, pela Convenção, no mar territorial, na ZEE, na plataforma continental, na Área e no alto-mar, sendo que, nos três primeiros casos, os Estados costeiros têm o direito de autorizar sua condução por outros Estados, como decorrência de sua soberania. A colocação e utilização de instalações e equipamento de investigação científica no meio marinho são legais, mas não têm o estatuto jurídico de ilhas, não afetando, sua presença, a delimitação do mar territorial, da ZEE e da plataforma do Estado costeiro, e nem as rotas de navegação internacional. Em volta dessas instalações, porém, podem ser estabelecidas zonas de segurança de largura razoável, que não excedam uma distância de 500 metros. Estados e organizações são responsáveis por seus atos, pagando indenização pelos danos causados, sendo as controvérsias solucionadas pelas partes ou através do Tribunal Internacional do Direito do Mar, dos Tribunais Arbitrais, dos Tribunais Arbitrais Especiais e da CIJ. Os Estados, por si ou através de organizações, promoverão o desenvolvimento e transferência de tecnologia marinha a todos os Estados interessados e aos países em desenvolvimento, quanto à exploração, aproveitamento, conservação e gestão dos recursos marinhos, à proteção do meio marinho e à investigação científica marinha. As formas de cooperação internacional compreendem programas bilaterais, regionais ou multilaterais existentes, programas ampliados e novos programas, inclusive com o estabelecimento de centros nacionais e regionais de investigação científica e tecnológica marinha.

A Convenção da ONU, em sua Parte XV, trata da solução de controvérsias, em três Secções. Na Secção 1, fala em meios pacíficos, enfatizando o papel da conciliação. Na Secção 2, prevê procedimentos compulsórios conducentes a decisões obrigatórias. Trata-se do Tribunal Internacional do Direito do Mar (que conta com uma Câmara de Controvérsias dos Fundos Marinhos), de Tribunais Arbitrais, de Tribunais Arbitrais Especiais e da CIJ, que terão plena jurisdição sobre qualquer controvérsia relativa à interpretação ou aplicação da Convenção. Na Secção 3, a Convenção dispõe sobre limites e exceções à aplicação da Secção 2, o que enfraquece a escolha dos procedimentos compulsórios conducentes a decisões obrigatórias. Quanto aos limites, temos controvérsias quanto ao exercício, por um Estado costeiro, dos seus direitos soberanos e ao tocante à investigação científica e à pesca. Quanto às exceções, temos hipóteses de delimitação de zonas marítimas e de atividades militares, além das controvérsias a respeito das quais o Conselho de Segurança da ONU estiver exercendo suas funções. Inúmeras foram as controvérsias ocorridas nos espaços marinhos, envolvendo navios de guerra e privados, direitos de visita e de perseguição, abalroamento, poluição etc. A solução nem sempre foi legítima, por ausência de normas, por desmandos ou pela inexistência de um órgão julgador competente. Com a Convenção da ONU, há esferas próprias para a solução de tais controvérsias, a despeito dos aspectos negativos de sua Secção 3.

Uma das conseqüências da Convenção da ONU, para o Brasil, foi a promulgação da Lei nº 8.617/93. Esta, ao revogar o Decreto-Lei nº 1.098/70, substituiu o mar territorial de 200 milhas marítimas do País por um mar territorial de apenas 12 milhas marítimas, onde o mesmo exerce plena soberania nas águas, no espaço aéreo sobrejacente e no leito e subsolo, mantido o instituto da passagem inocente (inofensiva). A zona contígua compreende a faixa que se estende das 12 as 24 milhas marítimas da linha de base do mar territorial, onde o Brasil pode tomar medidas de fiscalização, para evitar e reprimir infrações às leis e regulamentos no seu território ou no seu mar territorial. A ZEE compreende uma faixa que se estende das 12 as 200 milhas marítimas, a partir da mesma linha de base, onde o País tem direitos soberanos para fins de exploração, aproveitamento, conservação e gestão dos recursos naturais, vivos ou não-vivos, das águas sobrejacentes ao leito do mar, do leito do mar e seu subsolo, reconhecido a todos os Estados o gozo das liberdades de navegação e de sobrevôo. Nela, o Brasil tem o direito exclusivo de regulamentar a investigação científica marinha (que, contudo, poderá ser conduzida por outros Estados, com o consentimento prévio do governo brasileiro). Nela, também, poderá ocorrer a realização, por outros Estados, de exercícios ou manobras militares (inclusive quanto ao uso de armas ou explosivos), com o consentimento do governo brasileiro. Finalmente, a plataforma continental compreende o leito e o subsolo das áreas submarinas além do mar territorial do País. A lei fala numa extensão de 200 milhas marí-timas, mas, como cita, expressamente, o art. 76 da Convenção, não afasta a hipótese de 3.50 milhas marítimas (ou mais) de extensão. Nela, o Brasil exerce direitos soberanos para fins de exploração e aproveitamento de seus recursos naturais; regulamentar a investigação científica marinha (que, porém, poderá ser conduzida por outros Estados com o consentimento prévio do governo brasileiro); autorizar e regulamentar perfurações na plataforma; e nela colocar cabos e dutos (direito esse reconhecido a todos os Estados).

Outra conseqüência da Convenção, para o Brasil, foi o Projeto LEPLAC (Plano de Levantamento da Plataforma Continental Brasileira), instituído pelo Decreto nº 98.145/89. A Comissão de Limites da Plataforma Continental, criada pela Convenção, concedeu um prazo de até 10 anos, a partir da entrada em vigor da Convenção, para a delimitação da plataforma, após o que sua extensão máxima será de 200 milhas marítimas. A estrutura do LEPLAC compreende o Ministério da Marinha (cuja Comissão Interministerial para os Recursos do Mar-CIRM controla as atividades do LEPLAC), a Petrobras, o Departamento Nacional da Produção Mineral, as Universidades do Programa de Geologia e Geofísica Marinha e membros da Comunidade Científica. A CIRM, coordenada pelo Ministério da Marinha, tem representantes dos Ministérios das Relações Exteriores, Fazenda, Educação, Minas e Energia, Ciência e Tecnologia e Meio Ambiente, e conta com uma Secretaria, uma Subcomissão e um Comitê Executivo, com três Subcomitês (Logística, Batimetria e Cartografia, e Geologia e Geofísica). A finalidade do LEPLAC é a delimitação dos limites exteriores da plataforma continental do País, caracterizando linhas de base, o pé do talude continental, realizando levantamentos geofísicos e batimétricos de precisão etc.

Conforme o Decreto nº 1.265/94 a Política Marítima Nacional (PMN), seguindo as pegadas da Convenção, compreende fatores (conceito estratégico nacional, política nacional de segurança etc.), objetivos (pesquisa, exploração e exploração de recursos marinhos etc.) e ações (relações internacionais, segurança, pesquisa e desenvolvimento etc.), com vistas ao desenvolvimento das atividades marítimas do País. A análise dos campos em que tais ações foram agrupadas comporta observações, abre a posição do Brasil em relação a atos internacionais, aperfeiçoamento dos serviços portuários do País, incentivo à navegação de cabotagem, construção naval, pesquisa para desenvolvimento da tecnologia nacional, preparo profissional no plano das atividades marítimas, segurança da navegação e do tráfego marítimo e dos portos etc. Os principais participantes da PMN são os Ministérios da Marinha, Relações Exteriores, Fazenda, Transportes, Agricultura, Educação, Trabalho, Indústria e Comércio, Minas e Energia, Integração Regional, Justiça, Ciência e Tecnologia e Meio Ambiente, e as Secretarias de Planejamento, de Assuntos Estratégicos e da Administração Federal.

O IV Plano Setorial para os Recursos do Mar 94-98, da CIRM, trata das atividades de pesquisa e prospecção dos recursos marítimos do País, complementando Planos anteriores (I, II e III) com base na ratificação, pelo Brasil, da Convenção da ONU/82. Estuda o IV PSRM os recursos do mar (situação atual e perspectivas; condicionantes e necessidades; recursos minerais, energéticos e vivos etc.); diretrizes e linhas de ação (levantamento dos potenciais sustentáveis de captura de recursos vivos da ZEE; recursos pesqueiros; avaliação da potencialidade mineral da plataforma continental; processos físicos e químicos; formação de recursos humanos etc.); iniciativa; coordenação e controle; análise; acompanhamento e avaliação de projetos.

O Programa REVIZEE (Avaliação do Potencial Sustentável dos Recursos Vivos na ZEE), do IBAMA, de 1994, é conseqüência do IV PSRM, nos termos da Convenção da ONU/82 e da Lei nº 8.617/93. Compreende nove Partes e dois Anexos, visando ao levantamento dos potenciais sustentáveis de captura dos recursos vivos da ZEE, para inventariar tais recursos e as características ambientais de sua ocorrência, determinar suas biomassas, e estabelecer potenciais de captura. Traz uma classificação de pesca (de subsistência, artesanal, de pequena escala, industrial costeira e industrial oceânica), compreendendo sua operacionalização, a divisão da ZEE em áreas (Costa Sul, Costa Central, Costa Nordeste e Costa Norte); estudo dos meios flutuantes; setor produtivo pesqueiro; recursos humanos etc. A metodologia de trabalho compreende medidas oceanográficas e pesqueiras (prospecção dos estoques; dinâmica de populações; oceanografia física, química, geológica e biológica; observações meteorológicas de superfície e levantamento estatístico da pesca comercial). Os resultados esperados, inter alia, compreendem determinação das biomassas e potenciais de captura, na ZEE, dos recursos pesqueiros demersais e dos recursos pelágicos; formação de frota pesqueira oceânica destinada ao aproveitamento dos recursos pesqueiros da ZEE; incremento da capacidade de pesquisa para efetivar a avaliação do potencial da ZEE etc.

Do exposto, temos que a Convenção/82:

1. Apresenta aspectos positivos, como os contidos em seu Preâmbulo (segurança, autodeterminação, não-intervenção, cooperação, responsabilidade por danos e respeito à soberania), em suas Disposições Gerais (uma ordem jurídica que promova o uso pacífico dos mares e uma ordem econômica internacionalmente justa) e em suas Disposições Finais (adesão, declarações interpretativas, emendas, denúncias etc.). Além disso, delimitou, internacionalmente, o mar territorial em 12 milhas marítimas, a zona contígua em 24 milhas marítimas (na realidade, 12 milhas marítimas), criou uma zona econômica exclusiva de 200 milhas marítimas (na realidade, 188 milhas marítimas), uma plataforma continental de 200 milhas marítimas (que poderá ir além de 350 milhas marítimas). Dilatou as liberdades do alto-mar. Zelou pelos interesses dos Estados sem litoral. Determinou que a Área (fundo do mar internacional) seria patrimônio comum da Humanidade. Normatizou sobre Estados Arquipélagos, estreitos e outras porções equóreas. E, finalmente, estabeleceu normas específicas sobre pesquisa científica marinha, conservação do meio ambiente marinho e solução pacífica de controvérsias.

2. Apresenta aspectos negativos, traduzindo, na prática, a hegemonia dos países de economia cêntrica, através de decisões por consenso, ao invés do voto democrático, o que enfraqueceu a defesa dos interesses dos países periféricos. Permitiu, na ZEE, a cessão, pelo Estado costeiro de suas quotas de exploração e explotação de riquezas, contrariando sua "soberania econômica" e gerando eventuais pressões internacionais por parte do G-7 contra o G-77. Admitiu investigação científica marinha por outros Estados e Organizações na ZEE e na plataforma continental dos Estados costeiros, a qual, embora só possa ser efetivada com seu consentimento, pode, na prática, gerar desequilíbrio político-estratégico. Na Área, a noção de patrimônio comum da Humanidade ficou prejudicada pelos excessivos poderes da Autoridade, cuja Empresa detém o direito de propriedade sobre todos os minerais e substâncias processadas que produzir.

Embora a Convenção admita emendas, as vinculadas à Área só serão efetivadas com aprovação da Autoridade. Há, finalmente, certa timidez de posições, como ocorre com a precariedade das sanções e a inocuidade das soluções pacíficas, que, além de não serem obrigatórias, não poderão ocorrer, enquanto o impasse estiver em discussão no Conselho de Segurança da ONU, conforme limites e exceções contidos na Convenção.

Tais normas internacionais contêm aspectos comuns, partindo do costume aos tratados e convenções; admitindo ou proibindo, conforme o caso, o exercício de soberania; permitindo adesões ou acessões; possibilitando emendas necessárias; ensejando revisão (Rebus Sic Stantibus); prevendo hipóteses de denúncia etc.

No plano da solução de controvérsias, o Direito do Mar apresenta-se, sem dúvida, mais objetivo e conclusivo, através de Conciliação, de um Tribunal Internacional do Direito do Mar (com uma Câmara de Controvérsias dos Fundos Marinhos), de Tribunais Arbitrais, de Tribunais Arbitrais Especiais e da própria Corte Internacional de Justiça. No tocante ao Direito Espacial, além de uma Comissão de Reclamações (Direito Espacial), a Sociedade Francesa de Direito Aeronáutico e Espacial sugeriu, em 1995, a criação de uma Corte Internacional de Arbitragem Aeronáutica e Espacial, para decidir sobre atividades aéreas e espaciais. O mecanismo lembra (Hélio de Castro Farias) as regras de arbitragem da Câmara Internacional de Comércio e da IATA sobre arbitragem comercial dos agentes designados pelos transportadores aéreos.

Conclui-se, do contexto, que Direito Aeroespacial (Aeronáutico e Espacial) e Direito do Mar encontram-se normatizados convencionalmente, com riquezas de detalhes, no plano internacional, através de atos jurídicos que têm ensejado legislação nacional específica sobre ambos os espaços, de profunda significação político-estratégica.

(Volta ao Sumário)

barra.gif (3737 bytes)

| Associação Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial