Revista Brasileira de Direito Aeroespacial
No-Show versus Overbooking
Helio de Castro Farias
Secretário Geral da
Sociedade Brasileira de Direito Aeroespacial.
1. A origem do "overbooking".
1.1 - Até o início da década de 1990, com exceção do período da chamada alta estação, o aproveitamento médio dos vôos regulares, assim identificados aqueles que operam independentemente do número de passageiros reservados, era de aproximadamente 60% dos assentos oferecidos. Essa baixa ocupação permitia as empresas aéreas conviverem com os passageiros "no-show", ou sejam, os reservados que não se apresentam para embarque, sem aplicar penalidade e revalidando os respectivos bilhetes de passagem para outro vôo ou reembolsando o valor pago.
1.2 - A partir dos anos 90, notadamente com a sedimentação da "deregulation" caracterizada pela diminuição da interferência governamental no controle da oferta e dos preços das passagens aéreas, a introdução de tarifas reduzidas, a globalização e, principalmente, maior liberdade na concorrência, resultou que em muitos segmentos do transporte aéreo a procura tornou-se maior que a oferta de lugares, significando que o "no-show", inviabilizando a confirmação de outro passageiro, representa efetivo prejuízo, visto que, ao fechar a porta da aeronave todos os assentos não ocupados transformam-se em mercadoria deteriorada.
1.3 - Como solução para evitar ou compensar em parte o prejuízo causado pelo "no-show" a maioria das empresas aéreas adotam a prática de aceitar reservas em número superior aos assentos disponíveis, com base em uma previsão estimada dos "no-show". Entretanto, por tratar-se apenas de estimativa, com freqüência ocorre a apresentação para embarque de passageiros reservados em número superior aos assentos disponíveis, ficando os excedentes impedidos de embarcar e dando origem ao chamado passageiro "overbooking". Tendo presente o elevado número de "no-show" a prática do "overbooking" tornou-se medida imperiosa para viabilizar economicamente a operação de certas rotas; nos serviços de ponte aérea é comum o mesmo executivo confirmar reservas para diversos horários no mesmo dia. Como essa medida é unilateral por parte de um dos contratante do transporte aéreo(no caso o transportador) enseja perdas e danos à outra parte(o passageiro) cujo transporte contratado não foi honrado.
1.4 - Ao depois da adoção com sucesso do "overbooking" como medida protetora contra o "no-show", muitas empresas aéreas passam a usar o "overbooking" também para otimizar o aproveitamento econômico da aeronave, não apenas em relação aos assentos ocupados mas igualmente para priorizar as passagens cuja tarifa contribui para gerar melhor lucratividade("yield"). Para a mesma classe são comercializados bilhetes de passagem com preços diferenciados(tarifa de excursão, de grupo, ponto a ponto e outras) e com regras específicas, as quais produzem variados resultados econômicos; dessa forma o bilhete que corresponde à melhor lucratividade tem prioridade sobre os outros que passam a ser mascarados de "overbooking".
1.5 - Atualmente, em geral durante a alta estação mas para certos destinos durante o ano todo, o passageiro reservado na classe econômica, portador de bilhete de passagem emitido com tarifa reduzida, não tem garantido o embarque até que seja efetivamente aceito na ocasião do despacho("check-in") devido a comercialização de assentos em número superior aos disponíveis. Algumas empresas limitam a acomodação desse passageiro para depois dos portadores de bilhetes de tarifa normal, exigem que esse passageiro se apresente para o "check-in" no mínimo 4 horas antes da partida e somente aceita os primeiros atendidos até completar a lotação do vôo desde que não deixe de acomodar passageiro "full fare"; no caso de viagem em grupo ou excursão a organizadora retem a passagem para aplicar penalidade ao "no-show" ainda que sem previsão contratual. Essas e outras medidas são implementadas para proporcionar melhor produtividade.
1.6 - Em resumo, o "overbooking" inicialmente usado apenas para compensar o "no-show" tornou-se uma ferramenta para assegurar melhor resultado econômico do vôo, priorizando os passageiros da chamada tarifa integral("full fare"). O "no-show" de tarifa reduzida é hoje em dia penalizado pelo valor da passagem pois a mesma tem validade restrita às reservas confirmadas, entretanto, os de tarifa integral continuam sem penalidade devido o valor dessa passagem compensar esse procedimento.
2. Definições das situações.
2.1 - Para um melhor entendimento desse assunto é necessário definir algumas situações que ocorrem com certa freqüência.
2.2 - O passageiro "no-show" é todo aquele possuidor de reserva confirmada que não se apresenta para o embarque; para facilitar o equacionamento dessa situação classificamos o "no-show" em voluntário e involuntário.
2.3 - "No-show" voluntário é aquele passageiro que, por vontade própria e sem cancelar sua reserva, simplesmente não comparece para embarque, o que teoricamente poderia resultar em prejuízo para o transportador, caso não houvesse o "overbooking" para compensar esse assento. Nos transportes de superfície o "no-show" é penalizado com o valor da passagem, devido a mesma perder a validade.
2.4 - "No-show" involuntário é aquele que não comparece para embarque devido motivos alheios à sua vontade, inclusive em alguns casos devido à própria empresa aérea(exemplo: passageiro reservado Brasília - Rio de Janeiro com conexão imediata para Paris, se ocorrer atraso ou cancelamento do trecho Brasília-Rio de Janeiro ele será "no-show" involuntário na etapa do Rio de Janeiro para Paris).
2.5 - "Overbooking" é o passageiro reservado mas impedido de embarcar devido reservas em número superior ao dos assentos disponíveis. Raramente ocorre "overbooking" de passageiro portador de bilhete de primeira classe.
3. O contrato de transporte aéreo de pessoas no Brasil.
3.1 - O contrato de transporte aéreo de passageiro pode ser definido como aquele em que uma pessoa (passageiro) desejando ir de um lugar a outro, convenciona com outra pessoa(o transportador) para que a conduza ao ponto desejado, mediante certo preço e condições ajustadas previamente. Nesse contrato há, sem dúvida, a combinação de locação de serviços e de locação de coisa; o transportador não somente se obriga a prestar o serviço, para que se cumpra o objetivo do contrato, como promover os meios em que o transporte se efetive. É um contrato bilateral, consensual, oneroso e real. Bilateral e consensual porque se forma pelo consentimento e com encargos de cada lado: o transportador obrigando-se a proceder o transporte e o passageiro se obrigando a pagar o preço desse transporte; oneroso porque há encargos recíprocos e real porque não se cumpre sem a presença da pessoa a ser transportada. O contrato de transporte aéreo de pessoa se aperfeiçoa, se firma e se conclui pela adesão do interessado, isto e, pela manifestação da vontade de ser transportado pela empresa aérea escolhida. Esta adesão resulta:
a) - da aquisição do bilhete de passagem que dá direito ao transporte de certo local para outro em determinado vôo, horário e data;
b) - do ingresso na aeronave posta à disposição pública para transporte de pessoas, afim de que seja conduzida ao ponto desejado e contratado.
Firmado, por esta maneira adesivamente, o contrato de transporte aéreo de pessoas obriga a empresa aérea a levar o passageiro ao ponto de destino sob determinadas condições. E o passageiro obriga-se a pagar o preço da passagem e cabendo-lhe, ainda, cumprir e atender as exigências ou regras estabelecidas no regulamento imposto pelo transportador e pelas autoridades competentes. A adesão no sentido jurídico exprime que não há um contrato expresso: oferecido publicamente o serviço para transporte de passageiros, a pessoa quando dele precisa, vem e aceita as condições publicamente impostas, para que se deixe transportar ao local desejado que é o objeto do comércio da empresa transportadora.
3.2 - O Código Brasileiro de Aeronáutica não estabelece redação de cláusulas e condições obrigatórias a serem inseridas no contrato de transporte aéreo mas ao regular as obrigações decorrentes do mesmo consigna que a empresa aérea se obriga a transportar o passageiro mediante pagamento(art. 222); prevê ainda o reembolso da importância paga no caso de cancelamento da viagem e outras penalidades para os casos de atraso da partida ou interrupção da viagem por mais de quatro horas(arts. 229, 230 e 231).
3.3 - O Código Brasileiro de Aeronáutica também não fixa tratamento expresso das situações derivadas do "overbooking" e do "no-show, ou seja, não lhes dá acolhida nem as penaliza, embora, "mutatis mutandis", poderia se concluir que impedimento do embarque por motivo de "overbooking" deveria motivar contra o transportador as sanções estabelecidas no parágrafo único do citado art. 231, ou sejam, arcar com todas as despesas de transporte de qualquer espécie, alimentação e hospedagem, sem prejuízo da responsabilidade civil; em contraditório, com relação ao passageiro "overbooking", pode-se argumentar que para ele o vôo não chegou a ser iniciado, de modo a caracterizar atraso ou interrupção, situações elencadas no referido dispositivo legal. Quanto ao "no-show" não há penalidade expressamente prevista no Código Brasileiro de Aeronáutica porém também não obriga o transportador revalidar ou reembolsar o bilhete "no-show"(observe-se que o Código Brasileiro de Aeronáutica é datado de 1986, portanto, anterior ao problema do "overbooking" na amplitude atual).
3.4 - Para o contrato de transporte aéreo celebrado no Brasil é indubitável que o mesmo é regido "ab initio" pelo Código Brasileiro de Aeronáutica, porém, diante da ótica jurídica, a ausência de regras específicas sobre o "overbooking" e o "no-show" nesse diploma legal, nos remete ao Código de Defesa do Consumidor(Capítulo VI, Da Proteção Contratual), portanto, as questões derivadas do "no-show" e do "overbooking" no contrato de transporte aéreo celebrado no Brasil devem ser resolvidas no âmbito desse referido Código de Defesa do Consumidor, prestigiando-se os arts. 46 e seguintes, e da legislação nacional complementar, tendo como palco a Justiça Comum, pois desconhecemos a existência de qualquer Tratado, Convenção ou Ato Internacional, sobre essa matéria, do qual o Brasil seja parte.
3.5 - O teor completo de um contrato de transporte aéreo internacional para passageiros consta em uma das Resoluções de Tráfego da International Air Transport Association - IATA - cujo texto é formalmente aprovado pelo Departamento de Aviação Civil - DAC - de modo a viger no Brasil. Esse texto padrão também não contempla especificamente as situações do "no-show" e do "overbooking", o que nos leva admitir serem os transportadores livres para praticarem a política que desejarem com respeito a esses assuntos, vis-à-vis às leis e regulamentos pertinentes em cada caso e em cada país. Deve-se ter em mente que o texto do contrato de transporte aéreo internacional elaborado pela IATA nada mais é que um texto redigido pelos próprios transportadores aéreos, obviamente resguardando seus interesses mas que não deixa de ser a lei entre as partes que dele participam ou a ele aderem ("contratus ex conventione partium legem accipiunt").
4. O "overbooking" nos Estados Unidos da América.
4.1 - Nos Estados Unidos da América, após forte pressão da opinião pública suportada pela midia, essa matéria foi detalhadamente regulamentada pelo Departamento de Transporte em princípio deste ano de 1997 pelo Ato intitulado "Oversales" part. 250 do qual destacamos os seguintes pontos:
4.1.1 - Sempre que ocorrer "overbooking"("oversales") o transportador deve primeiramente solicitar voluntários para não embarcar mediante uma compensação financeira("denied boarding compensation"), esses passam a ser classificados como "overbooking" voluntários(não confundir com o "no-show" voluntário); os demais passageiros impedidos de embarcar são considerados como "overbooking" involuntários.
4.1.2 - O transportador deve estabelecer regra de prioridade para acomodar os passageiros "overbooking"; o transportador não deverá negar o embarque a um passageiro "overbooking" involuntário que antes tenha sido solicitado para ser "overbooking" voluntário mas sem ter sido informado de que poderia ocorrer a situação de "overbooking" involuntário, bem como a respectiva compensação que poderia receber para aceitar ser "overbooking" voluntário.
4.1.3 - Todos os transportadores devem estabelecer regras e critérios para determinar quais os passageiros portadores de bilhetes confirmados que serão impedidos de embarcar devido o "overbooking". Essas regras e critérios devem refletir a obrigação legal do transportador em minimizar os inconvenientes e devem estar escritas de maneira clara e de fácil entendimentos pelos passageiros; essas regras e critérios não podem estabelecer preferência ou vantagem para nenhum passageiro nem causar prejuízo ou injustiça de qualquer forma para os demais passageiros.
4.1.4 - Todo transportador deve registrar junto à Autoridade Competente as regras tarifárias que aplicará como compensação para os "overbooking"; essas regras devem incorporar o total da compensação e indicar os passageiros elegíveis à essa compensação. O transportador deve registrar também a hipótese de oferecer bilhete aéreo grátis ou a preço reduzido ao invés do pagamento da compensação em dinheiro, desde que essa alternativa seja aceita voluntariamente pelo passageiro e que o valor da compensação oferecida seja igual ou maior que a compensação em dinheiro. Esse registro deve especificar que a compensação deverá ser satisfeita pelo transportador no dia e no local que ocorrer o "overbooking".
4.1.5 - Esse regulamento é obrigatório para todo transportador operando desde os Estados Unidos da América; o transportador que não oferece essa proteção para o "overbooking" nos vôos iniciados no exterior não poderá registrá-la para os vôos iniciando nos Estados Unidos da América.
4.1.6 - A compensação pelo "overbooking" deve corresponder a 200% do valor dos bilhetes ainda não utilizados até o próximo "stop-over"(definição dada à interrupção da viagem deliberada pelo passageiro e programada para um período superior a 4 horas em um ponto entre o início do vôo e o seu destino final), ou, inexistindo "stop-over", até o destino final, com o limite de USD$400.00. Não obstante, a compensação será a metade do valor retro mencionado, com o máximo de USD$200.00 se o transportador providenciar um transporte aéreo alternativo ou similar, desde que programado para chegar no ponto do próximo "stop-over" ou inexistindo "stop-over" no destino final, com um atraso máximo de 2 horas do horário previsto no vôo originalmente reservado quando tratar-se de vôos domésticos ou internacionais("overseas"), ou de 4 horas nos casos de vôos de transportador estrangeiro.
4.1.7 - O "overbooking" não terá direito à compensação nos seguintes casos:
4.1.7.1 - O passageiro deixou de cumprir o contrato de transporte com respeito à emissão do bilhete e as regras de reconfirmação do vôo, despacho e as condições de aceitação para o transporte aéreo.
4.1.7.2 - Quando ocorrer a substituição da aeronave por outra de menor capacidade devido motivos operacionais ou de segurança.
4.1.7.3 - O passageiro possa ser acomodado em outra classe superior sem custo adicional ou seja acomodado em classe inferior à reservada com garantia de receber a diferença paga a maior.
4.1.7.4 - O passageiro possa ser acomodado em vôo equivalente sem custo adicional desde que essa acomodação possibilite a chegada no próximo "stop-over", ou inexistindo, no destino final com atraso não superior a 1 hora da hora prevista no vôo originalmente reservado.
4.1.8 - O transportador deve fornecer ao passageiro "overbooking" involuntário um declaração escrita com explicação clara dos termos, condições e limitações da compensação decorrente desse "overbooking".
4.1.9 - O transportador deve incluir no bilhete de passagem todas as informações referentes ao "overbooking" e as respectivas compensações. O transportador é responsável para assegurar que seus agentes autorizados cumpram esse regulamento sobre "overbooking".
4.1.10 - Não foi identificado procedimento oficial com relação ao "no-show" nos regulamentos internos dos Estados Unidos da América referentes ao transporte aéreo comercial.
4.2 - O "overbooking" na Comunidade Econômica Européia.
4.2.1 - Na Europa Ocidental não foi preciso grande pressão da opinião pública pois a iniciativa governamental foi há muito concretizada pelo Regulamento 295/91, de 04 de fevereiro de 1991, pelo qual o Conselho da Comunidade Econômica Européia estabeleceu as normas compensatórias para os casos de "overbooking", entre as quais pinçamos as seguintes:
4.2.2 - São considerados "overbooking" os passageiros impedidos de embarcar possuindo bilhete válido, com reserva confirmada e que tenha se apresentado para embarque no prazo e nas condições exigidas pela regulamento do transportador.
4.2.3 - A compensação somente é obrigatória nos vôos regulares com excesso de passageiros reservados(não se aplica ao vôo não-regular).
4.2.4 - "Overbooking" voluntário é o passageiro reservado em vôo com excesso de reservas e que aceita renunciar voluntariamente ao direito da sua reserva em troca de uma compensação.
4.2.5 - O transportador deverá estabelecer as normas que seguirá para o embarque dos passageiros nos casos de excesso de reserva e notificará essas normas aos Estados membros interessados. Essas normas devem estar à disposição do público em geral, inclusive nas agências e aeroportos.
4.2.6 - Essas normas devem prever a possibilidade de aceitar voluntários para não embarcar.
4.2.7 - Em todos os casos o transportador deverá levar em consideração os interesses dos passageiros que, por razões legítimas, tais como deficientes físicos e menores desacompanhados, devem ser acomodados com prioridade sobre os demais passageiros.
4.2.8 - No caso de "overbooking" o passageiro poderá escolher:
4.2.8.1 - Reembolso do preço da passagem correspondente ao trecho "overbooking".
4.2.8.2 - Transporte o mais rápido possível ao destino final.
4.2.8.3 - Transporte em data posterior que convenha ao passageiro.
4.2.9 - Independentemente e em adição às condições anteriores, o transportador pagará imediatamente uma compensação mínima de :
150 ecus para os vôos de até 3.500 km;
300 ecus para os vôos de mais de 3.500 km.
( 1 ecu = USD$1.30 cotação em 12.03.91)
4.2.10 - Além das compensações mínimas o transportador oferecerá gratuitamente ao passageiro "overbooking" o seguinte:
a)- chamadas telefônicas e/ou envio de fax ao destino final;
b)- alimentação durante o tempo de espera;
c)- acomodação em hotel nos casos de pernoite.
4.2.11 - O transportador deve fornecer ao passageiro "overbooking" informações por escrito sobre as normas de compensação.
4.2.12 - Não foi localizado procedimento oficial com relação ao "no-show" em Atos da Comunidade Econômica Européia.
5. Conclusão.
5.1 - A simplicidade externa da questão parece justificar o procedimento do transportador para prevenir prejuízo causado pelo "no-show" sem penalizar as valorizadas passagens "full fare", aliás disputadíssimas em razão do "yield", mas na realidade encobre um complexo mecanismo para aumentar o lucro em detrimento do direito de outros que pagam por um serviço que não é prestado nas condições contratuais. Não é justo manter as facilidades de "no-show" a custa de descumprir o contrato de outros; a exemplo dos transportes de superfície o "no-show" não deveria ser admitido no transporte aéreo, de modo a eliminar certos privilégios não contratuais.
5.2 - Juridicamente tanto o "no-show" como o "overbooking" constituem violações do contrato de transporte, sujeitando o infrator a arcar com as perdas e danos decorrentes. Na hipótese do "no-show" essa penalidade está limitada ao valor da passagem não voada mas no caso do "overbooking" esse valor deve ser apurado em procedimento de execução, podendo incluir até danos morais, desde que alcance a reputação, o conceito subjetivo, causem sofrimento de deficiência ou ainda qualquer perda oriunda desse fato.
5.3 - É inquestionável que o problema do "overbooking" sempre teve conotação econômica e o exame das práticas atuais indicam estar esse entendimento correto. A implementação do "overbooking" não decorre apenas do "no-show" mas principalmente da prática adotada pela maioria dos transportadores para obter melhor resultado econômico, pela qual o passageiro que pagou a tarifa integral pretere o de tarifa reduzida. Programas de computador foram desenvolvidos para a obtenção desse desiderato, selecionando os passageiros para serem acomodados no vôo; essa situação deve permanecer enquanto perdurar as tarifas diferenciadas na mesma classe, mesmo sendo encontrada solução para evitar ou reduzir o "no-show" de tarifa integral. O mais importante é otimizar o lucro.
5.4 - Nos Estados Unidos da América e na Comunidade Econômica Européia(C.E.E.), áreas que abrangem significativa parcela do tráfego aéreo comercial, as autoridades competentes foram sensíveis ao problema e com uma abordagem muito apropriada já adotaram regulamentos para, diante de uma realidade econômica, proteger certos direitos dos passageiros sem perturbar a livre comercialização do transporte aéreo. Aparentemente foi possível encontrar um equilíbrio para o relacionamento contratual entre o transportador e o usuário, com ênfase para a obrigatoriedade de colocar ao dispor do usuário antecipadamente todas as informações peculiares à situação do "overbooking" e do "no-show". O segredo parece ser a qualidade da informação prestada oportunamente ao usuário.
5.5 - No Brasil as questões do "no-show" e "overbooking" são no mínimo confusas e contraditórias diante dos parâmetros legais para não dizer totalmente omissas no regulamento oficial, portanto, urge ao Departamento de Aviação Civil do Ministério da Aeronáutica, ou outro órgão que venha substitui-lo, usando das suas atribuições e como instância reguladora, ordenar esses assuntos mediante expedição de Atos que possam harmonizar os interesses envolvidos, entre outras, obrigando a constar com transparência no contrato de transporte aéreo e outros locais de acesso ao público, os direitos e a responsabilidade do transportador e do passageiro para as situações de "overbooking" e de "no-show", pois, preenchendo essa lacuna na regulamentação especial, estará prestando valiosa contribuição ao aprimoramento das normas aplicáveis ao nosso transporte aéreo comercial.